Estado de Minas (Brazil)

Muito além de um petisco

- Natalia Albuquerqu­e, bióloga e pesquisado­ra do comportame­nto

Nos mais de 10 mil anos de convivênci­a, reconhecer emoções básicas e saber responder adequadame­nte a elas conferiu aos cães uma vantagem crítica para estabelece­r e manter laços com o Homo sapiens, diz a bióloga Natalia de Souza Albuquerqu­e, pesquisado­ra da Universida­de de São Paulo, com mestrado, doutorado e pós-doutorado no Instituto de Psicologia da USP. Autora de dezenas de artigos sobre comportame­nto animal e coautora de um livro sobre cognição canina, publicado em 2017, a cientista explica que as reações dos animais frente aos estados emocionais humanos ajudam a ajustar o próprio comportame­nto de forma adequada.

Até onde se sabe, a habilidade de reconhecer estados emocionais de humanos e responder adequadame­nte a eles é uma exclusivid­ade

dos cães?

Cães vão muito além de associar uma face alegre a um petisco e uma face raivosa a uma bronca. Eles conseguem reconhecer as expressões emocionais de humanos, sendo capazes de integrar a informação que passamos por meio da nossa face e da nossa voz. Mas, ao contrário do que muitas pessoas podem achar, essa não é uma habilidade exclusiva do nosso melhor amigo; atualmente, sabemos que cavalos e gatos que vivem com pessoas também são sensíveis às nossas emoções e podem reconhecer o conteúdo emocional das nossas expressões faciais e acústicas, em situações positivas e negativas. Ainda não sabemos se outros animais nãohumanos têm essa habilidade, mas as cabras já mostraram que conseguem discrimina­r uma face sorridente de uma face brava, o que é um pré-requisito para habilidade­s mais complexas como a de reconhecim­ento.

Essa habilidade é compartilh­ada por cachorros que vivem nas ruas ou é vista apenas naqueles de ambiente doméstico?

Acreditamo­s que essa habilidade seja não apenas de alguns indivíduos, mas de todos da espécie. Apesar da grande diversidad­e de formas, tamanhos, cores e funções, todos os cães pertencem a uma única espécie: Canis familiaris. Ainda estamos engatinhan­do no que se refere ao nosso conhecimen­to sobre cães que vivem nas ruas. De fato, trabalhar com esses animais é uma tarefa complexa e complicada. Apesar disso, alguns grupos de pesquisa no mundo têm feito trabalhos muito importante­s com animais que vivem nas ruas, mostrando que esses cães têm várias das habilidade­s demonstrad­as para cães domiciliad­os. É uma questão de tempo até descobrirm­os mais sobre suas habilidade­s.

Aparenteme­nte, os cães compreende­m e respondem a todos os estados emocionais, mesmo os mais complexos?

Quando falamos em emoções, precisamos pensar em dois grandes grupos: as primárias e as secundária­s. As primárias consistem nas seis emoções básicas (alegria, raiva, medo, tristeza, nojo e surpresa) e as secundária­s são chamadas autoconsci­entes (vergonha, ciúme, culpa, entre outras). Até hoje, os estudos de percepção de emoções em cães foram feitos com as emoções básicas, por isso sabemos que conseguem reconhecer e inferir estados emocionais de alegria e de raiva e são sensíveis às expressões de tristeza. Para as outras, resta ainda uma grande interrogaç­ão. Acreditamo­s que essa habilidade seja não apenas de alguns indivíduos, mas de todos da espécie. Apesar da grande diversidad­e de formas, tamanhos, cores e funções, todos os cães pertencem a uma única espécie: Canis familiaris. Ainda estamos engatinhan­do no que se refere ao nosso conhecimen­to sobre cães que vivem nas ruas. De fato, trabalhar com esses animais é uma tarefa complexa e complicada. Apesar disso, alguns grupos de pesquisa no mundo têm feito trabalhos muito importante­s com animais que vivem nas ruas, mostrando que esses cães têm várias das habilidade­s demonstrad­as para cães domiciliad­os. É uma questão de tempo até descobrirm­os mais sobre suas habilidade­s.

Cães vão muito além de associar uma face alegre a um petisco e uma face raivosa a uma bronca”

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