PRECISAMOS FALAR SOBRE TINA
Razões numéricas, artísticas e afetivas para homenagear uma divindade da música
pós-apocalíptica protagonizada pelo ator Mel Gibson.
Ah, ela está inscrita no Hall da Fama do Rock, ainda que tenha transitado por muitas outras vertentes: soul, rhythm and blues e pop, do qual foi fonte de inspiração para outras gigantes do gênero.
Estão achando que é novamente exagero, leitores? Perguntem a Beyoncé quem ela coloca na relação de divas que a influenciaram. Caso a informação não baste, vejam o vídeo em que ambas cantam juntas um dos maiores sucessos da primeira fase da carreira de Tina, Proud Mary. Para ajudar, o dueto marcou a cerimônia de premiação do Grammy 2008. Não só por unir duas grandes vozes. É que, ao lado de quem idolatrava publicamente, Beyoncé chora. Com absoluta certeza, ela não entenderia por que tantas reticências internas em torno da capa publicada pelo CORREIO na quinta-feira. Se Ayrton Senna estivesse vivo, ficaria perplexo diante das interrogações da redação. Afinal, há cerca de 30 anos, Tina cantou para o maior piloto brasileiro o megahit The Best, em português, O Melhor.
Diante do público e com Senna ao lado dela no palco, disparou: "Eu sou fã dele, uma grande fã". A cena ocorreu no show realizado após o GP de
Fórmula 1 da Austrália em 1993. O piloto talvez tenha morrido com dúvida sobre o que foi "O Melhor" naquele dia: o troféu da corrida vencida horas antes ou ver e ouvir Tina Turner dedicar uma canção ao vivo para ele. Àquela época, a artista já havia alcançado o Olimpo da música e se apresentado com astros da indústria fonográfica. Entre os quais, Cher, David Bowie, Mick Jagger e Bryan Adams. Para os que recordam dos grandes momentos da década de 1980, difícil esquecer de sua voz rouca e poderosa de contralto no antológico projeto We Are The World ou de Tina Pepper, cover da cantora vivido pela atriz Regina Casé na novela Cambalacho, fenômeno de público da TV Globo.
As declarações dirigidas a ela reforçam ainda mais a imensidão de sua trajetória. Em dezembro de 2005, durante uma homenagem do Kennedy Center Honor, o então presidente americano George W. Bush descreveu Tina como "naturalmente talentosa, enérgica e sensual". Como se não bastasse, emendou: "e dona das pernas mais famosas do show business". De fato, junto ao visual icônico e sexy e dos imensos saltos com os quais se apresentava, os dois pares de coxa da cantora eram objetos de cobiça. Na mesma noite, a famosa apresentadora Oprah Winfrey disse: "Você me faz ter orgulho de soletrar a palavra M-U-L-H-E-R". Era a reverência a uma artista que superou os abusos e agressões do marido e parceiro Ike Turner, que se reinventou por esforço pessoal, enfrentou fracassos e renasceu majestosa em 1984, com o histórico disco Private Dancer.
Há questões afetivas nesse baú de justificativas. Aqui, peço licença para o uso da primeira pessoa. Ainda moleque, as músicas de Tina embalaram minha própria novela de vida. Dancei, chorei, celebrei, me apaixonei e curei fossas com elas. Bem possível que mulheres negras de origem pobre, cuja vida é marcada pela superação, como a editora-chefe, tenham razões de natureza emocional para homenagear alguém que as representam. Para ser mais preciso, uma montanha de motivos. Pensando bem, uma capa exclusiva foi pouco. Tina merecia o jornal inteiro.