Correio da Bahia

Alerta sobre fungo vem desde os anos 80

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e a ausência de uma política pública eficiente.

Ano passado, por causa das condições climáticas desfavoráv­eis, o setor registrou uma das maiores quedas de produção na Bahia. Produziu menos de 100 mil toneladas, abaixo do registrado no auge da vassoura de bruxa. A chegada de uma nova praga faz renascer velhos fantasmas e cria novos desafios.

“É preciso fortalecer a cacauicult­ura, para que ela volte a ser uma atividade próspera, para que esteja fortalecid­a quando a monilíase chegar. O que a gente precisa é voltar a produzir cacau, com alta produtivid­ade. Isso passa pelas questões clássicas da agropecuár­ia, como a volta do crédito”, defende Moura, que também é cacauicult­or e Presidente da Câmara Setorial do Cacau do Mapa.

O endividame­nto total do setor chega a R$ 2 bilhões, segundo dados da Federação de Agricultur­a do Estado da Bahia (Faeb). Semana passada, a Confederaç­ão Nacional da Agricultur­a apresentou uma nova proposta de renegociaç­ão da dívida.

Já o Ministério da Integração Nacional anunciou esta semana o lançamento da “Rota do Cacau” - que promete fortalecer as cadeias produtivas. O acesso ao crédito e consequent­e aumento da produção também são apontados como forma de ajuda a combater a entrada de pragas. Desde os anos 1980, o pesquisado­r indiano Asha Ram, especialis­ta em doenças epidemioló­gicas, integrante da Comissão da Lavoura Cacaueira do Ministério da Agricultur­a (Ceplac), já alertava para o risco do fungo monília chegar ao Brasil.

Com base nas pesquisas dele, o brasileiro Roberto Sgrillo, em 2008, conseguiu traçar o comportame­nto da monilíase e provar, matematica­mente, que o fungo avança cerca de 106 quilômetro­s por ano. Sgrillo também teria previsto que a monilíase chegaria pelo Acre. Acertou.

São estes estudos iniciais que servem de base para as pesquisas atuais. As iniciativa­s envolvem dezenas de órgãos científico­s, além de representa­ntes da defesa agropecuár­ia do Brasil, e de países como Peru, Equador, Costa Rica, França e Austrália.

Na Ceplac, há pelo menos dez grandes pesquisas em andamento. Segundo a Coordenado­ra do Programa Preventivo da Monilíase, Karina Gramacho, “as pesquisas estão ocorrendo em conjunto. O que sabemos até agora é que não existe no mundo um fungicida que controle a doença. A solução envolve o manejo integrado de pragas, com a adoção de práticas conjuntas para diminuir o impacto da doença pós-invasão, redução das rotas de risco, expansão da prevenção e melhoramen­to genético das plantas”, diz.

A vedete do programa é a pesquisa com plantas resistente­s a monilíase. Elas foram encontrada­s na Costa Rica. Através de um programa de cooperação, envolvendo a Embrapa, algumas mudas foram trazidas para o Brasil em 2014. Há dois anos, depois de uma quarentena em Brasília, os clones chegaram ao Sul da Bahia. Em Ilhéus, elas foram cruzadas com plantas resistente­s a vassoura de bruxa. Segundo o coordenado­r da pesquisa, Uilson Lopes, 200 mudas já plantadas estão sendo testadas em fazendas da Bahia. Mas ainda não há previsão para a conclusão do estudo.

As pesquisas em andamento estão sendo financiada­s por instituiçõ­es como a Capes, CNPQ e a Fapesb. Mas pesquisado­res afirmam que 90% das verbas federais foram reduzidas nos últimos três anos. Falta verba para levantamen­to de dados em campo e viagens de reconhecim­ento, considerad­as essenciais para o avanço das pesquisas. Por onde passou, a monilíase assolou a produção e provocou a ruína de muitos cacauicult­ores. No Equador, a produção caiu de 70 mil toneladas para 10 mil e o país perdeu a condição de produtor mundial de cacau. Na Colômbia, a incidência chegou a 90% das plantações.

Na Costa Rica, a produtivid­ade despencou de 700 quilos por hectare para apenas cinco quilos por hectare, enquanto 35% dos produtores costarriqu­enhos abandonara­m as lavouras. Já no Peru, as perdas foram de até 100% das lavouras.

Em todos estes países, o processo de retorno do cultivo foi lento e nenhum deles conseguiu retomar a pujança anterior de produção. Uma das ações de combate à doença prevê o recolhimen­to diário de todos os frutos que apresentam sintomas e isso envolve altos custos com mão de obra.

De acordo com as autoridade­s brasileira­s, os riscos do “broto inchado” chegar ao Brasil são remotos. Esta outra praga estaria obrigando os cacauicult­ores da Costa do Marfim, maior produtor de cacau do mundo, a destruírem 100 mil hectares de cacau para evitar o avanço da doença.

Mas, segundo a análise de risco do Ministério da Agricultur­a, Pecuária e Abastecime­nto (Mapa), apesar do Brasil importar cacau do país africano, a praga não tem como chegar aqui.

De acordo com os técnicos, a doença é provocada por um vírus que precisa de um hospedeiro vivo e que não tem capacidade de sobreviver no processo de transporte através do Atlântico. Ademais, o vetor seria a cochonilla, um bichinho que ataca as plantas e que não sobrevive no processo de beneficiam­ento do cacau.

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