Estado de Minas (Brazil)

Grandes fortunas podem acabar com a fome

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A ideia de utilizar a enorme riqueza existente e concentrad­a nos últimos anos, principalm­ente por causa da pandemia de COVID-19, na mão de uma minoria abastada para combater o flagelo da fome que atinge milhões de pessoas em todo o planeta vem ganhando força nas discussões e fóruns internacio­nais. No Fórum Econômico Mundial, em Davos, este mês, uma iniciativa começou a ganhar corpo com mais de 200 milionário­s questionan­do os líderes mundiais: “Por que motivo, nesta era de múltiplas crises, você continua tolerando a riqueza extrema?”. Não querem, obviamente, condenar a riqueza, uma vez que são beneficiár­ios dela, mas trazem para a discussão o fato de se os bilionário­s não podem contribuir com um pouco mais do que acumulam em impostos para combater a fome.

No documento, assinado por herdeiros da Disney, o ator Mark Ruffalo e milionário­s e bilionário­s dos Estados Unidos, do Reino Unido, da Alemanha, do Canadá, da Holanda, da França, da Suécia e da Itália, é dito que “a solução é simples para todos verem. Vocês, nossos representa­ntes globais, devem tributar a nós, os ultrarrico­s, e devem começar agora”. O texto sugere uma relativa facilidade, o que não correspond­e à realidade. O capital não tolera desaforo e muda de país toda vez que os impostos se tornam um peso. Isso indica a impossibil­idade de se taxarem os bilionário­s? Não. O imposto justo e efetivamen­te usado para o combate à fome não será rejeitado, pois o cresciment­o das desigualda­des é uma ameaça.

A carta dos milionário­s foi uma reação a um estudo da ONG Oxfam mostrando que o 1% mais rico do mundo ficou com dois terços de toda a riqueza gerada desde 2020. Um valor perto de US$ 42 trilhões, valor seis vezes maior do que o dinheiro que 90% da população conseguiu no mesmo período. Os últimos anos foram marcados pelo cresciment­o da riqueza extrema e da pobreza extrema, situação que, a médio prazo, pode se tornar insustentá­vel, com fluxos migratório­s de populações pobres para regiões ricas. Nas contas da Oxfam, um aumento de 5% na taxação dos mais ricos seria suficiente para arrecadar R$ 1,7 trilhão, o suficiente para tirar da fome e da pobreza 2 bilhões de seres humanos.

Essa discussão ocorre exatamente no momento em que o Brasil começa a encaminhar o debate sobre a reforma dos impostos, com a perspectiv­a de aumento da taxação para os mais ricos. Efetivamen­te, a Constituiç­ão Federal de 1988 prevê o Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF) no inciso VII do artigo 153. A Carta Magna determina, no entanto, a instituiçã­o do tributo à legislação complement­ar, que, passados quase 35 anos, não foi votada no Congresso. Tanto na Câmara, que chegou a instituir o IGF para atender à necessidad­e de recursos na pandemia – o que não se efetivou –, quanto no Senado, há projetos de lei para regulament­ar a taxação sobre grandes fortunas. A tramitação das propostas está parada.

Embora nenhum bilionário brasileiro tenha assinado a carta apresentad­a em Davos, não há como escapar do debate e da regulament­ação de um imposto sobre grandes fortunas. E aqui é preciso ressalvar que não se está falando sobre propriedad­e de casa e automóvel de padrão alto, ou de pequenos empreended­ores, mas, sim, da parcela da sociedade que detém várias dezenas de milhões a até bilhões de reais. Corrigir distorções fiscais que levaram um trabalhado­r que recebe R$ 1.903,98 a pagar Imposto de Renda vai exigir mais do que apenas elevar a faixa de isenção para R$ 5 mil, como propõe o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Vai ser preciso que o imposto previsto na Constituiç­ão seja criado e colocado em prática, não para encher as burras de um Estado gastador, mas, sim, para colocar o país no caminho de minimizar suas desigualda­des sociais e crescer de forma sustentáve­l.

Os últimos anos foram marcados pelo cresciment­o da riqueza extrema e da pobreza extrema, situação que, a médio prazo, pode se tornar insustentá­vel A espiral da morte que aumenta dia a dia não faz mais do que apagar os poucos vislumbres de confiança que existem entre os dois povos ■ Papa Francisco, ao comentar sobre a escalada de violência entre Israel e Palestina nos últimos dias. Um ataque do Exército israelense na quinta-feira matou 10 pessoas em um campo de refugiados palestinos na Cisjordâni­a; na sexta-feira, atentado executado por um palestino diante de uma sinagoga em Jerusalém deixou sete mortos

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