O novo desafio do Frete
A Lei 13.703/18 - que instituiu a política de frete mínimo para o transporte rodoviário de cargas no país, em vigor desde quinta-feira passada - está longe de agradar o setor produtivo do estado. Líderes de entidades que representam os produtores rurais e agroindústrias da Bahia rejeitam a nova política e defendem a livre negociação com os transportadores. Dizem ainda que a lei eleva os custos e reduz a competitividade dos produtos.
O presidente da Associação da Agricultores e Irrigantes da Bahia (Aiba), Celestino Zanella, é objetivo em relação ao tabelamento. “Se a tabela fosse coisa boa, a que tinha no governo militar teria funcionado. Tudo que é tabelado favorece o menos eficiente. O que tem que ser discutido é a melhoria da tributação do combustível”.
O setor não descarta a possibilidade de internalização do transporte, com a formação de frota própria pelos produtores rurais. Mas os agricultores já antecipam outros conflitos caso isso aconteça.
“Não é muito difícil utilizarmos os caminhões que temos. Mas isso, ao invés de resolver o problema dos caminhoneiros, provocaria um ainda maior. Hoje nós utilizamos terceirizados, especializados em transporte, e eles são as pessoas mais eficientes para este trabalho. Porém temos que analisar que o impacto inicial desta ação abre perspectivas de novos negócios. Eu acredito na livre iniciativa. Hoje os caminhões descem carregados de soja e voltam todos vazios. Não tem cabimento um negócio desse. Se os produtores entrarem no segmento, vão levar soja e trazer fertilizante de volta”, sugere Zanella.
Na última fronteira agrícola do país, os produtores percorrem mais de mil quilômetros para escoar a produção até os portos ou para levar os alimentos para os consumidores. Este ano, os mais de 1.300 agricultores da região Oeste da Bahia precisam transportar 1 milhão de toneladas a mais de soja, e enfrentar as consequências da tabela do frete.
No ramo de algodão o clima também é de rejeição. De acordo com a Associação de Produtores de Algodão da Bahia (Abapa), a colheita está em pleno andamento. Os produtores do Oeste já retiraram do campo 60% da safra deste ano e produziram 309 arrobas por hectare. É uma das maiores produtividades de algodão não irrigado do mundo. Eles comemoram os bons resultados, mas estão apreensivos com o transporte da produção.
“O passado nos mostra que toda vez que o governo intervém no livre mercado causa distorções que privilegiam um setor em detrimento do outro", afirma o presidente da Abapa, Júlio Busato. "O que se observa é que o frete, no caso da pluma do algodão, variou em um dia de 25% a 100%, dependendo do destino. Esta distorção esta punindo o setor produtivo, a indústria e o comércio”, complementa.
O algodão tem o preço internacional balizado pela bolsa de Nova Iorque. Portanto, é vulnerável às variações do dólar e do petróleo. “Os produtores é que vão arcar com os prejuízos desta mudança. As associações não pensam em ter frota própria, mas os produtores e as tradings sim. Se esta tabela for mantida, no futuro todos irão perder, inclusive os caminhoneiros autônomos”, acrescenta Busato.
O desafio é continuar produzindo com o mesmo desempenho que tem mantido a Bahia entre os maiores produtores de alimentos do país. O estado está às vésperas de concretizar uma das maiores safras da história, com expectativa de produzir mais de 18 milhões de toneladas de alimentos em 2018.
As tradings são empresas que funcionam como intermediárias entre produtores, fabricantes e compradoras, realizando operações de exportação e importação. Para a reportagem do CORREIO, uma delas já sinalizou que pensa em comprar mil caminhões para montar a própria frota.
Sancionada pelo presidente Michel Temer, na quinta-feira passada, a Lei 13.703/18, é uma das reivindicações dos caminhoneiros atendidas pelo governo após a greve que paralisou o país entre 21 de maio e 4 de junho. Temer, no entanto, vetou a anistia de multas de trânsito aplicadas durante a paralisação da categoria.
A anistia foi incluída durante a votação do projeto no Congresso Nacional. As penalidades passam de R$ 700 milhões. Na razão do veto, o governo justifica que há inconstitucionalidade na anistia “pois afronta o artigo 113 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias segundo o qual o Poder Público não pode renunciar a receitas”.
De acordo com a lei, cabe a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) calcular os valores do frete, levando em consideração o tipo de carga, os pedágios, as distâncias e o preço. A nova política, no entanto, está longe de agradar o setor produtivo nacional, que considera o transporte um fator essencial para sobrevivência dos negócios.