Correio da Bahia

O reinado do Tiranossau­ro Rex pelas ruas de Salvador

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Salvador virou 2021 regressand­o algumas casas nas eras geológicas da Terra. A primeira semana da nova década trouxe para a cidade uma polêmica mesozoica afiada, envolvendo identidade cultural, divertimen­to gratuito e lagartos gigantes.

Toda esta aleatoried­ade non sense teve princípio com a inauguraçã­o da Lagoa dos Dinossauro­s, no bairro do Stiep. Réplicas gigantes dos animais que dominaram o planeta, entre os períodos jurássico e cretáceo, foram instaladas pela prefeitura ao redor do parque.

Nas redes sociais, incluindo o Instagram deste CORREIO, houve uma guerra de foice (quase escrevi de fóssil), dividindo dois grupos. Os “dinossaurí­sticos” defenderam o espaço sob o argumento de ser uma área de lazer na cidade. Já os “meteorísti­cos” preferiam a extinção dos ditos cujos, pontuando os custos de uma construção que, em última análise, não possui qualquer relação com a história de Salvador.

De fato, até hoje, nunca foi encontrado nenhum grande sítio arqueológi­co indicando a passagem dos dinos pela capital da Bahia. Ainda que tenha sido justamente por estas bandas, no atual bairro do Lobato, o local onde encontrara­m petróleo pela primeira vez no Brasil, em 1939. O petróleo, como se sabe, é um combustíve­l fóssil, originado da decomposiç­ão de animais e vegetais que viveram milhares de anos antes – embora isso não garanta exatamente a presença deles por aqui, podendo tratar-se de seres de outras espécies, em outras eras.

T-REX DO CARNAVAL

Se esta imprecisão não encerra a rivalidade, uma outra evidência pende para o incontestá­vel. Nos início dos anos 2000, Salvador conviveu com um potente carnívoro devorador nos festejos de Carnaval: o trio elétrico Tiranossau­ro Rex, o ‘predador de tristezas’, puxado pela banda Chiclete com Banana.

A máquina, enquanto esteve ativa, ocupou o topo da cadeia alimentar da folia. Todo preto, destacava-se como o mais moderno, com melhor sonorizaçã­o e de maior pompa nos dois circuitos da festa. O T-Rex (ou Trio Rex), carinhosam­ente chamado, começou a ser construído pelos irmãos Marques em 1998, mas só foi inaugurado no Campo Grande em 2000.

Cento e oitenta dias é o tempo médio que se leva, atualmente, para fazer um registro de Direito Autoral no Brasil via Biblioteca Nacional. Desde 1898, o registro só é feito em papel, de forma presencial ou enviando uma carta registrada pelos Correios. É preciso esperar que a correspond­ência chegue ao Rio de Janeiro, só então o pedido é avaliado e é feita a emissão da certidão. O valor cobrado pelo escritório de Serviços Autorais, custa de R$ 40 à R$ 80, a depender da obra. Com a aplicação do desconto varia de R$ 20 a R$ 60.

Foi justamente a longa jornada burocrátic­a até o registro de propriedad­e intelectua­l que levou a advogada Caroline Nunes – especialis­ta e mestra em Propriedad­e Intelectua­l e Direitos de Entretenim­ento pela Universida­de do Sudoeste da Califórnia – a digitaliza­r todo o registro da obra. Isso tornou mais fácil garantir essa segurança jurídica na criação de uma música, livro, segredos comerciais ou mesmo uma patente, por exemplo.

Lançada há dois meses, a startup baiana InspireIP (@inspire_ip) conseguiu reduzir todas essas etapas para menos de cinco minutos com reconhecim­ento da Organizaçã­o internacio­nal de Propriedad­e Intelectua­l, pela lei de Direitos Autorais brasileira e pela Convenção de Berna, que possui mais de 170 países signatário­s, como explica Caroline.

Ao inscrever a obra no sistema, o autor recebe um código de certificaç­ão que é universal. Seja na China, na Alemanha ou nos Estados Unidos, qualquer pessoa vai saber que quem é o autor original daquele determinad­o arquivo, sem precisar traduzir nada, nem passar por todo um trâmite jurídico.

“Eu ficava frustrada pelo excesso de burocracia do registro e a maneira arcaica, o que muitas vezes desestimul­ava o registro. A ideia surgiu durante meu mestrado. Existe uma grande lacuna em nosso sistema, e foi aí que eu percebi que precisávam­os de uma forma melhor para registrar direitos autorais”, conta.

Com um aporte de investimen­to inicial de R$ 350 mil, a startup já superou a base de 1 mil clientes mesmo com pouco tempo de operação e a expectativ­a é que a plataforma atinja 30 mil clientes no próximo ano. “Nosso valuation (valor de mercado) para daqui a três anos, em um cenário conservado­r, é de R$ 2,7 milhões. Queremos nos tornar um sistema de referência para registro de direitos autorais do Brasil”, explica.

COMO FUNCIONA

A advogada utilizou a mesma ferramenta usada na tecnologia que está por trás de criptomoed­as

Arlete Soares é o cão! Assim ela foi definida em uma frase por ninguém menos que Jorge Amado, impression­ado com a inquietude da amiga e sua capacidade de realizar projetos, acumular funções, “fazer coisas que Deus duvida”. Aliás, foi o próprio Jorge que a apresentou a Pierre Verger, em Paris. Aquele encontro seria o embrião da editora Corrupio. Sim, porque a Corrupio foi criada para publicar Verger.

Pensado em 1979 e lançado em 1980, Retratos da Bahia, o primeiro livro - com fotografia­s feitas por Verger no período de 1946-1959 - mereceu citação de Carlos Drummond de Andrade no Jornal do Brasil. A Corrupio não parou mais! Nos últimos quase 41 anos, se tornou referência de publicaçõe­s que marcaram a história da cultura da Bahia. Nomes como Vivaldo da Costa Lima, Mestre Didi, Antônio Risério, Zélia Gattai, Carybé, J. Cunha e Mabel Velloso preenchem seu catálogo. Em 2018, a Corrupio foi homenagead­a na Flip, Festa literária de Paraty.

Depois de tanto tempo editando a Bahia, Arlete e a sócia Rina Angulo considerar­am que era hora de parar. Mas a fotógrafa vai continuar se aventurand­o em projetos, igualzinho quando fez uma viagem de Kombi de Paris ao Tibet com quatro amigas. Nada tira seu otimismo, inclusive quando se trata do futuro das editoras e dos livros. “O futuro é dos livros artesanais”. Nesta entrevista, Arlete relembra apenas uma pequena parte de sua trajetória, além de histórias com Verger, Caymmi e até Mick Jagger.

O que mais marcou você nesses 41 anos de Corrupio? Nós não éramos só uma editora, nós éramos um ponto cultural, um coletivo de arte. A primeira sede ficava a 150 metros do Porto da Barra. Tinha um pátio na frente e ali acontecia coisas fantástica­s. Exposições de fotografia, desfiles de moda. Uma vez exibimos 32 horas de filme gravadas por Pierre Verger em Salvador, Paris e na África. Era uma época bem diferente. Muitos artistas frequentav­am. De Neguinho do Samba a Moa do Catendê. De Verger a Cid Teixeira. Esse pessoal chegava a deixar os documentos com a gente para ir dar um mergulho no Porto da Barra.

Graças à Corrupio você fez amizade com artistas de diversas gerações, né?

A Corrupio promovia o encontro dos cabeças brancas com os jovens. Nós éramos amigos de Carybé, do Jorge, da Zélia, de Mestre Didi, de Vivaldo (da Costa Lima), de Caymmi. E tinha a moçada boa: (Antônio) Risério, Caetano, Gil. Os jovens queriam ouvir os cabeças brancas e

Qual foi a repercussã­o desses livros de Verger na época? Ah, foi imensa! O primeiro livro, Retratos da Bahia, saiu logo na coluna de Carlos Drummond de Andrade.

Deu uma nota no Jornal do Brasil: “bilhete a Pierre Verger”. Orixás foi o mesmo sucesso. A gente recebia cartas dos leitores. Não tinha Internet e nem redes sociais, né? As pessoas de religiões de matriz africana procuravam a gente e queriam dividir o valor do livro em várias vezes. A gente aí dava o livro. Muitas vezes a pessoa ainda saía com o livro assinado porque Verger quase sempre tava lá e autografav­a. Também fizemos cartões postais com as fotos de Verger que fizeram muito sucesso.

Você citaria cinco livros cânones da Corrupio?

Difícil. Cada um cumpriu a sua função, sabe? Todos eles permeiam a nossa história. A Corrupio tem um catálogo pequeno, mas muito importante.

Você viveu uma Bahia que não existe mais. Você fica comparando aquela Bahia do passado com a de hoje?

Eu sou feliz porque nasci aqui. Aquela Bahia era outra Bahia, mas não tenho essa mania de olhar para trás o tempo inteiro. Não! Gosto de pensar que a geração que nasceu na década de 40, por exemplo, deu excelentes frutos: Caetano, Chico, Gil. Chico é um pouco baiano, né? Aí tem Glauber, João Ubaldo. Mas os que vieram antes de todos esses também eram incríveis. E os que vieram depois também. E a Bahia continua produzindo grandes nomes.

É o que vc sempre sonhou para a sua vida? Vivenciar de perto a vida cultural?

Olha, eu sempre gostei de aventura. A vida é se aventurar. A Corrupio foi uma aventura. Eu não tinha dinheiro, eu era uma simples fotógrafa. Nunca tinha imaginado virar editora, de ter uma casa para editar livros, sabe?

E a viagem de Kombi que você fez de Paris para o Nepal com três amigas? Ali, sim, foi uma grande aventura! Para as pessoas ligadas à contracult­ura da época, a Índia era quase que uma obsessão. Eu tava nos Estados Unidos e fui muito influencia­da por essas ideias, pelo Woodstock, Beatles, Bob Marley e a busca pela espiritual­idade. No Brasil tinha a Tropicália. Tive a ideia de ir para a Índia, convoquei três amigas e fomos. Ao chegar no Afeganistã­o, a aduana perguntou: “onde está o homem”? Não acreditava­m que quatro mulheres estivessem atravessan­do

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ACERVO ARLETE SOARES
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ARLETE SOARES/DIVULGAÇÃO
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ARLETE SOARES/DIVULGAÇÃO
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ZÉLIA GATTAI/DIVULGAÇÃO

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