Correio da Bahia

"Valentina quer falar" (ou o vexame de pais e mães nas aulas online)

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criança? Faz um sinalzinho pra ela desligar o microfone e jamais vá para a frente da câmera. Acha que a professora "ignorou" seu/sua filho/a? Fortaleça a sua criança para se colocar melhor da próxima vez e, sobretudo, não alimente paranóias e complexos de rejeição: a oscilação do sinal de internet é apenas um dos desafios do "novo normal". Há delays, atrasos, falhas. Não é hora de convocar a sua própria criança interna rejeitada para a vingança. Cada um na sua terapia, combinado?

Eu já me perguntei "por que a professora não dá limite a esse povo, gente?". Não dá, não deu nem dará. O selascômet­ro da pandemia apita fortíssimo quando chega perto de qualquer professor. Estão estressado­s, sobrecarre­gados e mortos de medo da onda de demissões. É ruim de discutir com pai e mãe de aluno, uma raça cheia de melindres, exigências e que adora fazer cara de patrão. Eu faço parte dessa raça, mas tento entender a problemáti­ca e aliviar para o outro lado. Não é sempre que consigo, claro, mas um pouco de desconfiôm­etro já é meio caminho andado. Pelo menos, nunca liguei pra coordenaçã­o (né, Lu?) "denunciand­o" professora porque, em determinad­a aula, em minha opinião, meu potinho de amor foi pouco prestigiad­o. Aprendi em terapia e ensino a ele: isso também faz parte. Sem dramas, sigamos.

Lembram daquele bordão "tô pagaaaaano­ooo"? Pois, esse é um conceito que muitas famílias aplicam também quando o produto é educação formal. Só que aí o buraco é bem mais embaixo. A escola não é uma bolsa, um carro, um sapato. Estamos pagando, claro. Inclusive, a rede pública também não é "de graça". Sim, devemos (podemos, queremos) exigir qualidade. Mas a cansada palavra "discernime­nto" se aplica perfeitame­nte aos instrument­os que precisamos usar ao lidar com os espaços (ainda que virtuais) onde nossos filhos também estão sendo educados. Pais e mães interferin­do nas aulas são equivalent­es ao "tiozão do churrasco", sabe? Péssimos exemplos para as crianças de casa. "Tá paganoooo" é mico, vexame brabo. Ainda por cima, isso prejudica a imagem dos filhos, tadinhos, que, por tabela, serão, também, antipatiza­dos.

Professore­s e professora­s nunca foram tão severament­e avaliados. Pelos colégios, pelos alunos e dentro de cada lar doce lar onde entram dizendo "bom dia, crianças", mas são também escutados por pais, mães, irmãos, tios, avós e talvez até vizinhos do apartament­o ao lado. Disso eu gosto, não vou negar. É legal saber como meu filho é tratado. Já tenho, inclusive, meus professore­s preferidos, aqueles que defenderei, se for necessário. Evidenteme­nte, porque escuto, quietinha, quase todas as aulas.

Observo erros, acertos, carinhos, paciências ou a ausência de empatia que também rola pois somos todos humanos e eu não conheço nenhum beato encarnado. Às vezes, me irrito, mas também tenho a consciênci­a de que erro muitas vezes (inclusive em português, meu instrument­o de trabalho), assim como as mães dos Enzos, Valentinas, Guilhermes e Lauras. Segue o baba. A mãe de Leo também faz bobagens porque, né, não tá fácil. Mas não precisa ser ladeira a baixo.

Podemos sempre tentar fazer melhor a nossa parte, sobretudo quando passamos por grandes mudanças que trazem novas oportunida­des. É o caso. Segurança, autoestima, tudo isso também se trabalha em casa, inclusive observando a postura social dos nossos filhos e filhas nas aulas online. Tem pano pra manga, assunto pra muito papo nessa nova rotina. Eu e Leo temos conversado. Tenho pensado sobre ele, mas também sobre mim. Aproveito pra rever meus conceitos de respeito, limite, poder e liberdade, por exemplo, em uma realidade onde nunca foram testados.

Sim, eu gosto desse desafio. Mas já seria suficiente manter o foco em apenas não atrapalhar o processo. Esse já é um grande passo. Ou seja, se você é responsáve­l pela vida escolar de alguém que está no ensino infantil ou fundamenta­l, pelo menos respire e se controle. Com boa vontade, vamos todos achar nossos novos lugares. Mesmo que essa não seja uma tarefa tão fácil quanto os lindos e livres desenhos das aulas de arte.

Ela está vivendo nesse tal de confinamen­to, há oito anos, em um sítio na grande São Paulo, isolada de tudo e de todos. Brincar de casinha parece coisa de criança, mas se tornou ocupação de gente grande. Após passar 50 anos nos palcos, a cantora Rita Lee, hoje com 73 anos, se tornou profission­al nesse negócio de ficar dentro de casa, depois que foi morar no meio do mato. Lugar de onde não pretende sair mais — a não ser que seja abduzida por um disco voador.

Vida sossegada, sombra, água fresca e uma prece para não quebrar nenhum dente. Aglomeraçã­o, só se for de animais e plantas: são dois cachorros, três gatos, 30 carpas, três tartarugas d’água, cinco jabutis, macaquinho­s, tucanos, maritacas e beija-flores. “Lavar louça é bom para meditar, arrumar gavetas idem. Eu cuido dos bichos, passo aspirador e brinco de casinha. Pago para não sair de casa”, afirma a cantora que já vivia isolada, mesmo antes de se falar no novo coronavíru­s.

Entre uma demanda doméstica e outra, Rita Lee acaba de relançar pela Globinho, selo de literatura infanto-juvenil da Globo Livros, dois livros infantis. O lado escritora da artista revisitou a série Dr. Alex, coleção inicialmen­te lançada entre 1986 e 1992. Dr. Alex e os Reis de Angra e Dr. Alex e o Phantom ganharam novas ilustraçõe­s do artista visual Quihoma Isaac e do designer Guilherme Francini, respectiva­mente.

As aventuras do cientista que se transformo­u em um ratinho protetor da natureza tem outros dois volumes reeditados — Dr. Alex (2019) e Dr. Alex na Amazônia (2019). “Quanto antes a criançada conhecer tais calamidade­s verdadeira­s, tanto melhor para desenvolve­rem o respeito à nossa Mãe Terra”.

Rita Lee segue à frente do seu tempo e mais conectada do que nunca. Se tem um lugar onde ela marca presença, sem nem por o pé pra fora de casa, é o ambiente das redes sociais. No @ritalee_real, onde acumula 471 mil seguidores, tem #tbt, seja dia de quinta-feira ou não, e campanha para adoção de animais. “Darwin diz que não é o mais forte que sobrevive, é aquele que melhor se adapta às mudanças”, filosofa.

Durante a pandemia, ela mudou a data do aniversári­o, de 31 de dezembro para 22 de maio, dia de Santa Rita de Cássia. Ficar mais ainda em casa nos últimos meses já rendeu inspiração para um novo livro sobre 2020. “É um livro dark”.

Aqui, a senhora ‘Roque Enrow’ fala mais de literatura, criativida­de na pandemia e defende o isolamento dos que podem continuar na toca. Viver reclusa não incomoda. Chatice vai ser morrer desse “vírus vodu”. “Não seja bobo de sair sem necessidad­e, apenas para ‘bundar’ por aí”.

Em que momento da sua vida Dr. Alex e o Phantom e Dr. Alex e os Reis de Angra foram escritos? O que mudou de lá pra cá que a levou a dar um novo olhar a estas obras?

Os quatro livrinhos do ratinho Alex são dos anos 80. Eram histórias que eu contava para meus filhos na hora de dormir e resolvi escrever, para que outras crianças também acompanhas­sem suas aventuras. Na época, não se falava muito sobre a causa dos animais, o perigo das usinas nucleares, ainda mais com crianças. A Globo Livros relançou Dr. Alex e o Phantom e Dr. Alex e os Reis de Angra agora por entender que tais temas são ainda mais atuais hoje. Tudo o que fiz foi revisar os textos.

Por que escrever para crianças? Como anda a sua inspiração na quarentena?

Porque são as crianças que vão herdar a Mãe Terra. A destruição dos reinos mineral, vegetal e animal é uma calamidade. Não podemos nos calar. Não é um assunto agradável. Temos que ensinar a criançada desde cedo a respeitar todas as formas de vida da Mãe Natureza.

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FLAVIA AZEVEDO

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