Medidas polêmicas contra a covid-19
O prefeito de Vitória da Conquista, Herzem Gusmão (MDB), foi a Brasília e se reuniu com o Ministério da Saúde com um documento em mãos: um abaixo-assinado com 124 assinaturas de médicos da cidade que solicitam o envio, pelo Governo Federal, de medicamentos para o suposto tratamento precoce e até preventivo ao coronavírus. Dentre as drogas defendidas pelo grupo, estão a cloroquina ou hidroxicloroquina, azitromicina e ivermectina.
A cidade no Sudoeste da Bahia não está só. O CORREIO identificou outros cinco municípios do estado onde o tratamento é adotado com algum apoio do poder municipal: Itaberaba, Itagi, Lençóis, Jequié e Porto Seguro.
Gusmão apoia a demanda desses médicos, que desenvolveram o protocolo com base nas “experiências positivas divulgadas por diversos profissionais em várias partes do mundo, inclusive no Brasil”, como diz um trecho do abaixo-assinado.
“O que a gente vê é que é uma doença nova. Nenhum médico tem experiência com ela. Quando você tá numa guerra, você deve usar a arma que você tem”, explicou o médico Péricles Melo Prado, integrante do grupo e consultor sobre efeitos colaterais das drogas usadas.
A prefeitura de Conquista não adotou nenhum protocolo de tratamento da doença com o uso desses medicamentos. Os médicos, no entanto, possuem autonomia para receitar as drogas, caso os pacientes aceitem. Péricles, por exemplo, é contra ao uso dos remédios sem prescrição. “O médico tem que autorizar e o paciente também”, destacou.
Essa autorização do paciente é necessária por não haver nenhuma evidência científica de que esses medicamentos realmente funcionem no combate ao coronavírus. “De fato, não vamos ter trabalhos que comprovem a eficácia, pois eles levam tempo para serem produzidos. Durante a pandemia, não há tempo hábil de fazer esses estudos”, defendeu Péricles.
Em Jequié e Porto Seguro, um protocolo foi emitido com orientações acerca do uso desses medicamentos. Já em Itaberaba, no Centro-Norte, e Lençóis, na Chapada Diamantina, as prefeituras estão se esforçando para adquirir esses remédios e abastecer as unidades de saúde para que eles sejam receitadas pelos médicos.
Um dos primeiros contaminados da cidade, o prefeito de Lençóis, Marcos Airton (PRB), admitiu a utilização da ivermectina. “Tem um médico que atende na cidade que teve o vírus e tomou o medicamento. Ele me orientou a fazer o mesmo. Tomei e, graças a Deus, não senti nenhum sintoma da doença. Diante de uma situação dessa, que não temos uma vacina, como temos esse medicamento, vamos distribuí-lo caso tenha alguém com sintoma”, afirmou.
Já Porto Seguro recebeu 40 mil caixas de hidroxicloroquina, graças ao pedido de uma médica da cidade ao presidente Jair Bolsonaro, que é defensor e afirma ter usado a medicação. Lá, o protocolo que possibilita o tratamento com o uso desses medicamentos foi publicado no final de maio.
“Aqui, os médicos que receitarem a droga devem acompanhar o paciente e o surgimento de possíveis efeitos colaterais. No geral, os médicos têm obtido sucesso no tratamento”, garantiu o secretário de Saúde da cidade, Kerrys Ruas.
Com pouco mais de 12,3 mil habitantes, a cidade de Itagi, no Centro-Sul baiano, também aderiu a este tipo de tratamento, que apelidou de “Kit-Covid”. De acordo com a Secretaria de Saúde do município, a medida tem o intuito de fazer com que as pessoas não precisem se deslocar até as farmácias. Os medicamentos estão sendo entregues a domicílio para pacientes com sintomas gripais.
Professor de Medicina da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (Uesb) e também prefeito de Itagi, Olival Andrade (DEM) disse que a adoção desta medida na cidade tem embasamento em seus 38 anos de carreira médica. O gestor afirmou ao CORREIO que não se inspirou em outro município e nem em estudos científicos para esta decisão. Olival reconhece que ainda não existem medicamentos que garantam a cura da covid-19, mas acredita que a hidroxicloroquina tem efeitos na recuperação de pacientes se usada na fase inicial da doença. “Temos que usar as armas que a gente tem”, comentou.
O Kit-Covid é composto por caixas de medicamentos à base de substâncias como hidroxicloroquina, paracetamol ou dipirona, loratadina e ivermectina. Como a hidroxicloroquina pode resultar em efeitos colaterais, a prefeitura disse que faz dois exames de eletrocardiograma por dia nos pacientes sintomáticos. Até ontem, a cidade tinha 13 casos, sendo que nove já são considerados recuperados.
“A partir do momento que o governo liberou o auxílio, sentimos um aumento progressivo das vendas, principalmente em maio e junho, em que elas foram superiores ao do ano passado”, constata Hebert de Souza, sócio da loja de materiais de construção Construsouza, em São Marcos, em que as vendas aumentaram 29% em junho deste ano em relação ao mesmo mês de 2019.
O dado foi ratificado pela Associação dos Comerciantes de Material de Construção da Bahia (Acomac-BA): enquanto que o consumo nas lojas de material de construção que ficam no centro da cidade reduziu em 12%, ele aumentou cerca de 8% nas lojas do segmento na periferia. Para o presidente da Acomac-BA, Geraldo Cordeiro, esse crescimento na periferia é consequência direta do auxílio emergencial.
A conclusão também foi tomada a partir da análise do perfil do cliente, que compra aos poucos e num valor abaixo de R$ 150. “É o consumo formiguinha, de construir um puxadinho, que vem segurando o setor. As pessoas destinaram uma parte do auxílio para poder ajustar a casa”, explica Cordeiro.
No geral, o setor de materiais de construção retraiu na pandemia. Dados mais recentes do IBGE apontam que, enquanto que em abril houve redução de 24%, em maio, o percentual foi de 5,1%, quando comparado aos mesmos meses de 2019. Ou seja, houve uma grande recuperação da categoria, principalmente em relação a outros setores, como o automobilístico, que continuou em baixa, agora de mais de 50%.
“Meus clientes de classe média sumiram todos, só quem tá comprando é do auxílio emergencial”, diz Gilberto Cerqueira, 60, proprietário de uma das maiores lojas de material de construção de Salvador: O Fazendão, em Cajazeiras. “A clientela que tá entrando na loja é gente que não tinha nada dentro de casa. Você vê a felicidade de comprar um só item”, narra Cerqueira, que diz ainda que seus clientes não compram muito. “Não tem compra grande, de R$ 1 mil. Sempre quando vem, compra um pouquinho. É coisa de 20m² de piso”, exemplifica.
Quem aproveitou para fazer reforma na casa foi Gabriela Silva, 23, que mora em Tancredo Neves. Por ser mãe solteira do menino Ian, 3, e não ter carteira assinada, ela teve direito a um auxílio mensal de R$ 1,2 mil. Começou a arrumar o andar de cima do imóvel em que morava com a mãe, além de estar construindo um muro na frente da casa. “As paredes já estavam levantadas, mas não tinha reboco. Coloquei forro PVC, piso, vaso sanitário, pia do banheiro e vou pintar as paredes”, planeja.
Carolyna Teixeira, 29, estudante de pedagogia e moradora de Lauro de Freitas, também conseguiu o mesmo valor do auxílio. Mãe solteira de duas crianças e beneficiária do Bolsa Família, Carolyna já tentava fazer a reforma em sua casa há quase três anos, mas nunca sobrava dinheiro. “Tinha que me dividir por três”, diz.
Depois que começou a receber as parcelas de R$ 1,2 mil, a estudante reformou seu quarto, mudou a parede, comprou beliche e um guarda-roupa para os filhos. Com as próximas parcelas, ela planeja ainda comprar uma TV para a avó. “Nada mais justo do que investir neles”, completa.
Segundo a Acomac-BA, os produtos mais comprados são blocos, cimento, piso e cerâmica para a construção, assim como telhas e materiais impermeáveis para se proteger das chuvas - o mês de abril de 2020 foi o mais chuvoso dos últimos 14 anos, de acordo com a Codesal - e também equipamentos para a manutenção da rede elétrica, como resistências e disjuntores, além de varais e louça sanitária.
Para famílias com renda de até três salários mínimos, a Prefeitura de Salvador, através da Secretaria Municipal de Infraestrutura e Obras Públicas (Seinfra), disponibiliza arquitetos e engenheiros para elaboração de projetos de construção ou ampliação de imóveis. O serviço é gratuito, mas, como só pode ser realizado com atendimento presencial, está suspenso por conta da pandemia.
A Faculdade de Arquitetura da Universidade Federal da Bahia (Faufba) também oferece ajuda gratuita. Para mais informações, é só mandar e-mail para a coordenadora do projeto, professora Rosana Muñoz: munoz.rosana@gmail.com.