Correio da Bahia

Informaçõe­s com cuidado

- Andreia Santana

Do CPF digitado no caixa do supermerca­do durante o pagamento das compras às informaçõe­s de cadastro nas redes sociais, os dados pessoais dos brasileiro­s não poderão mais ser negociados por empresas sem o consentime­nto do titular das informaçõe­s. Ao menos, é isso o que prevê o marco legal que regulament­a o uso, a proteção e a transferên­cia de dados pessoais no Brasil. Aprovado pelo Senado, em 10 de julho, a lei aguarda sanção.

Depois de sancionada, terá 18 meses de adaptação para empresas e órgãos públicos e depois entrará em vigor. É inspirada no General Data Protection Regulation – GDPR, da União Europeia e, em resumo, permitirá ao cidadão um controle maior sobre suas informaçõe­s pessoais. Entre outras coisas, estabelece que será necessário o consentime­nto do titular dos dados antes da coleta e uso pelo poder público ou empresas privadas.

A nova lei estará em discussão no seminário Sustentabi­lidade de Agora, no Fórum Agenda Bahia 2018, que acontece no dia 8 de agosto. O painel ‘Privacidad­e e segurança em tempos de conectivid­ade’ vai acontecer à partir das 14h30, com duas palestras: ‘A importânci­a da segurança cibernétic­a na era das Smart Cities e da Internet das Coisas’, com Fernanda Vaqueiro, gerente de Segurança de Inteligênc­ia de Rede e MSS da Oi; e ‘A nova lei de proteção de dados e seu impacto para empresário­s e consumidor­es’, com Ana Paula de Moraes, advogada especialis­ta em Direito Digital.

O PLC 53/2018 obriga ainda que sejam oferecidas opções para o usuário visualizar, corrigir e até excluir os dados que desejar de forma clara. A qualquer momento, o titular pode revogar a permissão de uso das suas informaçõe­s pessoais.

A lei prevê também a criação da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), órgão regulador que será vinculado ao Ministério da Justiça. E determina punição para as empresas infratoras, prevendo desde advertênci­a até multa diária de até R$ 50 milhões.

Chile, Colômbia, Costa Rica, Peru, Uruguai e Argentina já possuem leis de proteção de dados pessoais. A legislação argentina, inclusive, se destaca pela semelhança com a GDPR europeia. No Brasil, o tema ganhou fôlego no Congresso após os vazamentos de dados de usuários do Facebook coletados pela empresa Cambridge Analytica.

Maurício Fiss, sócio-diretor da área de tecnologia da consultori­a global Protiviti, explica que em linhas gerais, a nova lei impedirá, entre outras coisas, que dados sensíveis como nome, telefone, endereço e CPF sejam usados como moeda de troca entre empresas e organizaçõ­es sem que o titular dos dados saiba.

Fiss enumera o que as empresas que coletam e tratam dados precisão fazer para se adequar à nova lei:

- Identifica­r onde estão as informaçõe­s, pois muitas não têm ideia e precisarão de um inventário, como checar sistemas, computador­es, backups e arquivos em papel;

- Criar um processo de gestão das informaçõe­s, para impedir o uso indevido e o roubo por hackers;

- Trabalhar com tecnologia­s que controlam dados e tenham sistemas eficientes anti-vazamento; além de treinar as pessoas que vão manipular esses dados.

O advogado especialis­ta em Direito Digital e autor de livros sobre crimes digitais, Marcelo Crespo, do escritório Peck Advogados, afirma que o modelo de negócios baseado em análise massiva de dados não tem mais volta.

“O que muda é o consentime­nto do titular e o fato dele poder revogar o consentime­nto - ‘Não quero mais que trate meus dados’ -, e as empresas terão de estabelece­r plataforma­s e mecanismos multifunci­onais para atender essa exigência”, explica.

Para Marcelo Crespo, caberá também ao cidadão uma mudança de postura. “A lei não obriga, mas é importante o titular dos dados se interessar em saber o que vai ser feito das informaçõe­s”, afirma.

A Lei de Acesso à Informação – LAI (Nº 12.527/2011), voltada para a transparên­cia de dados públicos, não é a mesma coisa que o novo marco regulatóri­o para proteção de dados pessoais aprovado no Senado.

Quem explica a diferença é Eduardo Magrani, coordenado­r da área de direito e tecnologia do ITS-Rio (Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro).

“A nova lei é um complement­o ao Marco Civil da Internet, que já é um complement­o da LAI. Com essa nova lei há a possibilid­ade legal de coletar, tratar e transferir dados no Brasil, mas de forma responsáve­l”, afirma.

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