‘Parem de nos matar’
Ontem, as redes sociais foram tomadas pela #mariellepresente. Foi como os brasileiros e gente que se preocupa com a defesa dos direitos humanos em todo o mundo resolveram homenagear Marielle Franco, 38 anos. Quatro dias antes de ser morta a tiros, a vereadora do Rio, pelo PSOL, usou as redes sociais para divulgar outras hashtags, denunciando supostas ações violentas da Polícia Militar no Acari, zona norte carioca.
A postagem trazia uma imagem com as frases “Parem de nos matar” e “Somos todos Acari”, junto da hashtag “Vida nas favelas importam”. Na véspera de sua morte, anteontem, ela voltou a criticar a violência policial no Rio ao comentar sobre a morte do jovem Matheus Melo, de 23 anos, baleado ao sair de um culto no Jacarezinho, na zona norte do Rio. “Quantos jovens precisarão morrer para que essa guerra aos pobres acabe?”, escreveu.
Ela e o motorista Anderson Pedro Gomes foram mortos a tiros na noite de anteontem.
Ontem, uma multidão foi às ruas no Rio e em capitais como Salvador, São Paulo, Belo Horizonte e Recife para cobrar justiça. Houve forte mobilização nas redes sociais. A ativista de direitos humanos levou quatro tiros na cabeça.
Milhares de pessoas se reuniram ao redor da Câmara Municipal, no Palácio Pedro Ernesto, centro do Rio, onde foi realizado o velório de Marielle e Gomes. A vereadora foi enterrada no cemitério São Francisco Xavier, no Ca- ju. Líderes de movimentos sociais e políticos acompanharam a cerimônia. À noite, houve nova mobilização pacífica na Cinelândia.
A sessão solene na Câmara em homenagem à vereadora se transformou em ato contra a intervenção federal e contra o governo Michel Temer.
Em Salvador, parte das atividades do Fórum Social Mundial (FSM) foram interrompidas pela manhã para homenagear Marielle.
No início da tarde, a morte de Marielle era o assunto mais comentado no Twitter, com 289 mil tuítes sobre o crime. Os principais jornais do mundo, como o inglês The Guardian, o americano The New York Times e o francês Le Monde, deram destaque ao crime em seus noticiários.
Em Fortaleza, o ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, afirmou que a Polícia Federal entrou no caso e que haverá sigilo para não prejudicar as investigações. “Quem cometeu esse bárbaro crime não ficará impune”, afirmou. O presidente Michel Temer também se pronunciou e disse em um vídeo divulgado pelas redes sociais que o crime “é inaceitável, inadmissível, como todos os demais assassinatos que ocorreram no Rio”.
O caso também será acompanhado por entidades brasileiras, como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
A Polícia Federal vai auxiliar a investigação sobre o ataque, mas a chefia da apuração ficará a cargo da Polícia Civil fluminense. A possibilidade de federalizar a investigação havia sido cogitada pela procuradora-geral da República, Raquel Dodge.
A execução premeditada, ligada à atividade política da vereadora carioca é investigada pela Polícia Civil do Rio como hipótese para explicar o assassinato da parlamentar. Uma assessora, que estava ao lado da parlamentar, sobreviveu sem ferimentos e prestou depoimento à polícia.
“Uma das possibilidades, sim, é essa da execução. Mas a gente não descarta ainda outras (possibilidades) até porque o crime aconteceu há 10, 12 horas”, declarou o chefe da Polícia Civil, delegado Rivaldo Barbosa, na manhã de ontem. Ele se reuniu com o deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL), os delegados Fábio Cardoso, que está assumindo a Divisão de Homicídios, e Gineton Lages, agora titular da Delegacia de Homicídios da capital.
Antes de ser morta, Marielle participou de uma reunião de mulheres negras na Lapa, no centro do Rio. Deixou o encontro por volta das 21h30, acompanhada de Pedro Gomes e da assessora. As duas mulheres se sentaram no banco de trás do carro, e Gomes assumiu o volante. O veículo seguia para a casa de Marielle, na Tijuca.
Na altura da Praça da Bandeira, um Chevrolet Cobalt prata emparelhou à direita do veículo em que Marielle seguia. Um dos ocupantes disparou nove vezes contra a parlamentar, atingindo o vidro e parte da porta traseira direita do automóvel em que estava Marielle.
O carro andou mais alguns metros, e os assassinos fugiram. Marielle e Gomes morreram imediatamente. A assessora foi atingida apenas por estilhaços e prestou depoimento durante cinco horas ainda de madrugada.
Outra testemunha, alguém que passava pelo local na hora do ataque, também teria prestado depoimento. A arma usada no crime foi uma pistola 9 milímetros. A polícia acredita que o carro foi seguido pelo veículo onde estava o assassino desde que ela saiu da reunião na Lapa.
O motivo é que, embora os vidros do automóvel de Marielle estivessem cobertos por uma película escura, os atacantes pareciam saber exatamente onde ela estava sentada – a vereadora não costumava ir atrás. Foi na direção daquele ponto que os disparos foram feitos.