Padre e irmandade em guerra na Colina Sagrada
Questão de fé Pároco do Bonfim denuncia calote após ser acusado por irmandade de recolher R$ 50 mil por mês
A polêmica envolvendo o padre Edson Menezes, 65 anos, pároco da Basílica do Senhor do Bonfim, e a Devoção do Senhor Bom Jesus do Bonfim, entidade que administra a igreja, teve mais um desdobramento nesta segunda-feira (29). Depois que a mantenedora da igreja se manifestou para negar as acusações de que a nova gestão estaria alimentando um clima de "perseguição" e declarou que o padre Edson estaria recolhendo cerca de R$ 50 mil por mês sem prestar contas, o religioso negou as alegações e cobrou da entidade o repasse de 20% da Campanha dos Devotos para a paróquia.
“A Igreja do Bonfim é uma igreja pública e eles não querem entender isso. Como uma igreja pública, ela funciona igual a uma paróquia. Eles não dizem que tem uma Campanha dos Devotos que eles deviam passar para mim 20% e não passam. Isso está no estatuto deles, que eles deviam passar 10% para a Arquidiocese e não passam. Isso eles não falam”, criticou o padre Edson Menezes.
A reportagem procurou a Irmandade logo após o pronunciamento do religioso, mas a entidade disse que não iria se pronunciar a respeito do ocorrido.
A declaração do Pe. Edson ocorreu após Devoção do Senhor Bom Jesus do Bonfim enviar nota ao CORREIO, afirmando que as mudanças administrativas sugeridas recentemente, que incluem a decisão pela assinatura da Carteira de Trabalho do padre e limitação deste quanto ao recebimento das arrecadações financeiras das missas de sextas-feiras e das caixas laterais da igreja, são adequações para garantia do ‘cumprimento das disposições estatutárias e do Regimento Interno da Irmandade’.
“Desta maneira, para não permanecer espancando os Estatutos, é que o padre, na condição de empregado da Devoção, não poderá continuar a receber as coletas de todas as sextas-feiras, e metade da arrecadação dos dois cofres laterais da Igreja, já que esse fato vinha sendo praticado indevidamente, com a permissão das administrações anteriores em manifesto desrespeito ao Estatuto, chegando a auferir aproximados R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) mensais, sem a devida prestação de contas”.
Pe. Edson Menezes rebateu a nota da Irmandade e garantiu que o dinheiro recolhido mensalmente, fruto das coletas de sexta-feira, é de conhecimento de todos da paróquia. “Aqui na igreja todo mundo sabe. Eu tenho um conselho econômico que administra essa parte financeira. Aqui é tudo legal. Eu tenho tudo para mostrar”, afirma.
DESTINO DO DINHEIRO
De acordo com o pároco, a quantia tem como destino o pagamento de despesas relacionadas à pastoral, diáconos e padres que trabalham na basílica. Ele enfatiza que todos esses pagamentos podem ser provados com relatórios mensais e contracheques da sua côngrua, valor de 3 a 4 salários-mínimos que recebe da arquidiocese.
Por outro lado, a Irmandade alega que a responsabilidade com a manutenção da igreja é exclusivamente sua, classificando como “inverdade” as afirmações do padre quanto a função do dinheiro das coletas e sua prestação de contas. Para reforçar o seu direito administrativo sobre o templo, peças e iniciativas ligadas à Basílica do Bonfim, a entidade resgatou uma manifestação feita por Pe. Edson para fins judiciais, em outubro de 2019:
“... a Devoção do Senhor Bom Jesus do Bonfim é a proprietária do imóvel onde está edificada a Igreja do Bonfim, e de todas as obras, imagens sacro sagradas além de todo o seu acervo de obras religiosas que guarnece a Igreja. Portanto, é a sua instituição mantenedora legal, sendo responsável por sua manutenção em geral”.
Sem deixar de identificar o documento em questão, Pe. Edson diz que reconhece que a Irmandade é mantenedora, mas nega seu poder sobre o controle de todas as finanças. “Eu tenho uma ata do dia 10 de junho de 2003, da mesa de ministra da Devoção, que determina que as referidas coletas de sexta-feira são destinadas para ajudar nas despesas da igreja, compra de hóstias, livros sacros, ajuda para os pobres, coletas diocesanas. Então, essa coleta já era destinada [à paróquia]”.
BOM SAMARITANO
A irmandade também negou que tenha sido Pe. Edson o idealizador do Projeto Bom Samaritano, ação comandada pelo religioso que promove atividades sociais de formação e doações. Segundo a entidade, “o verdadeiro idealizador desse projeto foi o falecido ex-reitor da basílica, Monsenhor Walter Pinto de Andrade”. O padre Edson, por sua vez, alega ser o criador e ter ata de comprovação
Diante dos desdobramentos do caso envolvendo o Pe. Edson Menezes e a irmandade, a Arquidiocese de Salvador emitiu uma nota, sem citar nomes, em que comunica que “continua a envidar os esforços para o esclarecimento e a superação das dificuldades que têm sido levantadas”, “promovendo o diálogo respeitoso e fraterno”.
Já os fiéis que frequentam a basílica do Senhor do Bonfim têm uma manifestação em apoio ao padre marcada para 9h40 desta quarta-feira (31), na praça do Bonfim.
A Igreja do Bonfim é pública e eles não querem entender isso. Como uma igreja pública, ela funciona igual a uma paróquia Edson Menezes Reitor do Bonfim
Para não permanecer espancando Estatutos, o padre, na condição de empregado da Devoção, não poderá continuar a receber as coletas Irmandade Em nota à redação
Mais da metade (51,6%) da população da Bahia sobrevive com menos de R$ 665,02 por mês. Com esse dinheiro, dá para comprar apenas uma cesta básica no período, que custa, atualmente, R$ 585 na capital, de acordo com o Departamento de Estudos Econômicos (Dieese). Em números absolutos, são 7,4 milhões de pessoas abaixo da linha da pobreza no estado, o que coloca a Bahia no oitavo lugar no ranking nacional de pessoas pobres. Os dados são de um estudo realizado pelo Instituto Jones dos Santos Neves (IJSN), vinculado ao Governo do Espírito Santo.
Para realizar a pesquisa, o instituto utilizou informações de 2021 e 2022 da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Os critérios de definição de pobreza e extrema pobreza são os mesmos utilizados pelo Banco Mundial. As taxas são de US$ 6,85 e US$ 2,15 per capita/dia, respectivamente. Na prática, são consideradas pessoas pobres as que recebem até R$ 665,02 mensais e, extremamente pobres quem sobrevive com R$ 208,73 por mês.
Entre os milhares de afetados pelo drama socioeconômico está Alfeu Ferreira, de 58 anos. Todos os dias, ele pega duas conduções do bairro onde mora, o Bom Juá, até a região do Farol da Barra. Sob a sombra de uma árvore, o homem pede doações de quem caminha e já se tornou figura conhecida entre os moradores do bairro nobre da orla da capital.
Com parte da perna esquerda amputada e a outra comprometida pelo avanço da diabetes, Alfeu é cadeirante e não trabalha com carteira assinada desde o final da década de 90, quando era funcionário terceirizado da Universidade Federal da Bahia (Ufba). Ele conta que teve o Benefício de Prestação Continuada (BPC), pago pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), que lhe garantia um salário mínimo, cortado há cerca de um ano. Sem o auxílio do governo, depende da sensibilidade de pessoas comuns para se alimentar e comprar remédios.
“Eu vivo dessa ajuda que o pessoal me dá. Um passa, ajuda, dá uma moeda ou um biscoito. O problema é que depois do Carnaval, o movimento caiu muito”, conta Alfeu, enquanto encara a orla pouco movimentada na tarde dessa segunda-feira (29). Neste mês, a situação financeira ficou ainda mais delicada por conta das fortes chuvas, que alagaram a região onde ele mora, impossibilitando seu trânsito até a Barra.
CONTEXTO
Para além dos danos à saúde pública, a pandemia da covid-19 intensificou desigualdades econômicas que já eram latentes no território baiano. Em 2021, a pobreza atingiu o maior nível em dez anos no estado, chegando à marca de 8,4 milhões de pessoas (56,6% da população). Já no ano passado, o Auxilio Brasil de R$ 600 e a expansão de Programas de Transferência Condicionada de Renda (PTCR) serviram de impulso para que brasileiros de todas as regiões saíssem da pobreza. Na Bahia, foram 717 mil pessoas.
“A taxa de pobreza em 2021, por reflexos da pandemia, foi a mais elevada dos últimos dez anos. Já em 2022, um ano eleitoral, o governo tinha interesse em implementar o Auxílio Brasil,
que contribuiu para a redução da pobreza no país”, explica Pablo Lira, diretor-presidente do IJSN.
Mesmo assim, o número de pessoas em extrema pobreza na Bahia é o sexto maior do país. São mais de 1,8 milhão de pessoas sobrevivendo com menos de R$ 208,73 por mês. Neste mês, a Bahia foi o segundo estado com o maior número de famílias assistidas pelo programa Bolsa Família do Governo Federal, ficando atrás apenas de São Paulo. São mais de 2,5 milhões de beneficiários que recebem R$ 658,00 em média. Apesar de importante, a transferência de renda sem políticas públicas integradas, não garante que as pessoas deixem a pobreza.
“Os dados indicam que a pobreza não é solucionada apenas com Programas de Transferência Continuada de Renda. Essa ação é fundamental, mas para virar a página, é importante que elas sejam combinadas com políticas de assistência social, acesso ao primeiro emprego, habitação e geração de renda”, aponta Pablo Lira.
No final de março, foi lançado o Programa Estadual de Combate à Fome do Governo do Estado da Bahia, que tem como meta promover a segurança alimentar e nutricional na Bahia. As ações são pautadas no estímulo à produção de alimentos saudáveis e doações. Até agora, 350 toneladas de alimentos foram doadas. reais por mês é a faixa de renda que define a extrema pobreza no país
665 reais era a renda máxima de 51,6% da população do estado no final de 2022
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