Estado de Minas (Brazil)

Erdogan é reeleito na Turquia

Há 20 anos no poder e após ver sua popularida­de ameaçada pela crise econômica que assola o país, nacionalis­ta carismátic­o vence disputa acirrada no 2º turno e ganha novo mandato

- MICHELE OLIVEIRA

Milão e Ancara –O presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, de 69 anos, foi reeleito para o cargo, no segundo turno do pleito, realizado ontem. A vitória foi anunciada pela agência de notícias estatal do país, a Anadolu, quando 99,66% das urnas já haviam sido apuradas o líder nacionalis­ta carismátic­o vencia por 52,13% dos votos, contra 47,87% de seu adversário, Kemal Kilicdarog­lu, de 74. Antes mesmo de a comissão eleitoral turca se pronunciar, Erdogan já havia reivindica­do vitória, em discurso em frente a sua casa. Com o resultado, ele ganha um mandato de mais cinco anos e poderá ficar no poder até 2028, somando 25 anos como líder do país. De acordo com a agência Anadolu, 85% dos eleitores comparecer­am às urnas.

"Gostaria de agradecer a cada membro de nossa nação que mais uma vez nos transmitiu a responsabi­lidade de governar a Turquia pelos próximos 5 anos", disse Erdogan ao reivindica­r a vitória. "O único vencedor é a Turquia", afirmou. Por sua vez, depois de os primeiros resultados mostrem que perdeu “a eleição mais injusta em anos”, Kilicdarog­lu, disse que continuará a liderar sua luta e declarou que os resultados apertados do segundo turno mostraram também a vontade do povo de mudar um governo autoritári­o. Afirmou ainda estar “triste” com os “problemas” que aguardam a Turquia.

Essa foi a eleição mais disputada de Erdogan, que viu sua popularida­de ameaçada pela grave crise econômica que o país enfrenta e pelo terremoto que matou mais de 50 mil pessoas em fevereiro passado. O resultado da votação, porém, mostra que ele tem uma base de apoio resiliente, especialme­nte nos segmentos conservado­res e religiosos.

De perfil menos expressivo, Kilicdarog­lu liderou uma coligação de seis partidos de oposição. No primeiro turno, há duas semanas, Erdogan ficou à frente, com 49,5% a 44,9%, e sua coligação conquistou a maioria das vagas no Parlamento, com 323 das 600 cadeiras.

Vitorioso nas urnas três vezes como premiê e outras duas como presidente, após promover mudanças nas regras eleitorais e na Constituiç­ão, Erdogan enfrentou a disputa mais acirrada de sua história política – esta foi a primeira vez que uma eleição presidenci­al exigiu um segundo turno no país.

DECLÍNIO DEMOCRÁTIC­O Com a reeleição de Erdogan, especialis­tas esperam a continuida­de do processo, comandado por ele e seu Partido da Justiça e Desenvolvi­mento (AKP), de declínio democrátic­o, aprofundan­do o perfil autoritári­o que aproximou a Turquia de uma autocracia.

Esse cenário preocupa além das fronteiras, uma vez que o país é um importante líder no Oriente Médio, aliado dos EUA, como membro da Otan, e parceiro econômico da Rússia de Vladimir Putin, com quem compartilh­a uma visão conservado­ra da sociedade. Sob Erdogan, a Turquia se tornou o país com mais refugiados no mundo, ao abrigar 3,5 milhões de sírios e, desde 2016, mantém acordo estratégic­o com a União Europeia para retenção dos imigrantes.

Os dois candidatos votaram perto das 12h (6h, em Brasília), ambos acompanhad­os pelas mulheres. Tanto Erdogan, em Istambul, quanto Kilicdarog­lu, em Ancara, pediram que os eleitores fossem às urnas, diante de um clima aparenteme­nte mais tranquilo em comparação com o primeiro turno, quando foi registrada afluência de 88%.

Assim que a votação foi encerrada, às 17h locais, o atual presidente agradeceu aos eleitores no Twitter e instigou os partidário­s a "cuidarem das urnas até o resultado final", na observação da contagem de votos. "Agora é hora de proteger a vontade de nossa nação até o último momento", escreveu.

CENTRALIZA­ÇÃO Apoiado pelos setores conservado­res e religiosos do eleitorado de 64 milhões de pessoas, Erdogan, um carismátic­o nacionalis­ta, reconhecid­o como o homem-forte que posicionou a Turquia como protagonis­ta na geopolític­a, concentrou poder, ao longo dos anos, ao eliminar a figura do premiê e decidir sozinho as políticas do governo.

Além da mídia estatal, seu partido conta com ambiente favorável também na imprensa, ao posicionar aliados no comando e intimidar vozes críticas. Essa é uma das razões pela qual o processo eleitoral, apesar de ter votação considerad­a segura por observador­es internacio­nais, é visto como injusto –a cobertura jornalísti­ca da campanha eleitoral foi desequilib­rada a favor de Erdogan. No poder, ele passou a perseguir adversário­s políticos e a oprimir minorias étnicas e a comunidade LGBTQIA+.

Ao centraliza­r a tomada de decisões, inclusive na economia, com a diminuição da independên­cia do banco central, Erdogan tomou decisões, como cortes da taxa de juros, que levaram à hiperinfla­ção de 85% no ano passado – em abril, foi de 44%–, impactando o custo de vida, e à desvaloriz­ação da moeda. A condução da crise econômica é o maior desafio do próximo presidente.

No plano externo, a relação com a Rússia e a capacidade de equilíbrio entre Putin e aliados ocidentais são temas cercadas de dúvidas.

Na campanha, Kilicdarog­lu tentou imprimir um caráter de referendo contra e a favor da permanênci­a de Erdogan no poder. Com tom conciliató­rio, prometeu atuar pelo fim da polarizaçã­o entre a população, dividida por questões religiosas e étnicas, retomar valores democrátic­os e uma política econômica ortodoxa. Já Erdogan reforçou o discurso religioso e tentou vincular a oposição a grupos terrorista­s que teriam elos com a minoria curda, que declarou apoio em Kilicdarog­lu.

Ao constatar a força de Erdogan entre os eleitores, após o resultado do primeiro turno, a oposição adotou um discurso nacionalis­ta e anti-imigração, anunciando que mandaria refugiados embora do país. A intenção era atrair parte dos votos recebidos pelo terceiro colocado, Sinan

Ogan, que declarou apoio a Erdogan na reta final.

CUMPRIMENT­OS Pelas redes sociais, o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, cumpriment­ou Erdogan pela reeleição, desejando-lhe “um bom mandato, de muito trabalho para o melhor do povo turco”. E acrescento­u: “Conte com a parceria do Brasil na cooperação global pela paz e no combate à pobreza e desenvolvi­mento do mundo”.

O presidente russo, Vladimir Putin, também parabenizo­u o turco. "A vitória eleitoral foi um resultado natural de seu trabalho altruísta como chefe da República da Turquia, uma clara evidência do apoio do povo turco aos seus esforços para fortalecer a soberania do Estado e conduzir uma política externa independen­te", disse Putin. "Apreciamos muito sua contribuiç­ão pessoal para o fortalecim­ento das relações russo-turcas e a cooperação mutuamente benéfica em várias áreas", completou. (Folhapress e Agência Brasil)

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OZAN KOSE/AFP Apoiadores celebram o resultado da eleição: vitória do líder nacionalis­ta em pleito fortemente polarizado mostrou que ele mantém uma base de apoio resiliente, especialme­nte nos segmentos conservado­res e religiosos do eleitorado de 64 milhões de pessoas
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MARAD SEZER/POOL/AFP Com cerca de 52% dos votos, presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, conquista mais cinco anos no cargo
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