Correio da Bahia

Fé e festa

- NILSON MARINHO

Afinal de contas, o que leva tanta gente a caminhar oito quilômetro­s, da Conceição da Praia à Colina Sagrada, na Lavagem do Bonfim? Seria mesmo a fé no santo? Ou tem os mais interessad­os em ‘amarrar o jegue numa birosca’ e ficar por lá, curtindo a esbórnia em plena quinta-feira de manhã? Cada um tem o seu motivo e ninguém briga por isso. Pelo contrário. Até quem nem sabe quem é esse tal de Senhor do Bonfim é capaz de sentir a energia.

As turistas goianas Cinthia Fagundes, 40 anos, e Javani Correia, 60, por exemplo, tinham acabado de desembarca­r aqui depois de uma longa viagem pelo Nordeste. Até ontem de manhã, desconheci­am a festa.

Ao descer o Elevador Lacerda, o susto: “Por que tanta gente assim?”. Não sabiam que se tratava da Lavagem do Bonfim, muito menos compreendi­am a mistura toda. Um multidão, que misturava baianas e religiosos, seguia o andor de madeira e a inédita corda de fitinhas.

Javani até deu um jeito de resumir a história: “É uma festa onde milhares de pessoas participam. Também sei que existe isso do sincretism­o, né? Bem forte por aqui”.

Já Cinthia... Não entendia nada - não que isso seja um problema. Às vezes, nem baiano entende. Só sente.

Assim que viu os Filhos de Gandhy entrarem na Avenida Jequitaia, Cinthia logo agarrou um pelo braço. Queria uma foto de recordação da Bahia e achou que o melhor registro seria aquele.

O integrante ‘fisgado’ foi o Ary Neves, 18. Um metro e meio de altura. Com uma chupeta na boca, a impressão é que Ary se perdeu da mãe no meio da multidão. “Estou aqui porque gosto de sair no grupo. Meu pai, meus tios, todos desfilam. Venho também para brincar”, contou.

Mas nem todos estavam ali só pela diversão. Almir Santos Queiroz, 57, e Belício Cardoso, 40, mais comportado­s que na festa da carne, garantiram que o colar não sairia do pescoço.

Pelo sagrado ou pelo profano, no alto da Colina é onde o padre Edson Menezes, reitor da Basílica do Bonfim, abençoa a caminhada. É lá também o lugar de afastar todo tipo de energia negativa - nada que um axé no Largo do Bonfim não resolva.

Oito quilômetro­s depois, há quem se entregue à farra.

Mas, para quem não é de muita festa, o melhor é se jogar no chão e criar coragem para voltar pra casa. “Participo desde menininha. Esse é o momento que a gente descansa para o próximo ano”, conta a baiana Marinalva Alves dos Santos, 50.

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