Saber matemática é questão de cidadania
Campanhas e incentivos aos estudantes buscam divulgar o estudo da disciplina no Brasil
Adisciplina mais temida do currículo escolar não tem recebido, no Brasil, a importância que merece. A última edição do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa), divulgado no final de 2016, apontou que 70,25% dos alunos brasileiros estão abaixo do nível adequado de conhecimento em matemática. Para o diretor-geral do Instituto de Matemática Pura e Aplicada (Impe), Marcelo Miranda Viana da Silva, a realidade exposta pelos exames denuncia um grave problema. “Um país cuja população não sabe matemática está jogando riqueza fora. Além disso, priva as pessoas do exercício pleno da cidadania”, critica.
Silva esteve em Londrina no dia 20 de fevereiro para participar do lançamento regional do “Biênio da Matemática 2017-2018 Gomes de Sousa”. O evento tem o objetivo de difundir a Matemática e a Ciência e Tecnologia no país nos próximos dois anos, através de eventos, campanhas e incentivo aos estudantes para que se dediquem ao estudo da ciência.
Nesse período, o país sediará pela primeira vez a Olimpíada Internacional da Matemática (IMO 2017) e o Congresso Internacional de Matemáticos (ICM 2018), o mais importante evento do mundo voltado à disciplina. O Biênio foi transformado em lei por iniciativa do deputado federal Alex Canziani (PTB).
“Queremos desmistificar o estudo da matemática, que normalmente é encarada como ‘bicho-papão’ na escola”, afirma ele, destacando que o problema é “complexo”. “A matemática tem que ser ensinada de forma diferente para que o Brasil progrida no ritmo que precisa, mas os professores não são bem preparados e não têm acesso às informações, além de compartilharem uma carreira com poucos incentivos. A comunidade científica precisa se envolver para apresentar a disciplina sob outros ângulos”, defende.
Quando as pessoas não sabem fazer contas ao conferir um troco ou mesmo calcular a taxa de juros imposta a um financiamento, o exercício da cidadania acaba sendo afetado. O diretor do Impe citou o exemplo de um caixa de supermercado onde ele estava que, recentemente, não soube calcular uma operação com unidades para fazer a cobrança correta ao efetuar uma troca de mercadoria, o que acabou lesando o cliente, que também não percebeu o erro. “O país precisa ensinar matemática às pessoas mais simples”, insiste.
O pesquisador destaca, por outro lado, que a matemática tem imenso potencial de gerar riquezas. “As profissões melhor remuneradas são aquelas que exigem forte conteúdo de matemática. Mas, para que sejam exercidas, é preciso que as pessoas sejam habilitadas”, diz. Se, ao contrário, menos de 4% dos estudantes do Ensino Médio têm proficiência na disciplina, ele aponta que o país perde um importante nicho de atuação.
TALENTOS
Na França, conforme Viana, uma pesquisa apontou que 44% das revoluções tecnológicas fundamentais para o desenvolvimento do país são relacionadas ao conhecimento dos números. No Brasil, muitos medalhistas das últimas edições das Olimpíadas de Matemática estão se colocando no mercado de trabalho em profissões que ofertam boa remuneração e oportunidade de crescimento. “Os talentos existem, mas precisam ser incentivados”, pede.
Difícil de ser ensinada, a matemática tem que ser mais identificada com a realidade das crianças. “A aprendizagem não deve ser passiva, mas sim proativa. Também defendo que os alunos devem ter acesso aos mesmos direitos, mas os talentos precisam ser incentivados de maneira diferente”, diz.
O gosto pelos números e suas relações depende também do apoio familiar. “O mito sobre a dificuldade de aprender matemática passa de pai para filho e banaliza o medo da disciplina. Isso é grave e compromete a capacitação de gerações”, alerta.
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