Vereador Xenófobo é expulso de partido
Parlamentar gaúcho destilou preconceito contra baianos e deverá responder por crime
O vereador de Caxias do Sul (RS), Sandro Fantinel (Patriotas), fez comentários preconceituosos contra os baianos e agora poderá responder por isso nas justiças civil e criminal. Outra ação, dessa vez conjunta das defensorias públicas da Bahia e do Rio Grande do Sul, abrirá representação contra o parlamentar também na Câmara Municipal. Já a Procuradoria Geral do Estado vai acionar o Ministério Público.
Sandro Fantinel disse ontem que tudo foi um “mal-entendido”. Ainda assim, o Patriotas decidiu pela expulsão do vereador do partido. Na terça-feira (28), o parlamentar subiu à tribuna da Câmara Municipal de Caxias do Sul e destilou comentários preconceituosos em relação aos nordestinos.
O motivo foi o resgate de 207 trabalhadores de vinícola gaúchas, que viviam em condições análogas à escravidão. Ação do Ministério Público do Trabalho (MPT) cobrou providências dos responsáveis pelas lavouras. De todos os resgatados, 198 são baianos. O vereador tomou o partido dos empresários.
“Não contratem mais aquela gente lá de cima. Contratem argentinos. São limpos, trabalhadores, corretos e quando vão embora ainda agradecem pelo trabalho", disse Fantinel, em sessão gravada. "Nunca tivemos problema com um grupo de argentinos. Agora com os baianos, que a única cultura que eles têm é viver na praia tocando tambor, era normal que se fosse ter esse tipo de problema. E que isso sirva de lição. Que vocês deixem de lado esse povo que está acostumado com Carnaval e festa", continuou.
Na manhã de ontem, as duas defensorias públicas, da Bahia e do RS, divulgaram uma nota conjunta de repúdio. A coordenadora do Núcleo de Equidade Racial da DPE-BA, Vanessa Nunes, explicou que a atuação será em três frentes. A primeira medida será representar contra o vereador na Câmara Municipal onde ele atua para que haja apuração e punição por falta de decoro, que pode levar à perda do mandato.
“O segundo ponto será a busca pela representação criminal desse vereador. O discurso incide na prática do crime de racismo previsto no artigo 20 da Lei 7716/89, porque ele discrimina pessoas em razão da sua procedência nacional. Ele discriminou um grupo de trabalhadores associando ao fato de serem baianos. Além disso, ele faz referências expressas a elementos da cultura negra, como o toque do tambor e o Carnaval”, afirmou.
A defensora explicou que pelo fato do discurso ter sido transmitido através de um meio de comunicação, a TV Câmara, a pena aumenta, passa de um a três anos, para dois a cinco anos. O fato dele ser agente público também eleva a pena, mas esse acréscimo é variável de caso a caso. As informações serão levadas à Polícia Federal e ao Ministério Público Federal (MPF).
“Tem outro crime dentro dessa fala, é que além dele próprio cometer o crime de racismo, ele incita os produtores rurais da região a não contratarem pessoas oriundas da Bahia. Acontece que a Lei CAO, que reprime o racismo, diz que é crime deixar de contratar uma pessoa por conta da origem, cor ou procedência”, acrescenta.
AÇÃO CIVIL
A terceira frente vai avaliar a responsabilidade civil do vereador através de uma ação coletiva por danos morais. A Procuradoria Geral do Estado da Bahia (PGE-BA) informou que também vai entrar com representação contra Fantinel junto aos MPs federal e estadual e com uma ação indenizatória de reparação, de natureza compensatória, por dano moral.
A procuradoria foi acionada pelo governador, Jerônimo Rodrigues (PT), que na terça-feira (28), emitiu nota de repúdio ao pronunciamento do parlamentar. O prefeito de Salvador, Bruno Reis (União Brasil), afirmou que medidas cabíveis precisam ser tomadas para que a apologia ao trabalho escravo não seja tratada como algo natural.
“As falas do vereador do Rio Grande do Sul sobre os trabalhadores em situação de escravidão nas vinícolas são bizarras! Elas retratam a xenofobia e o racismo em sua pura essência. O que vinha acontecendo é inadmissível e precisa ser punido para jamais acontecer novamente”, escreveu o prefeito em sua conta no Twitter.
Xenofobia é o medo, aversão ou a profunda antipatia em relação a estrangeiros ou a uma cultura, hábito, etnias ou religião diferente. É crime. No caso do vereador, os especialistas afirmam que há também racismo, já que ele faz referência ao tambor, elemento típico das religiões de matriz africana. O MP-BA e a OAB-BA também emitiram notas de repúdio.
Em entrevista ao jornal Estado de São Paulo, o vereador Sandro Fantinel disse que está sendo “mal interpretado” e que está sofrendo ameaças, pediu desculpas e disse que fará uma retratação. Nas redes sociais, onde o fato ganhou repercussão, o parlamentar segue em silêncio sobre o caso. Outras instituições pelo país avisaram que vão processar o edil.
EXPULSO DO PARTIDO
Na tarde de ontem, o Patriotas informou que o vereador foi expulso da legenda. O partido classificou o discurso dele como "desrespeitoso e inaceitável" e disse que a fala foi maculada por "grave desrespeito a direitos constitucionalmente assegurados, como a dignidade humana".
A Câmara Municipal de Caxias do Sul divulgou nota após a repercussão do caso afirmando que não compactua com manifestação de preconceito, discriminação, racismo ou xenofobia.
"Ressaltamos que foi um posicionamento individual do parlamentar. Não traduz o pensamento e os valores da instituição e nem da totalidade dos vereadores. Também pedimos desculpas ao povo baiano e a todos os migrantes que se sentiram atacados, destacando que são todos muito bem-vindos em nossa Caxias do Sul", conclui.
Os 207 trabalhadores resgatados em situação degradante viviam em condições precárias, com alimentação estragada, jornadas das 4h às 21h, castigos físicos e direitos trabalhistas desrespeitados. Três deles conseguiram fugir e pediram socorro a polícia.
As falas do vereador do Rio Grande do Sul são bizarras! Retratam a xenofobia e o racismo em sua pura essência Bruno Reis Prefeito de Salvador, em seu perfil no Twitter
Pedimos desculpas ao povo baiano e a todos os migrantes que se sentiram atacados Câmara Municipal de Caixas do Sul - RS Em nota, após o caso viralizar