Correio da Bahia

Mais dívidas, mais problemas

Bahia Taxa de famílias endividada­s atingiu 66,3% em agosto, maior percentual desde 2015

- Vinícius Nascimento REPORTAGEM vinicius.nascimento@redebahia.com.br

Dados da Pesquisa de Endividame­nto e Inadimplên­cia do Consumidor (Peic), da Fecomércio-BA mostram que a taxa de famílias endividada­s na Bahia atingiu 66,3% em agosto, maior percentual desde março de 2015. No mês anterior, a taxa registrada foi de 65,6%. Em termos absolutos, mais 6,8 mil famílias entraram no rol de endividada­s, para um total atual de 615 mil famílias com algum tipo de dívida.

Hoje desemprega­da, Évelin Oliveira está nesse rol de pessoas. Só que além de endividada, a jovem de 21 anos também está inadimplen­te aquelas pessoas que têm a dívida e não conseguem honrar o compromiss­o. De acordo com a Fecomércio-BA, a taxa dos que dizem que não pagarão a dívida em atraso ficou praticamen­te estável, de 13,6% em julho para os 13,3% em agosto. Contudo, o percentual é cerca do triplo visto no mesmo mês em 2019.

Consultor econômico da Fecomércio-BA, Guilherme Dietze diz que esses números indicam um quadro de dificuldad­e em equilibrar o orçamento doméstico diante da alta do desemprego e perda de renda.

Évelin passou por essa situação. Sua dívida nasceu quando terminou o Ensino Médio em Alagoinhas e retornou para Salvador. De volta à capital, começou a trabalhar com telemarket­ing e, além de ajudar nas contas de casa, começou a comprar o material para realizar um sonho: reformar o seu quarto.

Sem condições de fazer todo o investimen­to à vista, recorreu ao cartão de crédito e foi assim que nasceu a sua inadimplên­cia - que hoje gira em torno de R$ 3 mil e foi crescendo principalm­ente após ela perder o seu emprego.

Segundo Dietze, o cartão de crédito é o tipo de dívida mais recorrente em Salvador: 9 de cada 10 soteropoli­tanos precisam pagar fatura do cartão. “O crédito pessoal vem na segunda posição, mas com um percentual bem mais adequado, 7,3%. São dois tipos de crédito diferentes. O cartão como forma de consumo do dia a dia e o crédito pessoal, no qual o consumidor precisa solicitar ao seu banco e, normalment­e, são usados para pagamento de dívidas em atraso”, diz.

Para Dietze fazer a separação entre endividame­nto e inadimplên­cia é importante para entender que o aumento do endividame­nto por si só não é algo negativo. “A situação fica crítica quando as famílias não conseguem quitar esses compromiss­os. É exatamente o atual cenário, com aumento da inadimplên­cia pelo 9º mês consecutiv­o, atingindo 30,8% em agosto, maior percentual desde março de 2013”, diz o economista.

Educador financeiro há 26 anos, Mário Santana afirma que esse endividame­nto não é algo pontual por já ter um cresciment­o contínuo há 9 meses seguidos. O especialis­ta aponta que esse acontecime­nto tende a ter mais ligação com a necessidad­e de comprar produtos e serviços essenciais.

“O cartão de crédito dá um acesso fácil ao crédito e, em uma situação de restrição, as pessoas tendem a apelar para essa alternativ­a para manter as coisas minimament­e em ordem. Só que é algo muito imediatist­a e que pode ter impactos futuros, como a inadimplên­cia”, explica.

DESEMPREGO

A inadimplên­cia das famílias com renda de até 10 salários mínimos atingiu os 34,7%, enquanto a taxa para os que ganham acima de 10 salários mínimos foi de 3,5%. Em 2019, a taxa era igual para os que recebem mais, porém para as famílias com renda mais baixa o percentual era de 15%.

O desemprego foi o motivo para Maria Clara Fernandes, 36, utilizar mais o cartão de crédito. Ela perdeu a sua vaga como representa­nte comercial em junho e demorou para receber o valor da rescisão do antigo empregador.

Por esse motivo, passou a usar aquele que sempre enxergou como vilão. “Eu vejo gente aqui em casa numa loucura usando e eu sempre evitei porque sou gastadeira e já tive problemas com o cartão de crédito quando era mais nova. Por isso, controlo os gastos com mão de ferro para não sujar a única coisa que tenho de valor que é o meu nome”, analisa.

Embora o dado de julho tenha mostrado um saldo positivo entre admitidos e demitidos, na Bahia, de +3,2 mil empregos formais, o acumulado desde março é de -70 mil, segundo aponta o Cadastro Geral de Empregados e Desemprega­dos (Caged), do Ministério da Economia.

DICAS

Santana aponta que o cartão de crédito não precisa ser visto como vilão, mas precisa ser utilizado de maneira planejada e consciente para evitar dor de cabeça. É sempre bom lembrar que a inadimplên­cia traz consigo situações desagradáv­eis como dificuldad­e para conseguir financiame­ntos, além da cobrança quase diária pro telefone.

No entanto, Santana explica que o uso do crédito é “positivo e muitas vezes necessário” em algumas situações. Para evitar a inadimplên­cia, o educador financeiro aconselha que as pessoas analisem e tomem costume de registrar num caderninho ou numa planilha todos os gastos.

Utilizar apenas um cartão é outra dica que o especialis­ta oferece. Dessa forma, fica mais fácil de não se empolgar e, mais do que isso, não se perder com os gastos. Por fim, ele sugere colocar como limite do cartão o valor máximo 50% de toda a sua renda líquida.

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