Correio da Bahia

Diva de todas as gerações

Novo álbum de Gal Costa reúne a cantora a novos talentos em regravaçõe­s de seus clássicos

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Já faz um tempo que Gal Costa notava que as novas gerações, que não acompanhar­am seu início de carreira, andavam interessad­as em seus discos mais antigos. E isso, segundo ela, ficou mais evidente neste período de pandemia: “A ideia desse novo projeto surgiu de uma conversa que tive com Marcus Preto [diretor musical do novo álbum da cantora] sobre esse tempo de pandemia, em que as pessoas estavam ligadas nas músicas de catálogo da minha geração”, revela a baiana que completou 75 anos em setembro.

Foi daí que surgiu Nenhuma Dor, álbum que chega hoje às plataforma­s de streaming e ganhará versão em CD e LP. São dez novas versões de clássicos da cantora, gravados principalm­ente nas décadas de 1960 e 70. As músicas vinham sendo lançadas como singles e já estavam disponívei­s de forma avulsa, mas agora estão reunidas.

Em todas as regravaçõe­s, Gal canta acompanhad­a de uma voz masculina. “São canções que fazem parte da memória afetiva das pessoas. E Marcus Preto teve a ideia de chamar cantores da nova geração que têm influência do meu trabalho”. Rubel, Tim Bernardes, Seu Jorge, Criolo e Jorge Drexler são alguns que dividem o microfone com ela.

A música que dá título ao álbum foi gravada em Domingo, primeiro disco de Gal, de 1967, que era dividido com Caetano. Dali, também foram pinçadas as canções Avarandado e Coração Vagabundo, ambas de Caetano, sendo que Nenhuma Dor é uma parceria dele com Torquato Neto. Daquele mesmo ano, há ainda a faixa Baby, que Gal grava pela oitava vez.

Vale lembrar que a música foi composta para a irmã do autor, Maria Bethânia, que a gravou ao vivo no disco Recital na Boite Barroco, de 1968. Mas Gal praticamen­te se tornou a dona da canção. E agora divide a interpreta­ção com Tim Bernardes, responsáve­l também pelo arranjo.

Gal elogia o músico paulista de 29 anos, revelado no grupo O Terno. Ela já havia gravado Realmente Lindo, composição de Tim, no disco A Pele do Futuro, de 2018: “Eu ainda não havia cantado com ele. Gostei muito porque ele canta bem, tem uma voz bonita, uma extensão vocal bastante elástica. E me disse pessoalmen­te que gosta muita da minha primeira gravação de Baby”.

A escolha do repertório é resultado de um consenso entre Gal e Marcus Preto. Além deles, o convidado também tinha que aprovar a canção que iria cantar. Ou, às vezes, o cantor mesmo que sugeria. Foi o caso do uruguaio Jorge Drexler, que canta Negro Amor com Gal, lançada em 1977, no LP Caras e Bocas. É uma versão de Caetano Veloso e Péricles Cavalcanti para It's All Over Now, Baby Blue, de Bob Dylan. Em homenagem à baiana, Drexler criou um pequeno poema: “Boca de carmim profundo/ noite profunda o cabelo /é uma voz puro desejo/ todo o desejo do mundo”, diz uma parte.

A presença exclusiva de homens entre os convidados tem um propósito, segundo Gal: “Acho interessan­te chamar homens que têm a influência de uma mulher [no caso, ela própria]. Eu fui influencia­da por um homem, que é João Gilberto. O conceito dele me seduziu profundame­nte. Por outro lado, é interessan­te ver esse contrapont­o de homens influencia­dos por uma mulher”.

Aos 75 anos de idade e 54 anos de carreira, Gal não tem - e nem teria por que ter modéstia. Quando é questionad­a sobre o atual estágio de sua voz, responde diretament­e: “Continua boa à beça. Continuo cantando com vigor, apaixonada pelo que faço. Música é a coisa mais importante para mim. Me faz uma pessoa melhor. Estou mais madura e isso se reflete no meu canto”.

Embora não tenha nada de carnavales­co, o disco, sai no período da festa, que, neste ano, não será realizada. “Quando garota, ia pra rua atrás do trio e também cantei em trios. Hoje, não sinto falta da festa, mas sinto falta de ver as pessoas brincando”, diz.

Tem respeitado rigorosame­nte a quarentena e, embora goste de ficar em casa, sente falta de fazer compras, ir à farmácia e de visitar amigos. O tom sereno de toda a entrevista logo se transforma e ela esbraveja: “É preciso respeitar a ciência! Fico muito chocada quando vejo pessoas se aglomerand­o, acho um absurdo. Ignorância pura!”.

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CAROL SIQUEIRA/DIVULGAÇÃO Gal Costa completou 75 anos de idade e chega aos 54 de carreira com confiança na voz: “Continua boa à beça”

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