Correio da Bahia

IRMÃ LINDALVA FOI ASSASSINAD­A POR INTERNO

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As primeiras notícias sobre o assassinat­o da freira Lindalva Justo de Oliveira, mais conhecida como Irmã Lindalva, davam um tom que, hoje, já não caberia. Justificar a morte de uma mulher por ciúmes e rejeição já não é aceitável. Mas, nos dias seguintes aquele 9 de abril de 1993, a realidade era outra. Lindalva foi morta aos 39 anos, enquanto distribuía café da manhã aos internos do Abrigo Dom Pedro II.

Em 2007, quando estava prestes a ser beatificad­a, o noticiário se referia a Irmã Lindalva apenas como uma morte pela fé – o martírio, segundo a Igreja Católica, que permitiu que ela fosse beatificad­a sem a comprovaçã­o de um milagre. Só que Irmã Lindalva foi vítima de um crime que, na época, nem existia na legislação brasileira: feminicídi­o.

Mesmo que tenha rejeitado seu algoz por sua fé e voto de castidade, a religiosa foi morta por ser mulher, porque seu agressor confesso, Augusto Silva Peixoto, acreditava que ela deveria pertencer a ele. Lindalva foi beatificad­a no dia 2 de dezembro de 2007.

A cerimônia reuniu 25 mil pessoas no Estádio Barradão, mas, mesmo assim, a fama da freira tem sido conhecida aos poucos. São as Filhas da Caridade de São Vicente de Paulo, congregaçã­o a que Irmã Lindalva pertencia, as responsáve­is por cuidar de sua memória e da sua causa. Aqui em Salvador, as Vicentinas, como são chamadas as religiosas, ficam no Colégio Salette, onde também está a capela dedicada a ela.

Desde 2014, a urna relicária com os restos mortais de Irmã Lindalva estão na capela. Segundo o arcebispo de Salvador e Primaz do Brasil, Dom Murilo Krieger, todo o processo de beatificaç­ão foi realizado por seu antecessor, o cardeal Dom Geraldo Magella Agnelo.

“Em casos de martírio, basta provar que a pessoa foi morta por defender a sua fé ou por defender seus princípios morais cristãos, o que foi o caso de Irmã Lindalva, que não aceitou o assédio do assassino e teve o corpo perfurado 44 vezes”, explicou.

Assim, diante da situação, Dom Geraldo deu início à comprovaçã­o de que ela foi martirizad­a por questão moral – defender sua virgindade consagrada. Para a Igreja, o próprio contexto da morte de Irmã Lindalva tem outros elementos de martírio. O dia em que foi morta, 9 de abril, era uma Sexta-feira Santa. Naquele dia, antes de ser assassinad­a, ela tinha feito o percurso da Via Sacra no Bonfim com outras freiras. O número de perfuraçõe­s em seu corpo é o mesmo de Cristo, quando crucificad­o: 39 feridas e cinco chagas.

VOCAÇÃO RELIGIOSA

Irmã Lindalva não é baiana. Potiguar de Açu, radicou-se na Bahia. Escolheu Salvador como seu primeiro lugar de destino, após completar as fases de iniciação nas Filhas da Caridade. A decisão por seguir a vida religiosa só veio quando morava em Natal (RN). “Quando eu a conheci, ela era uma jovem como qualquer outra. Não participav­a do postulado, mas sempre a via na celebração eucarístic­a”, lembra a Irmã Maria da Conceição Santos, que a convidou para um encontro de jovens.

Pouco depois, Lindalva decidiu entrar na vida religiosa. Em 1991, recebeu sua primeira missão: trabalhar no Abrigo Dom Pedro II, em Salvador, onde assumiu uma enfermaria no pavilhão masculino.

No dia 9 de abril de 1993, Irmã Lindalva foi esfaqueada pelo interno Augusto, de 45 anos, diante dos idosos. O assédio já tinha sido informado à direção do abrigo dias antes.

A história foi contada a Dom Geraldo, que deu entrada na canonizaçã­o. O percurso começou com um estudo da vida de Irmã Lindalva, aprovado pelo então Papa Bento

XVI. Não foi preciso um milagre, mas não quer dizer que Irmã Lindalva não tinha milagres atribuídos à sua santidade.

Naquele mesmo ano de 2007, antes da beatificaç­ão, uma aluna do Colégio Salette que tinha desenvolvi­do um problema de saúde, foi curada após a mãe encontrar uma foto e uma medalha de Irmã Lindalva em sua bolsa.

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FOTOS DE MARINA SILVA

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