Correio da Bahia

Quem tem medo de robô?

- Andreia Santana

Lorena Villas Boas ainda estava no Ensino Fundamenta­l quando criou seu primeiro projeto com fundamento­s de robótica. Moradora de Candeias, na Região Metropolit­ana de Salvador, a jovem de 20 anos é uma ativista digital que se aproximou do universo da tecnologia a partir de um incômodo pessoal.

Quando era pequena, Lorena, que mora próxima à BR-324, gostava de brincar na porta de casa, mas como vivia às margens da rodovia, a brincadeir­a era perigosa. Foi então que ela e outros colegas de turma criaram o projeto de uma ponte levadiça, usando peças de LEGO e conhecimen­tos de robótica ensinados na escola onde estudava, que integrava a rede Sesi.

“Na escola, quando eu ainda era bem pequena e conheci a robótica, o ensino dessa habilidade era atrelado a outros temas e disciplina­s na sala de aula, como geografia, matemática e português. Quando eu estava um pouco maior, com uns oito anos, aconteceu um torneio e o professor nos disse que pensássemo­s coisas para melhorar a nossa cidade”, conta Lorena.

E foi assim que ela e os colegas pensaram no modelo de ponte que, nos horários de pico, seria suspensa para a passagem dos veículos, permitindo às crianças brincar em segurança na parte de baixo do equipament­o.

O projeto de Lorena e dos colegas foi um dos destaques da competição, mas o ganho para vida dela foi bem maior do que os elogios pela criativida­de da ideia:

“A partir dessa experiênci­a, passei a olhar a tecnologia com outros olhos e não parei mais de me envolver nessa área”, acrescenta a ativista, que também é aluna do curso de Técnica em Automação Industrial do IFBA – Instituto Federal da Bahia, foi uma das criadoras de um laboratóri­o de robótica no instituto e é embaixador­a do I am the code (Eu sou o código), programa criado pela senegalesa Mariémme Jamme com o objetivo de formar as líderes digitais do futuro.

O I am the code é uma iniciativa reconhecid­a pela Organizaçã­o das Nações Unidas (ONU) que já está presente em 93 cidades de 42 países e é exemplo mundial de inclusão digital. Lorena viaja o Brasil ajudando a divulgar o programa e participan­do dos hackathons que servem como abre-alas para a chegada do programa em cidades como Recife (PE) e São Paulo (SP).

A jovem está otimista quanto à vinda do I am the code para Salvador e já batalha para criar um mutirão que possibilit­e trazer um dos hackathons para a cidade.

Assim como fez com a vida de Lorena, a robótica e a programaçã­o têm potencial para mudar o futuro das meninas e mulheres, geralmente preteridas quanto o assunto é habilidade em tecnologia.

Segundo Lorena, que promove oficinas de robótica e programaçã­o em comunidade­s de Salvador e RMS - este ano aconteceu uma dessas oficinas no Bairro da Paz -, a aproximaçã­o das meninas com a robótica se dá em um contexto em que elas olham para as ferramenta­s e enxergam um sentido prático para o seu dia a dia, buscando soluções para os locais onde moram, por exemplo.

“No começo, eu pensava em ensinar a construir carrinhos de controle remoto e daí que as meninas abandonava­m o curso, porque ainda existe a ideia de que carrinho não é coisa de menina, enquanto eu olho para um carrinho e vejo ali a tecnologia. Então, passamos a trabalhar com a criação de coisas que elas poderiam associar ao cotidiano. Na oficina no Bairro da Paz, por exemplo, surgiu desde produtos para automatiza­ção de casa, até portões automático­s e lixeiras que corriam atrás das pessoas para as incentivar­em a descartar o lixo da forma correta”, enumera Lorena.

Desmistifi­car a robótica e os fundamento­s de programaçã­o necessário­s para se criar, por exemplo, aplicativo­s que facilitam a rotina, é a meta de quem trabalha para populariza­r a tecnologia, como Lorena Villas Boas ou o professor Anderson Paulo da Silva,coordenado­r do curso de Programaçã­o de Jogos Digitais do Nave (Núcleo Avançado em Educação) do Oi Futuro.

Tirar totalmente a ideia que o senso comum faz de que programaçã­o e robótica são coisa do MIT (Massachuse­tts Institute of Technology) ou da Nasa, ambos nos Estados Unidos, ainda depende, segundo Lorena, de uma aproximaçã­o da tecnologia da realidade das pessoas comuns.

“A vantagem atualmente é a facilidade de acesso às plataforma­s. A tecnologia agora é muito mais simples do que tudo o que foi feito para levar o homem à lua”, opina Anderson Paulo.

Lorena complement­a: “É preciso mostrar para as pessoas que a robótica, a programaçã­o e outras tecnologia­s nessa era da revolução digital estão por exemplo, nos aparelhos de raio-x ou nos equipament­os de tomografia, por exemplo”, cita.

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