O início do sucesso
O piso da Senzala do Barro Preto, sede do Ilê Aiyê, no Curuzu, era a passarela de estreia para muitos ali. Cada passo no chão de cimento queimado poderia significar um ato de mudança de vida. A primeira seletiva aberta para o Afro Fashion Day 2018 (AFD), realizada ontem, surpreendeu não só pelo talento dos candidatos, mas também pelas suas histórias.
O jovem aprendiz do metrô de Salvador pode, por exemplo, sonhar em ser modelo internacional. Irlen Bispo Santos, de 20 anos, morador de São Cristóvão, até já participou de alguns concursos. Mas, vinha trabalhando mesmo é nos bloqueios e postos de auto-atendimento do Metrô.“Tá muito puxado trabalhar, estudar e ainda se dedicar à carreira de modelo. Ainda mais sendo negro. O Afro Fashion Day renova as minha esperanças”, disse Irlen.
A missão das seletivas de bairro é identificar jovens talentos que ainda não sejam agenciados e coloca-los na passarela da 4ª edição do AFD, reconhecida como a maior iniciativa de moda afro do Brasil, este ano com 12 agências parceiras, onde desfilam roupas e acessórios criados por estilistas e designers baianos. É bom lembrar que o AFD foi a primeira passarela para algumas modelos de sucesso, como Ana Flávia, primeira mulher negra a vencer o Ford Models e hoje com carreira fora do país.
Diante de exemplos como esse, Laiana São Ricardo, 24 anos, moradora de Mussurunga, se animou para ir à seletiva. “Todo mundo sempre me disse que eu tinha que ser modelo. Uma vez me chamaram para uma campanha publicitária e eu nem fui”, admitiu Laiana. “Agora resolvi tentar”, garantiu ela, que é formada em gastronomia.
Entre artistas, modelos profissionais e novos talentos, cerca de 60 pessoas vão participar do AFD. Além do Curuzu, onde 81 candidatos foram inscritos, as seletivas para modelos não agenciados vão percorrer outros quatro bairros – Plataforma (04/10), Tancredo Neves (11/10), Pelourinho (18/10) e Itapuã (25/10).
Representantes das três agências de moda que ontem estavam no Curuzu, todos negros, disseram se doar a esse evento muito mais do que em outros. Até porque, é onde eles podem colocar seus casting para trabalhar sem preconceitos. “Não são pouco os eventos que reclamam da quantidade de negros dos nossos castings. Quantas vezes já ouvi: ‘Poxa, a sua agência tem muitos negros’”, falou Pepê Santos, da One Models, apoiado por Marlon Júnior, da The Agency, e Sivaldo Tavares, da PJT.
O próprio produtor de moda responsável pela edição dos looks, Fagner Bispo, vê o AFD como uma quebra nas imposições dos desfiles tradicionais. “O AFD veio para reconfigurar a moda, vem para mostrar que existe um mercado de modelos negros em um país em que eles não têm muito espaço”, disse.
Para participar da seleção, é preciso realizar inscrição prévia e gratuita através do Sympla. O link para a edição da Liberdade é bitly.com/ seletivascuruzu e para a de Plataforma bitly.com/seleti vasplataforma. Não é necessário residir no bairro para se inscrever. Podem participar jovens de 13 a 24 anos, moradores de Salvador e Região Metropolitana que não sejam agenciados.