Idosos desistem de processos judiciais
bitacionais, vagas reservadas noestacionamentoemaisolugar garantido por lei no transporte público são alguns dos avanços do estatuto. Porém, para Araújo, um dos principais problemas enfrentados está na prioridade na tramitação dos processos judiciais.
Recentemente, o documento sofreu uma alteração que prevê a preferência aos idosos com 80 anos ou mais. “Infelizmente, a prioridade na tramitação dos processos judiciais não vem funcionando muito bem. Na Justiça Federal, por exemplo, a maioria dos processos em tramitação é de pessoas com prioridade de tramitação, principalmente idosos ou portadores de doenças graves. Em um sistema no qual (quase) todos têm preferência, (quase) ninguém acaba tendo a preferência”.
O presidente da Asaprev (Casa do Aposentado), Marcos Barroso, reconhece também a importância do Estatuto que, pela primeira vez, tornou crime a negligência, discriminação, violência, inclusive a financeira, e crueldade e opressão contra o idoso.
“A vitória, sem dúvida, foi a criação do estatuto. Agora, sua efetivação em termos de benefícios é pouco consolidado. A lei precisa pegar. Não é só ter o aparo legal”, diz.
Criado pela Lei 10.741, em 1º de outubro de 2003, época em que o Brasil tinha 15 milhões de idosos - hoje são 30 milhões -, o Estatuto regulamentou os princípios da proteção integral e da prioridade absoluta às pessoas com mais de 60 anos. Para alcançar a efetivação da lei, Barroso defende a criação de um Fundo Estadual de políticas públicas para os idosos.
“É preciso criar esse fundo para que os recursos possam ser empregados diretamente em políticas que favoreçam a terceira idade. A lei ainda não foi aprovada na Bahia. Está em apreciação na Procuradoria”, afirma. Os crimes cometidos contra idosos a partir de 60 anos fazem parte da realidade brasileira, mas, muitas vezes, não ganham ênfase nas estatísticas da violência. Na Bahia, por exemplo, de acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), foram registrados 836 casos, entre 2015 e 2017, previstos nos artigos 95 a 108 do Estatuto do Idoso - que tratam dos crimes e contravenções.
Segundo o CNJ, no cenário nacional, no mesmo período, foram iniciados em tribunais de diferentes instâncias pelo menos 29,1 mil processos com o assunto Crimes Previstos no Estatuto do Idoso. De 2015 para 2016, houve aumento de quase 80% nos processos, e para 2017, de 25%.
Ainda sobre esse cenário, dados do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) apontam que 466 processos foram levados às fases finais no mesmo período. A variação do número de ações abertas é positiva em 76%, enquanto o número de ocorrências registradas é quase o dobro dos processos em tramitação nas varas estaduais.
Isso leva a duas situações, de acordo com o juiz Vicente Reis Santana, da Vara do Idoso de Feira de Santana, a única especializada no tema em todo o Brasil. A primeira delas é que tem havido aumento na busca por justiça nos casos que envolvem violência contra idosos. No entanto, o contingente ainda é quase metade dos registros.
O juiz explica que isso acontece em razão de os principais agressores fazerem parte da família dos idosos. “É muito comum observar que as vítimas são agredidas por filhos ou netos. O que acontece é que eles levam o caso à delegacia, mas na hora de depor perante o juiz, o depoimento muda, porque eles não querem culpar um membro da família”, declara Santana.
É muito difícil a conclusão de um processo de agressão que envolva idosos terminar com a condenação do réu. “As vítimas sempre encontram uma forma de livrar o agressor, por medo de represália, da solidão, ou por outro motivo. Em outro processo qualquer, por exemplo, de roubo, a vítima sente raiva do acusado e quer que ele pague pelo que fez. Não há emocional envolvido”, diz.
O juiz reforça que os principais crimes e violações a direitos de idosos acontece por causa de negligência, o que envolve maus-tratos e até tortura, e apropriação de patrimônio, principalmente do cartão da Previdência.
Todo esse processo de agressão contra idosos na Bahia e, de certa forma, em todo o Brasil, é, para o magistrado, “um processo cultural”. “Aqui não há respeito pelo idoso, que é tido, muitas vezes, como um peso na vida de filhos e netos. Eles não enxergam a pessoa mais velha como fonte de experiência, informação, aprendizado”, completa.