Os desenvolvedores e os destruidores
A Amazônia pode se transformar em deserto literal e moral: uma terra de indígenas exterminados, povos da floresta expulsos, milhões e milhões de acres pastagens degradadas e rios envenenados. Tal é a distopia provável, desencadeada a partir do “holocausto ambiental”, não previsto, mas que se pôs em curso a partir do projeto da ditadura militar de “inundar a região com civilização”, que desencadeou processos de uso e ocupação predatórios.
A avaliação é da geógrafa Susanna Hecht e do jornalista Alexander Cockburn, autores de “O destino da floresta: desenvolvedores, destruidores e defensores da Amazônia” (Editora Unesp). Publicada em 1990, nos Estados Unidos, a obra consolidou-se como uma marcante narrativa sobre a história social da Amazônia apresentada internacionalmente. Sob o título original “The fate of the forest” (The University of Chicago Press), com última edição atualizada de 2010, o livro finalmente chega ao Brasil, abrindo ao leitor detalhada contextualização histórica da região.
Com sólida pesquisa bibliográfica, o livro percorre um longo trajeto: das populações pré-colombianas e corrida pelo ouro dos conquistadores, nos séculos de escravidão, aos esquemas das ditaduras militares nas décadas de 1960 e 70 e, mais recentemente, às novas economias globalizadas da soja e carne bovina brasileira que avançaram sobre o território da floresta, ainda que um novo mercado de créditos de carbono emerja com potência, ampliando o valor da floresta viva. “As estruturas e os recursos da região encorajaram as incursões de espoliadores de curto prazo – a nobreza em Lisboa, ou os bandeirantes, ou os fazendeiros em São Paulo, os barões da borracha em Paris – que, depois, desfrutavam de suas riquezas em outros lugares”, afirmam os autores.
A luta pelo futuro da Amazônia diz respeito à justiça e à distribuição, destacam Hecht e Cockburn. “Nas batalhas pelo futuro da Amazônia já houve vitórias, e assim como a grande rebelião da década de 1830 levantou líderes dos barracos mais humildes da região, agora as lutas mobilizam líderes autênticos, seja Paiakan ou Chico Mendes, ou centenas de outros líderes sindicais rurais, o clero, advogados, defensores que veem a luta pela justiça como a principal preocupação, a defesa do todo como a chave para o triunfo”, afirmam, entendendo estar nas lutas e mobilização social dos povos da floresta e movimentos sociais o ponto de inflexão no panorama de destruição da floresta que tem ainda, como aliada, o mercado emergente dos créditos de carbono e a consciência internacional do aquecimento global.