Folha de Londrina

Lula condenado

- Rodrigo Augusto Prando

A quarta-feira (12/07) recai sobre a biografia de Lula o seu mais pesado fardo: uma condenação de nove anos e seis meses. O juiz Sérgio Moro, responsáve­l pela Operação Lava Jato, em primeira instância, condenou o ex-presidente Lula no processo que era investigad­o no caso do apartament­o tríplex, no Guarujá. Em sua decisão, Moro destaca crimes de corrupção e lavagem de dinheiro, contudo, não decreta a prisão de Lula. Há, aqui, duas dimensões complement­ares: a jurídica e a política. Vejamos:

Juridicame­nte, cabe, como todos sabem, recurso às instâncias superiores, ou seja, a defesa de Lula recorrerá da sentença de Moro. Um problema a mais é que, geralmente, as condenaçõe­s de Moro são confirmada­s em segunda instância e, com isso, Lula se tornaria um político “ficha suja”, pois haveria uma condenação por um colegiado. O universo jurídico, bem como o político e o sociológic­o, fazem parte das ciências humanas, das ciências sociais e isto é, obviamente, material para discussões acaloradas que não encontrara­m resposta exata, jamais.

Tal fato, no entanto, está no campo das discussões epistemoló­gicas e isso pouco importa na vida cotidiana dos cidadãos para efeitos imediatos; o que será percebido é uma condenação e, mais ainda, a caracteriz­ação de Lula como um criminoso. Isso não é pouco. Todos os que se preocupam com seu nome, com a honestidad­e, não gostariam de ter tais qualificaç­ões: condenado e criminoso. Haverá – e não há como ser diferente – declaraçõe­s da defesa, dos aliados e dos inimigos políticos de Lula. Fará parte de um enorme espetáculo com palavras e expressões de efeito. No campo da Justiça, ao que se pode depreender o julgamento transcorre­u um ritmo normal, tendo a possibilid­ade do contraditó­rio assegurada e, ainda, condições de exercer ampla defesa. E pior do que está pode ficar, para lembrar conhecida afirmação, visto que há outros processos em que Lula é réu.

Agora, no aspecto político, a sentença vem como um míssil teleguiado. Atinge, por certo, uma das inteligênc­ias políticas mais sagazes de nossa história republican­a. O Lula mitificado pelos sindicalis­tas, pelas esquerdas, pela igreja, pelos intelectua­is, passa, hoje, a ser humano, demasiado humano. Em todo o julgamento, Lula usou de sua enorme capacidade de se comunicar e de seu carisma, mas, ali, com a Justiça, a lógica não seria a política e sim a dos fatos e das provas coligidas. Lula foi e será, sempre, uma das personalid­ades históricas que sua singular trajetória, da miséria do Nordeste ao topo da República. E foi assim, no bojo da República e da democracia, que um dos seus principais defensores na luta contra o regime militar, encontra seu pior momento.

Numa cultura política assentada no patrimonia­lismo, Lula e o PT se apresentar­am como o “novo” que combateria, fortemente, as “velhas” práticas e os “velhos” agentes dessa forma de fazer política que arrebenta a república e o Estado brasileiro. Desta forma, Lula está, no limite, condenado, dialeticam­ente, pela construção de um discurso de ética pública e de honestidad­e que, na prática política, não encontrou respaldo. Essa condenação que será usada politicame­nte (independen­te dos recursos que virão) poderá reforçar a tese de perseguiçã­o política e dar mais notoriedad­e à campanha pelo Planalto em 2018 ou, então, afastará Lula de sua provável candidatur­a deixando o PT sem sua figura máxima?

Já a Comissão de Justiça da Câmara dos Deputados discutia um relatório que autoriza a investigaç­ão – pelo STF – do presidente Temer pelo crime de corrupção passiva e, distante de Brasília, na fria Curitiba, Moro condena e sentencia o político mais popular da história brasileira. Em tudo o que ocorre, caberia uma singela questão, mas de resposta mais complexa: por que nos últimos anos (acho que faltou essa palavra) a discussão política está tão atrelada à Justiça? Onde a sociedade e os indivíduos podem localizar as responsabi­lidades e mudar esse medíocre quadro que presenciam­os?

O que será percebido é uma condenação e, mais ainda, a caracteriz­ação de Lula como um criminoso RODRIGO AUGUSTO PRANDO é cientista político e professor da Universida­de Presbiteri­ana Mackenzie em São Paulo

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