Correio da Bahia

‘Enfrentamo­s a incerteza, o frio e o cansaço’

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Era um dia normal de sábado e eu, que tenho costume de fazer esportes no final de semana, chamei dois amigos para irmos andar de stand up e ver o pôr do sol no Porto da Barra. Alugamos três pranchas e remamos. Eram umas 17h e curtimos o pôr do sol. Não havia aviso de mau tempo. Em torno de 17h30, ondas e ventos fortes começaram a se misturar. Ficamos presos numa forte correnteza.

Quando percebi a força da vazante, entendi que remar não adiantava mais e eu sabia que o ideal, nesses casos, seria ir para o lado oposto à correnteza: nem mais para o fundo e nem contra ela. Mas, já estávamos longe demais.

Olhei para Rita, que não tem o costume de nadar em águas agitadas, e ela estava com muito frio e cansando. Pedi para que parássemos. Falei com ela e com o André para não nadarem mais, para tentarmos manter a calma. Tínhamos apenas um colete salva-vidas em mãos e passamos a revezar. Horas estavam se passando e não havia movimento de barcos ou outras navegações. Sentamos nas pranchas, em cima dos remos para não os perdemos.

Foi então que avistamos um navio da Capitania. Fizemos uma rápida reunião sobre como pediríamos socorro a ele, já que estava distante. Foi então que houve um combinado: eu iria nadar para pedir o socorro, e eles ficariam aguardando. Quando se viu longe da praia do Porto do Barra, o trio de amigos cansou de tentar nadar contra a vazante. Rita Maria de Sales, que não tem costume de nadar, tentou manter a calma, mas estava cansando e com muito frio.

“Falei para todos mantermos a calma, e isso foi o principal para que ficássemos vivos. Eles são iniciantes, então tentei acalmá-los ao máximo”, alertou Geraldo da Conceição, que pratica stand up há anos.

Ele foi o primeiro a ser resgatado. Perto das 22h, o trio avistou um navio da Capitania dos Portos. Geraldo nadou por cerca de uma hora e foi resgatado às 22h59 e levado para o Hospital Naval, no Comércio, onde recebeu suporte médico.

“Queria voltar pro mar pra buscar eles, mas não deixaram. Quando voltamos, não os achamos mais. Foram levados pra longe com muita rapidez”, contou Geraldo. Rita Maria de Sales e André Vinícius ainda ficaram por mais 13 horas no mar. Entre as praias de Cacha-Pregos e Araruna, na Ilha de Itaparica, já próximo a Morro de São paulo, foram resgatados por um catamarã que fazia a linha Salvador-Morro de São Paulo. Depois, foram colocados numa embarcação da Capitania dos Portos e trazidos para Salvador.

“Eu, que sei nadar, mas não tenho muito costume, estava cansando mais fácil. Mesmo assim, manter a mente no lugar e imaginar que aquilo passaria foi de grande ajuda para ter forças. Quando nos encontrara­m, a maior sensação era de alívio e gratidão”, contou Rita.

O casal recebeu atendiment­o no próprio navio de resgate, e passou mais de uma hora tomando soro antes de pisarem em terra. Desde que Geraldo foi em direção ao navio e subiu nele, enfrentamo­s a incerteza, o frio e o cansaço pelas próximas 13 horas. A maré estava com muitas ondas e elas nos levaram para longe com muita rapidez. Perdemos o navio de vista. O que nos salvou foi estarmos com outra pessoa, mantermos a sanidade mental e pensar positivame­nte. Sabíamos que ele (Geraldo) estava nos procurando.

Continuamo­s segurando os remos, dando suporte com as pranchas e revezando o colete. Era importante que o outro pudesse repousar um pouco e que falássemos um com o outro para não haver sono ou distanciam­ento físico.

Eu, que sei nadar, mas não tenho muito costume, estava cansando mais fácil. Mesmo assim, manter a mente no lugar e imaginar que aquilo passaria foi de grande ajuda.

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