PREJUÍZO BILIONÁRIO COM IMPACTO SOCIAL
Pandemia Sem Carnaval, R$ 1,8 bi deixam de circular em Salvador e 250 mil vagas de trabalho são suspensas
colapso. Mais de R$ 300 milhões deixarão de circular nas produções diretamente ligadas ao Carnaval. Fora ensaios, lavagens, Réveillon e festas de largo que antecedem a festa mor.
“É uma cadeia de centenas de fornecedores, de som, de luz, de trios elétricos e de pessoas que trabalham para eles", diz Marcelo Britto, presidente da Abrape e um dos sócios da Salvador Produções, que empresaria artistas como Léo Santana, Parangolé e realiza o Bloco Nana Banana.
Mas, bom lembrar, a cadeia é muito mais ampla. “Começa no táxi no aeroporto. Dali o turista já vai comer um acarajé em Itapuã e segue para o hotel para pegar o abadá”. Aliás, em períodos de Carnaval, a taxa de ocupação nos hotéis vai a 95% em Salvador, chegando a 97% nos estabelecimentos próximos aos circuitos.
Segundo a Associação Brasileira da Indústria de Hotéis (ABIH), o faturamento das acomodações hoteleiras de Salvador no Carnaval de 2020 foi de R$ 150 milhões. Sem o Carnaval, este montante terá redução de 80%.
“Carnaval é como um 13º dos hotéis porque é justamente nesta época que o setor acumula rendimentos para conseguir enfrentar os períodos de baixa estação”, afirma Luciano Lopes, presidente da ABIH. É quase a mesma realidade dos bares e restaurantes. Os dados da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel Bahia) mostram que a queda no faturamento pode chegar até 70% em relação ao mesmo período do ano passado.
PIB DA FESTA
O Conselho Regional de Economia da Bahia (Corecon) tem números um pouco abaixo da estimativa da prefeitura - ao transpor dados de um estudo metodológico realizado em 2007 para o ano de 2018, o economista Gustavo Pessoti chegou à quantia de R$ 1,5 bilhão de circulação monetária durante a festa em Salvador.
Ex-diretor de Indicadores e Estatísticas da Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia (SEI) e atual vice-presidente do Corecon, Pessoti analisou os perfis da população na festa com base na Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED) da SEI. O Carnaval seria dividido em quatro grandes grupos: os que não brincam na folia e ficam em Salvador (e aproveitam o feriado para consumir), a população anti-Carnaval (que viaja), as pessoas que trabalham no Carnaval (5% da população de Salvador) e as pessoas que brincam.
As perdas financeiras da não realização do Carnaval (R$ 1,5 bi em 2018) não podem ser chamadas de PIB do Carnaval, que seria o quanto a festa adicionaria de valor na economia. O cálculo dá conta da circulação monetária, ou seja, leva em consideração tudo o que circula em todas as atividades econômicas relacionadas ao Carnaval. Mas, só a título de comparação, o economista buscou o valor do PIB de todos os 417 municípios da Bahia no ano de 2018 - apenas 31 cidades superam R$ 1,5 bi.
Outra comparação: o PIB de Salvador em 2018 foi pouco mais de R$ 63 bilhões. O Carnaval daquele ano, portanto, seria 1,9% do PIB da capital baiana. Parece pouco, mas o curto espaço de tempo revela a importância do Carnaval para a economia. “Isso é gerado em uma semana ou 10 dias. Várias cidades importantes da Bahia têm o PIB menor”.
Doutor em Comunicação e Cultura e um dos maiores pesquisadores da indústria do Carnaval, o economista Paulo Miguez diz que, nas últimas três décadas, a festa produziu uma economia com múltiplos mercados. “São milhares e milhares de pessoas envolvidas. Por isso, o que se chama de PIB da festa é absolutamente sig
de confirmação e acreditamos que tudo só será fechado mesmo pós-vacina”, garante Maria.
BLOCOS
Presidente da Associação de Blocos Alternativos da Barra e uma das coordenadoras do Conselho Municipal do Carnaval (Comcar), Márcia Mamede diz que os blocos de Carnaval tiveram uma perda de receita “incalculável”. Ela não fala em prejuízos porque sequer houve investimentos em trios, artistas e etc. “É uma receita que eu deixo de ganhar. Teria prejuízo se eu tivesse investido em algo para colocar o bloco na rua, mas ao mesmo tempo quantas pessoas eu vou deixar de contratar?”.
PERDA TOTAL
A Central do Carnaval, empresa que reúne 30 das entidades mais representativas do Carnaval de Salvador, calcula que, entre blocos e camarotes, os prejuízos podem ficar entre R$ 80 milhões e R$ 100 milhões. Isso só a Central. Se contar as mais de 200 entidades carnavalescas, esse prejuízo possivelmente dobra, ou seja, chega perto dos R$ 200 milhões. “Nosso negócio é perda total! Não tem alternativa”, lamenta Tinho Albuquerque, sócio da Central.
“Nosso negócio”, no caso, é a venda de abadás. E elas estagnaram desde que a pandemia mostrou que iria se prolongar. Tinho explica que os foliões que pagaram por abadás de blocos e camarotes para o Carnaval 2021 tiveram a possibilidade de receber o dinheiro de volta. “Mas muita gente preferiu já deixar pago o Carnaval de 2022”. Foi o que fez o paraibano Pedro Nonato da Silva, que gastou R$ 1,6 mil em abadás, um deles do Camaleão. Pedro só não conseguiu ainda remarcar as passagens áreas. Ele parece sentir mais a falta do Carnaval do que do próprio dinheiro. “Estou sentindo uma sensação de que estará faltando alguma coisa no mês que está por vir”.
A única ação da Central do Carnaval este ano vai ser a live de Bell Marques, espécie de artista oficial da Central. No dia 14 de fevereiro, domingo de Carnaval, no mesmo horário em que o Camaleão sairia do Farol da Barra em direção à Ondina, Bell vai fazer uma transmissão ao vivo pelas redes sociais e Youtube diretamente do Forte de São Marcelo. “O que nós estamos captando de patrocínio da live é basicamente para cobrir os custos de operação”, explica.
Abatido com o cancelamento da festa, Tinho lembra que o Carnaval envolve boa parte da população, inclusive os que não gostam de Carnaval. “Os blocos e camarotes são só a ponta do iceberg. A dimensão econômica do Carnaval é gigantesca. São milhares de famílias prejudicadas. E você não vai recuperar isso nunca. Esse dinheiro não vai voltar”.