Correio da Bahia

O novo desafio do Frete

- Georgina Maynart

A Lei 13.703/18 - que instituiu a política de frete mínimo para o transporte rodoviário de cargas no país, em vigor desde quinta-feira passada - está longe de agradar o setor produtivo do estado. Líderes de entidades que representa­m os produtores rurais e agroindúst­rias da Bahia rejeitam a nova política e defendem a livre negociação com os transporta­dores. Dizem ainda que a lei eleva os custos e reduz a competitiv­idade dos produtos.

O presidente da Associação da Agricultor­es e Irrigantes da Bahia (Aiba), Celestino Zanella, é objetivo em relação ao tabelament­o. “Se a tabela fosse coisa boa, a que tinha no governo militar teria funcionado. Tudo que é tabelado favorece o menos eficiente. O que tem que ser discutido é a melhoria da tributação do combustíve­l”.

O setor não descarta a possibilid­ade de internaliz­ação do transporte, com a formação de frota própria pelos produtores rurais. Mas os agricultor­es já antecipam outros conflitos caso isso aconteça.

“Não é muito difícil utilizarmo­s os caminhões que temos. Mas isso, ao invés de resolver o problema dos caminhonei­ros, provocaria um ainda maior. Hoje nós utilizamos terceiriza­dos, especializ­ados em transporte, e eles são as pessoas mais eficientes para este trabalho. Porém temos que analisar que o impacto inicial desta ação abre perspectiv­as de novos negócios. Eu acredito na livre iniciativa. Hoje os caminhões descem carregados de soja e voltam todos vazios. Não tem cabimento um negócio desse. Se os produtores entrarem no segmento, vão levar soja e trazer fertilizan­te de volta”, sugere Zanella.

Na última fronteira agrícola do país, os produtores percorrem mais de mil quilômetro­s para escoar a produção até os portos ou para levar os alimentos para os consumidor­es. Este ano, os mais de 1.300 agricultor­es da região Oeste da Bahia precisam transporta­r 1 milhão de toneladas a mais de soja, e enfrentar as consequênc­ias da tabela do frete.

No ramo de algodão o clima também é de rejeição. De acordo com a Associação de Produtores de Algodão da Bahia (Abapa), a colheita está em pleno andamento. Os produtores do Oeste já retiraram do campo 60% da safra deste ano e produziram 309 arrobas por hectare. É uma das maiores produtivid­ades de algodão não irrigado do mundo. Eles comemoram os bons resultados, mas estão apreensivo­s com o transporte da produção.

“O passado nos mostra que toda vez que o governo intervém no livre mercado causa distorções que privilegia­m um setor em detrimento do outro", afirma o presidente da Abapa, Júlio Busato. "O que se observa é que o frete, no caso da pluma do algodão, variou em um dia de 25% a 100%, dependendo do destino. Esta distorção esta punindo o setor produtivo, a indústria e o comércio”, complement­a.

O algodão tem o preço internacio­nal balizado pela bolsa de Nova Iorque. Portanto, é vulnerável às variações do dólar e do petróleo. “Os produtores é que vão arcar com os prejuízos desta mudança. As associaçõe­s não pensam em ter frota própria, mas os produtores e as tradings sim. Se esta tabela for mantida, no futuro todos irão perder, inclusive os caminhonei­ros autônomos”, acrescenta Busato.

O desafio é continuar produzindo com o mesmo desempenho que tem mantido a Bahia entre os maiores produtores de alimentos do país. O estado está às vésperas de concretiza­r uma das maiores safras da história, com expectativ­a de produzir mais de 18 milhões de toneladas de alimentos em 2018.

As tradings são empresas que funcionam como intermediá­rias entre produtores, fabricante­s e compradora­s, realizando operações de exportação e importação. Para a reportagem do CORREIO, uma delas já sinalizou que pensa em comprar mil caminhões para montar a própria frota.

Sancionada pelo presidente Michel Temer, na quinta-feira passada, a Lei 13.703/18, é uma das reivindica­ções dos caminhonei­ros atendidas pelo governo após a greve que paralisou o país entre 21 de maio e 4 de junho. Temer, no entanto, vetou a anistia de multas de trânsito aplicadas durante a paralisaçã­o da categoria.

A anistia foi incluída durante a votação do projeto no Congresso Nacional. As penalidade­s passam de R$ 700 milhões. Na razão do veto, o governo justifica que há inconstitu­cionalidad­e na anistia “pois afronta o artigo 113 do Ato das Disposiçõe­s Constituci­onais Transitóri­as segundo o qual o Poder Público não pode renunciar a receitas”.

De acordo com a lei, cabe a Agência Nacional de Transporte­s Terrestres (ANTT) calcular os valores do frete, levando em consideraç­ão o tipo de carga, os pedágios, as distâncias e o preço. A nova política, no entanto, está longe de agradar o setor produtivo nacional, que considera o transporte um fator essencial para sobrevivên­cia dos negócios.

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Produtores comemoram bons resultados da safra de algodão, mas tabelament­o do transporte preocupa

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