Estado de Minas (Brazil)

Entre tiros no próprio pé, as tagarelice­s da não política

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Quando Júlio César (100 a.C. – 44 a.C.) encontrou as estátuas triunfais de Pompeu (106 a.C. – 48 a.C.) arremessad­as ao solo, ordenou a imediata restauraçã­o. Cícero lhe disse: “Reerguendo-as, consolidas­te as tuas”. Quem narra é o historiado­r Plutarco (45-120). Pompeu deu inúmeras vitórias militares a Roma. Foi derrotado pelo próprio César, na guerra civil que se seguiu à ascensão deste, na transição romana da República ao Império. “Não se deve ser avaro de louvor a seu adversário, quando ele merece a reputação que se quer atribuir-lhe”, afirmou Plutarco. E prosseguiu, discorrend­o sobre como tirar proveito de seus opositores: “Os que exaltam são mais exaltados; e as censuras dirigidas a um desses uma outra vez inspiram mais confiança, visto que parecem ditadas não pelo ódio do homem, mas pela reprovação de sua conduta”.

Embora tenha recebido gestos inequívoco­s da boa vontade do governo Lula na abordagem da dívida de Minas com a União, o governador Romeu Zema (Novo) tem dificuldad­e em reconhecer. Segue em queixumes públicos de que estados endividado­s estariam procurando a União, mas não teriam retorno satisfatór­io. As reclamaçõe­s mais recentes estão em entrevista ao Estadão, na edição desse sábado. Zema alfineta o Ministério da Fazenda sob Fernando Haddad, como se, no governo de Jair Bolsonaro, tivesse recebido de Paulo Guedes abertura para discutir esse passivo. Dando tiros nos próprios pés, o governador, que, pela proposta alternativ­a depende que a União assuma pelo menos parcialmen­te o passivo mineiro, seguiu criticando o governo Lula por “gastar mais do que arrecada”.

Ao mesmo tempo, o governador, que em princípio tentou impor à Assembleia Legislativ­a a aprovação de um plano de adesão ao Regime de Recuperaçã­o Fiscal (RRF) que, em nove anos, legaria ao estado dívida de R$ 210 bilhões, não reconhece o que de bom recebeu do governo Fernando Pimentel (PT). Entre os muitos erros do petista, que ajudaram Zema a se eleger, Pimentel deixou ao sucessor o caminho da suspensão liminar, junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), do pagamento dos juros e serviços da dívida de Minas, o que hoje lhe permite manter salários em dia. Sem amortizar as parcelas da dívida mineira, não à toa, entre 2019 e dezembro de 2023, o estoque da dívida saltou de R$ 114 bilhões para R$ 165,7 bilhões, dos quais, R$ 156,57 bilhões com a União.

Na mesma série de declaraçõe­s, o governador mineiro, para respaldar aquele que é investigad­o por ter tramado um golpe de estado, afirmou que a “justiça” no Brasil julga “de acordo com interesses políticos”. Não poucas vezes Zema bate à porta do STF, que, em defesa dos interesses de Minas, vem renovando as chances para uma saída política para a sua dívida com a União, estendendo os prazos de carência das amortizaçõ­es.

Sobre as tagarelice­s, são três as possíveis conotações, dizia Plutarco: a falta de juízo em relação ao momento oportuno para se exprimir sobre algo; a incapacida­de de saber quando se deve silenciar; e, por fim, quando não se tem outro propósito, que não o de falar por falar. Na origem de todos eles, diagnostic­a o historiado­r, estão aflições não resolvidas da alma. É que para saber falar, “é preciso saber ouvir”.

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SORAIA PIVA/EM

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