O salto, a queda e a perda
A manchete estampada na edição de anteontem do CORREIO expôs o tamanho do declínio gradativo enfrentado por um dos pilares da economia baiana. No intervalo de apenas cinco anos, a produção na Refinaria Landulpho Alves (Rlam), segunda maior do Brasil, caiu 30% entre 2013 e 2017. Vista para além da frieza numérica, tal redução revela também o efeito negativo sobre o setor industrial, a geração de riquezas e, por consequência, a arrecadação tributária do estado em meia década.
Para entender de modo claro o impacto originado pela baixa produtividade da Rlam, é preciso retroceder no tempo. Primeira refinaria do país, a unidade situada em São Francisco do Conde entrou em operação em 1950, no rastro da euforia precipitada pela descoberta de poços de petróleo em volta do Recôncavo baiano. O que deu mote à célebre campanha “O Petróleo é Nosso”.
Mais do que servir como peça de propaganda para o governo Getúlio Vargas, o tesouro encontrado no solo do Recôncavo e a seguinte criação da Rlam diminuíram a dependência da Bahia do setor agrícola. O que abriu espaço para diversificar a cadeia econômica do estado e sua entrada na era da industrialização moderna. De lá para cá, a refinaria se tornou parte importante do PIB local e grande fonte de recursos para os cofres públicos.
Hoje, a Rlam responde por 20% do volume arrecadado com o ICMS. No bolo do PIB baiano, sua fatia equivale a 2% - aproximadamente R$ 5 bilhões -, ante os 12% registrados em 2014. O que representa uma queda de dez pontos percentuais, algo assustador para um estado pobre e com a indústria em recuo.
É preciso compreender, no entanto, que a refinaria significa bem mais do que ela produz: gasolina, diesel, querosene de aviação, gás de cozinha, lubrificantes, parafina, asfalto e matérias-primas para a indústria petroquímica, especialmente, a nafta. O ritmo de produção em queda na Rlam arrasta para baixo também setores como transporte e serviços, consome empregos e agrava os problemas sociais em comunidades ao seu redor.
Muito do processo de declínio da Rlam tem origem no trato dado pelos últimos governos à Petrobras e ao mercado internacional do petróleo. Hoje, os produtos que saem das refinarias brasileiras não conseguem competir com os preços praticados pelas concorrentes estrangeiras. Com isso, se tornou melhor comprar lá fora derivados mais baratos. Logo, o negócio deixou de ser atraente e lucrativo, dentro da nova política da estatal petroleira.
Para que as unidades de refino da Petrobras pudessem produzir em condições de igualdade com sua congêneres globais, seria preciso investimentos vultosos na modernização dos processos fabris, já defasados. Isso poderia ter começado há pelo menos dez anos. O que se viu, porém, foi outra coisa.
Em vez de aplicar recursos em refinarias estabelecidas há décadas, os governos anteriores optaram por drenar verbas da Petrobras para projetos que se revelariam anos depois poços de prejuízos, superfaturamentos e corrupção generalizada. Tudo perfeitamente esclarecido pela Operação Lava Jato e seus incontáveis desdobramentos. Nesse âmbito, há quatro bons exemplos.
Em 2005, a Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, estava orçada em US$ 2,5 bilhões. Quase dez anos depois, a previsão de investimentos para a obra atingia inimagináveis US$ 18,5 bilhões, sem que sequer tenha entrado em operação plena. As refinarias Premium I e II, respectivamente, no Maranhão e no Ceará, torraram R$ 3,8 bilhões antes de serem sepultadas em definitivo. A polêmica compra de Pasadena, nos EUA, dispensa maiores comentários.
Nessa sucessão de erros e escândalos de corrupção, sobrou para a Rlam e, por efeito direto, para a economia baiana. Pelos ventos que sopram do mercado do petróleo, a revitalização da histórica refinaria dificilmente virá dos cofres da Petrobras, cuja prioridade imediata é sanar o rombo deixado na companhia. É bem provável que um dia aquilo que chamamos de nosso vire propriedade de outros.