Tráfico no Subúrbio à moda miliciana
Lobato Facção cobra ‘taxa de segurança’ e já matou comerciante que se recusou a pagar
O que antes era exclusivo dos morros controlados pela milícia no Rio de Janeiro já é copiado por uma facção baiana na região do Subúrbio Ferroviário de Salvador. Faz pouco mais de um ano que traficantes do Comando da Paz (CP) cobram taxas semanais aos comerciantes para que eles mesmos não arrombem ou assaltem os estabelecimentos. Quando o dono da loja não aceita a extorsão ou atrasa o pagamento, tem o mesmo destino de Robson dos Santos Batista, 35 anos. Ele e o sobrinho foram mortos no ferro-velho da família, no Lobato, em julho do ano passado. Com medo, muitos têm fechado as portas.
Entre o ano passado e esse ano, dez ferros-velhos fecharam por causa do tráfico esses estabelecimentos, no entorno da Avenida Suburbana, são as principais vítimas. É por isso que, após execuções de Robson e do sobrinho, Osmar Gonçalves Batista Neto, 29, outros donos de ferro-velho abandonaram seus negócios. Eles entenderam o aviso e partiram com medo de terem o mesmo fim.
Os valores da 'taxa de segurança' exigida variam de R$ 50 a R$ 100 por semana.
Em maio deste ano houve outro ataque. O dono de uma sucataria pagava R$ 100 por semana, mas ligou para o traficante responsável pela cobrança e argumentou que não tinha como pagar porque o estabelecimento estava fechado por conta da pandemia. Foi baleado na porta da sucataria, mas sobreviveu.
A Polícia Civil disse que está “investigando a cobrança de ‘pedágio’ para os traficantes, inclusive com algumas prisões já representadas e deferidas pelo Poder Judiciário”. Informou também que a morte de Robson foi motivada “pela recusa do pagamento das taxas” e que o inquérito policial foi remetido à Justiça no dia 6 de setembro do ano passado com autoria definida – o acusado foi preso em 19 de maio deste ano.
Segundo a denúncia feita ao CORREIO, os donos de estabelecimentos depositam o dinheiro em três contas movimentadas pela facção. O responsável por recolher o montante e comandar as extorsões é o traficante Lambão, gerente da CP em Cosme de Farias, onde o comércio de drogas é chefiado por José Carlos Ferreira dos Santos, o Zóio de Gato. Zóio de Gato vem tentando se reestruturar em outros bairros, já que está sendo atacado pela Ordem e Progresso (OP), que também está no Lobato e quer o controle absoluto do bairro.
O CORREIO teve acesso ao comprovante de um dos depósitos, de junho. O valor foi creditado na conta 4157-4 de uma mulher de iniciais E. C. S. M. A conta é da agência 1450 da Caixa Econômica, na Estradas das Barreiras, Cabula. Coincidência ou não, a agência é próxima à Lajinha, na Engomadeira, onde o tráfico é comandando pelo CP. O CORREIO perguntou à Polícia Civil sobre a investigação do depósito, que disse que a apuração “está em andamento”.
TAXA
Apesar de a Polícia Civil não ter fornecido mais detalhes, alegando prejuízo ao trabalho de investigação da 3ª Delegacia de Homicídios (DH-BTS), comerciantes e moradores disseram ao CORREIO que a taxa é cobrada aos estabelecimentos da Avenida Pontilhão, um dos acessos ao Lobato, e às margens da Avenida Suburbana, entre o novo viaduto Lobato x Pirajá e o Atacadão Supermercado.
Em todos os relatos, os entrevistados tiveram os nomes preservados porque correm risco de morte. Eles disseram que as cobranças começaram em junho de 2019. Os valores variam de acordo com o tamanho do ponto comercial.
“Os traficantes começaram a levar panfletos para os comerciantes, avisando que a partir daquele momento teriam que pagar uma taxa semanal. Depois disso, o pagamento passou a ser feito por deposito bancário. Eles enviam áudios ameaçando a gente”, disse uma fonte.
Todo final de semana, três mulheres ligadas à CP passavam pelas lojas lembrando aos comerciantes do pagamento. “Inclusive, duas delas foram pegas há pouco tempo pela Polícia Militar”, relatou a fonte. No dia 31 de julho deste ano, duas mulheres foram presas por policias militares em Boa Vista do Lobato. A Secretaria da Segurança Pública (SSP) da Bahia informou que elas integravam uma facção e que ameaçavam comerciantes.
COMERCIANTES
Na última quinta-feira (3), o CORREIO circulou pelo trecho onde os traficantes praticam a extorsão e, depois de várias tentativas, seis comerciantes concordaram em falar – cinco donos de ferros-velhos. O primeiro disse que, uma semana antes da prisão, três mulheres ligadas à CP foram até ele. “Elas disseram: ‘Os caras estão cobrando o pedágio'. Tem que pagar a taxa para trabalhar. Me cobraram R$ 80”, contou.
“Na semana que iam me cobrar, elas foram encontradas pelos policiais. Mas não vou ficar para esperar que outros voltem. Estou arrumado as coisas para ir embora. Vou para o interior”, disse ele.
Há mais de 20 anos vendendo e comprando sucatas, um comerciante disse que nunca passou por isso. “O tráfico não afetava a gente. A briga era entre eles lá e nós não entrávamos em nada. Agora, esse grupo novo que chegou aí veio com tudo”, contou. Ele recebeu uma cobrança por mensagem no celular.
“Quando li, nem acreditei. Pedia dinheiro para garantir a minha segurança, de minha loja e não tive escolha”, relatou ele, que paga R$ 80.
Um outro dono de ferro-velho disse que deposita R$ 50. “São R$ 200 no mês. Mesmo na ocasião que não se podia abrir, por determinação da prefeitura, eles não queriam saber”, contou ele.
“Numa época em que as coisas estão difíceis por conta da pandemia, tenho que dar ao tráfico R$ 260 para não ser vítima deles mesmos”, desabafou outro comerciante.
A nota de R$ 200, que tem a figura do lobo-guará estampada no verso, começou a circular no início do mês. Se essa nota chegar ao seu bolso, especialistas em investimentos têm um conselho para fazer a grana render. A pedido do CORREIO, eles indicaram cinco tipos de aplicações onde dá para investir com R$ 200. Entre as sugestões, estão o Tesouro Selic, os Fundos Imobiliários, CDBs (Certificado de Depósito Bancário), o Fundo DI e também o mercado de ações.
“Em tempos de pandemia, há pessoas que estão deixando uma reserva em casa para não ter que ir ao banco com frequência. Hoje em dia, graças à tecnologia e às plataformas, é possível ter acesso a opções de investimentos de quaisquer perfis, desde a renda fixa mais conservadora até as ações, passando por fundos multimercado arrojados e fundos imobiliários”, pontua a estrategista-chefe da Órama Investimentos, Sandra Blanco.
Antes mesmo desta nota chegar até a sua carteira é importante entender o perfil desse investidor e seu apetite ao risco para saber qual o lugar mais indicado para guardar esses R$ 200 mês a mês. O conselho é do analista de alocação da Rico Investimentos, Lucas Collazo.
“É fundamental também conhecer o horizonte de investimento, entender qual o prazo médio para se ter um resultado naquela aplicação. É preciso ainda ficar atento às taxas de administração, prazo de liquidez mínimo — ou seja, em quanto tempo poderá resgatar o valor —, rentabilidade oferecida e se há incidência de imposto de renda”.
MOTIVOS
De acordo com o Banco Central, a criação da nova nota foi uma demanda da pandemia, que levou a um aumento do uso de dinheiro em espécie. Em momentos de crise, aumenta a tendência de saques para formação de reservas. A medida também se antecipa como uma estratégia para diminuir o impacto do entesouramento - ou seja, o dinheiro guardado em casa - e, com isso, diminuir as transações com dinheiro vivo, economizando com impressão de papel-moeda. Com a redução da atividade econômica, os valores não retornaram com a velocidade esperada.
Outra razão apontada pelo BC está na demanda criada pelo pagamento do auxílio emergencial. “A quantidade de dinheiro em circulação é adequada e não há falta de numerário. Mas não sabemos por quanto tempo os efeitos do entesouramento trazidos pela pandemia vão perdurar. Como o dinheiro ainda é base das transações, entendemos que o momento é oportuno para o lançamento da cédula”, disse a Diretora de Administração do BC, Carolina Barros.
Tesouro Selic O diretor de Relações com o Mercado da Ativa Investimentos, Sylvio Fleury, destaca que é ter disciplina e estabelecer metas. Por isso, uma das alternativas é investir no Título Selic. “O investidor deve se perguntar onde deseja estar em 10, 15 anos. Certamente, no médio e longo prazo, os resultados vão aparecer. Os títulos do tesouro são os mais seguros”.
CDBs O investimento de renda fixa é uma boa opção para os mais conservadores e é uma das alternativas mais comuns à poupança, como aconselha a assessora de investimentos e sócia-fundadora do escritório Ikedo Investimentos, Luciana Ikedo. “A poupança apresenta hoje juro real negativo. O primeiro ponto é avaliar se o recurso destina-se ao curto, médio ou longo prazo. Os CDBs são aplicações conservadoras e de baixo risco”, diz.
Fundo de investimento imobiliário Um bom ponto de partida para quem tem R$ 200. “Possibilita investir em empreendimentos imobiliários comerciais e industriais sem a necessidade de grandes aportes. Outro ponto positivo é a isenção de Imposto de Renda nos dividendos para pessoas físicas”, explica o consultor de mercado financeiro para o aplicativo Kinvo, Beto Assad.
Fundo DI Tem como vantagem o baixo risco, visto que possui grande parte do investimento em títulos públicos. Não tem taxa de administração. “É por aqui que tem que começar. O primeiro objetivo financeiro deve ser constituir essa reserva, com valor mínimo de seis vezes a renda mensal. O investimento é de perfil conservador, mas é indicado para todos os perfis de investidores”, explica a estrategista-chefe da Órama Investimentos, Sandra Blanco.
Ações O analista de alocação da Rico Investimentos, Lucas Collazo, diz que o segmento de renda variável tem se tornado cada vez mais atrativo por conta da taxa de juros em mínima histórica de 2% ao ano. “Dessa forma, outros ativos mais conservadores podem acabar entregando uma rentabilidade inferior à da renda variável”.