Forças da intervenção fazem primeira operação em favela
O ministro da Justiça e Segurança Pública, Torquato Jardim, afirmou, ontem, que os mandados de busca e apreensão nas ações de investigação contra o crime organizado no Rio de Janeiro trarão nomes e endereços dos alvos, conforme previsto na Constituição.
O ministro explicou, no entanto, que os pedidos desses mandados deverão conter vários nomes e múltiplos endereços, por causa da singularidade das áreas de conflito na capital fluminense.
Torquato Jardim ainda afirmou que os pedidos dos mandados “não serão genéricos e sim direcionados e com embasamento jurídico”. Apesar da polêmica sobre os mandados coletivos, o governo decidiu mantê-los como um dos recursos da intervenção federal no Rio.
“As zonas de conflito no Rio têm urbanização precária, os endereços não são todos facilmente localizáveis. Sendo assim, é possível que os pedidos sejam feitos com base em posições de GPS e descrevendo áreas das comunidades”, esclareceu Torquato.
O ministro se reuniu ontem com o presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJ-RJ), desembargador Milton Fernandes de Souza, e com o presidente do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2), André Fontes. Também participaram a advogada-geral da União, Grace Mendonça, e o ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, general Sérgio Etchegoyen.
Torquato Jardim destacou a legalidade dos atos de intervenção na segurança do Rio e lembrou que os bandidos usam a violência para esconder drogas e armas nas casas de moradores das comunidades pobres do estado. da Alvorada e encampada pelo governo federal.
No encontro de ontem, todos os presentes concordaram com a necessidade de que as medidas são necessárias para combater o crime mas que têm de ser realizadas, de fato, caso a caso, como sempre aconteceu. O objetivo, segundo um dos ministros presentes, “não era discutir se vale ou não vale mandado coletivo, mas sobre como preservar direitos e garantias na nova realidade ditada pelo crime organizado”.
Para juristas, um mandado coletivo de busca e apreensão é inconstitucional. O conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), em São Paulo, Frederico Crissiuma de Figueiredo, disse ontem que a medida atenta contra os diretos constitucionais à privacidade, à dignidade e à inviolabilidade dos domicílios.
“Mesmo numa situação de intervenção federal, tais garantias não podem, no meu entender, ser afastadas. Se há necessidade de busca e apreensão, ela deve ser demonstrada individualmente, indicando-se as fundadas suspeitas que justifiquem a medida. Nossos tribunais já se manifestaram a respeito e comungam do mesmo entendimento”, afirma.
O professor de Direito Penal da Faculdade do IDP-São Paulo João Paulo Martinelli lembra que o Tribunal de Justiça do Rio de Ianeiro já anulou mandados coletivos em operações anteriores.
O advogado criminalista destaca que é contrário a esse tipo de medida e que “a intervenção federal não autoriza o uso de medidas ilegais”. Fuzileiros navais, policiais civis e militares entraram logo nas primeiras horas do dia de ontem na Favela Kelsons, ao lado do Centro de Instrução Almirante Alexandrino (CIAA), unidade de instrução da Marinha. A operação foi realizada para prender traficantes que dominam a comunidade e realizaram ameaças e disparos contra a unidade nos dias 21 e 25 de janeiro.
Foram utilizados blindados nas principais entradas da favela e os militares revistaram carros e pessoas que entravam ou saíam da comunidade. Apesar do transtorno da revista e da presença ostensiva dos soldados, os moradores afirmaram que não estavam incomodados com a presença dos militares e policiais.
“Eu tô querendo me mudar daqui. O pessoal é abusado, um inferno. Para mim, se os militares ficarem direto, eu mudo de ideia de ir embora”, desabafou um morador.
Outro morador, que também é comerciante na Kelsons, disse apoiar a presença das Forças Armadas e pediu que os militares ficassem permanentemente. “Eles têm que ficar direto para acabar com esses problemas. A gente que trabalha aqui não tem sossego. Toda hora é tiroteio. Antes aqui era milícia, agora é o tráfico. Nenhum lado é bom. Tem que ser é com intervenção mesmo”, disse.
Outros moradores da favela preferiram desconversar quando perguntados sobre a presença dos militares, com medo de represálias dos traficantes locais.
Segundo a Secretaria de Estado de Segurança, além da operação na Kelsons, houve ações de cerco, desobstrução de vias e ações de estabilização nas comunidades de Cidade Alta, Pica Pau, Cinco Bocas e Tinta, na Zona Norte. Também foram realizados bloqueios em rodovias federais e vários pontos da divisa do Rio com os demais estados do Sudeste.
O resultado final foi a apreensão de cinco pistolas, um revólver, seis granadas, seis carregadores de pistolas, e 11 rádios de comunicação. Também foram apreendidos um caminhão, dois carros, quatro motocicletas, drogas e munições.