Correio da Bahia

Forma de controle cruel, diz promotora

- VEJA ONDE BUSCAR AJUDA EM CASO DE VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER NO NOSSO SITE: WWW.CORREIO24H­ORAS.COM.BR JÚLIA VIGNÉ

ele. Depois de dois meses de namoro, passou a me trancar dentro de casa, me espancar sem eu fazer nada. Ele deixava eu comer apenas uma vez por dia”, contou.

“Ele apagava o cigarro na minha nuca, no meu braço, no meu pescoço. Mordia as minhas costas. Já deu uma facada em minha perna. Queimava minhas pernas e braços com colher quente. Uma vez, atravessou a ponta de uma faca nos meus lábios. Me esmurrava do nada”, afirmou.

“Ele me batia tanto que as paredes de minha casa estão sujas de meu sangue. Certa vez, ele bateu tanto, mas tanto, que ele depois começou a usar cola comum para fechar os ferimentos. Como não conseguia, me esmurrava no mesmo lugar”, completou.

Para ela, o namorado surtava. “Não sei por que ele agia assim. Ele chegou a beber o meu sangue de uma das porradas que me deu. Ele gostava de figuras satânicas. Acho que ele surtava”, relatou.

DENÚNCIA

O caso foi registrado na Delegacia Especial de Atendiment­o à Mulher (Deam) de Camaçari e está sob os cuidados da delegada Florisbela Rodrigues. Marcos Alexandre da Silva não foi encontrado pelos policiais. A pedido da delegada, o juiz Ricardo José Vieira Santana concedeu medida protetiva a Deisiane, estabelece­ndo que Marcos deve ficar a 300 metros da vítima e dos familiares dela.

O processo já tramita no TJ-BA em segredo de Justiça. Ontem de manhã, o advogado do tatuador esteve na Deam e prometeu apresentá-lo, mas não deu um prazo. Apesar de não considerar o cárcere privado como um crime recorrente na Bahia, a promotora Márcia Teixeira, coordenado­ra do Centro de Apoio Operaciona­l dos Direitos Humanos (Caodh) do Ministério Público do Estado da Bahia (MP-BA), afirmou que a prática é a forma mais radical do controle, utilizada em casos de violência doméstica.

“O cárcere privado seria uma modalidade mais cruel da segregação da rede socioafeti­va, que é uma caracterís­tica do homem que pratica violência doméstica. Normalment­e, esse homem usa a técnica para que o controle da mulher fique mais fácil. Ele vai afastando aos poucos a rede familiar, associativ­a, espiritual dela”, afirmou Márcia, para quem a violência, muitas vezes, é silenciosa.

“É muito comum, nos casos de violência doméstica, o controle de ‘não vá, não faça, não estude, não quero, não trabalhe’. O cárcere seria um nível máximo de controle do corpo e do direito de ir e vir”, acrescento­u.

A promotora ainda destacou que é necessário uma maior atenção para o interior da Bahia, onde há aumento nos casos de feminicídi­o porque as cidades estão “desguarnec­idas de forças de segurança e sociais”.

No caso de Deisiane, Márcia Teixeira acredita que a tese de tentativa de feminicídi­o deve ser investigad­a pela delegada do caso. “Precisa saber se a intenção final dele era a morte, para verificar a tentativa de feminicídi­o. E tortura é crime hediondo”, disse.

A ativista Sandra Muñoz questionou a aplicação das políticas públicas para mulheres vítimas de violência, como Deisiane. “A gente tem vivido momentos de perda. Que políticas estamos falando? Eu, por exemplo, tinha uma casa que acolhia mulheres e LGBTs e ninguém nunca me ajudou”, criticou.

Ela estava amarrada numa cama, presa por uma corda. Estava muito fraca, sem comer, cheia de marcas pelo corpo. Foi terrível ver a minha filha naquele estado Robson Cerqueira Santos

43 anos, taxista, pai de Deisiane; foi ele que resgatou a filha na terça-feira

O cárcere seria um nível máximo de controle do corpo e do direito de ir e vir, uma modalidade mais cruel da segregação Márcia Teixeira Promotora do MP-BA

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