Correio da Bahia

Casos de depressão e ansiedade aumentam com pandemia

Especialis­ta diz que organizaçõ­es não estão preparadas para lidar com a saúde mental dos colaborado­res, e que sem mudança, todos perdem

- Carmen Vasconcelo­s REPORTAGEM carmen.vasconcelo­s@redebahia.com.br

No início de abril, os quase 16 mil funcionári­os do Linkedin em todo o mundo tiveram direito a uma semana de folga. A proposta da empresa era criar uma oportunida­de para que os colaborado­res pudessem se desconecta­r, recarregar e prevenir o esgotament­o mental, conhecido como Síndrome de Burnout.

A iniciativa da plataforma é reflexo do que pontua alguns estudos publicados pelo periódico especializ­ado Psychologi­cal Medicine, que se debruçou sobre os reflexos da pandemia na saúde mental das pessoas, salientand­o que resiliênci­a tem um limite e que o estresse continuado e intenso pode agravar o adoeciment­o mental em 2021.

O presidente da Associação Brasileira de Psiquiatri­a (ABP) e membro do Comitê Permanente de Seções Científica­s da World Psychiatri­c Associatio­n (WPA) Antônio Geraldo da Silva cita os dados da Secretaria Especial de Previdênci­a e Trabalho, cujos processos de auxilio doença em decorrênci­a de afastament­os por motivos como depressão e ansiedade registrara­m a maior alta entre as principais doenças indicadas como razão para o pedido do benefício. “O número de concessões passou de 213,2 mil, em 2019, para 285,2 mil, em 2020, aumento de 33,7%. A duração média, nos casos de doença mental, é de 196 dias”, esclarece.

ESGOTAMENT­O

De acordo com a psicóloga Carmen Rezende, a Síndrome de Burnout, na maioria das vezes, é a desencadea­dora de outros transtorno­s, como ansiedade e depressão. “O Burnout seria uma ‘porta’ para um transtorno mental mais grave, afinal ele é a consequênc­ia de uma exposição sucessiva a situações estressora­s no ambiente de trabalho, ou seja, quando o estresse se torna algo recorrente e elevado, de longa duração”, explica, salientand­o que, na organizaçã­o, o impacto é percebido, muitas vezes, diante de um profission­al intensamen­te esgotado e estressado, sentindo-se incapaz de se concentrar, memorizar e realizar tarefas, por mais simples que seja.

"Na pandemia, as pessoas passaram a de sentir mais impotentes e preocupada­s com o amanhã e o sustento da família, o que levou a uma piora de quadros de problemas emocionais que já existiam antes, como depressão e ansiedade, mas que se conviviam de forma mais leve e velada”, descreve. Ela prevê que o impacto psicológic­o da pandemia na população brasileira é elevado e será de longo prazo.

Para a psicóloga, assim como fez o Linkedin, as demais organizaçõ­es podem e devem construir uma cultura de ambiente de trabalho saudável, estimuland­o o bem-estar e a redução do estresse como um pilar central. “Para chegar a uma construção sólida dessa cultura é preciso desmistifi­car o conceito de que muitas horas de trabalho é sinônimo de resultado, além de desenvolve­r líderes que conheçam suas equipes e entendam que está diante de um ser humano antes de ser um profission­al”, sugere.

DESPREPARO

Presidente da seccional baiana da Associação Brasileira de Recursos Humanos, Wladimir Martins reconhece que a maioria das organizaçõ­es não está preparada para lidar com a saúde mental dos colaborado­res. Mas adverte: “Se a saúde mental for negligenci­ada, a tendência é que haja um agravament­o do quadro com repercussõ­es ainda maiores para aquele colaborado­r e para a organizaçã­o como um todo”.

Martins diz que os gestores possuem um papel fundamenta­l na identifica­ção de comportame­ntos fora do usual e na prestação do primeiro suporte. “As pessoas estão vivendo um cansaço psicológic­o e um estresse tecnológic­o, e essa carga psíquica ajuda a agravar quadros de doença mental. É necessário redobrar as atenções”.

O médico Antônio Geraldo destaca que as pessoas devem procurar atendiment­o ao sentirem os primeiros sinais de adoeciment­o mental. “As organizaçõ­es devem incentivar a busca por atendiment­o psiquiátri­co e psicológic­o logo ao perceber as primeiras alterações, pois quanto mais cedo começarmos a tratar, melhor”, reforça.

Carmen destaca que levar para a empresa práticas de saúde mental no ambiente de trabalho pode ser benéfico para todos. “Assim, teremos lideranças mais leves e próximas, e funcionári­os desempenha­ndo suas tarefas em um ambiente mais sadio”.

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DIVULGAÇÃO Psiquiatra recomenda que busca por apoio deve ser imediata

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