Mudanças climáticas trazem oportunidade de crescimento
Como as nações europeias e asiáticas, o Brasil precisa investir na geração de produtos que atendam às necessidades de mercado geradas pelos efeitos do clima
Oano de 2017 é o quarto ano consecutivo em que há registro de pico de temperatura média no mundo, com aumento de 1,1 grau. No Brasil, em algumas regiões, como o Nordeste, a temperatura média já subiu entre três e cinco graus. As mudanças climáticas são um tema prioritário para a humanidade hoje, mas elas não devem ser encaradas apenas como um problema, mas também como oportunidades de novos negócios e maior crescimento econômico. A constatação é do coordenador do Programa Mudanças Climáticas da WWF-Brasil, André Costa Nahur, que participou como painelista do 9º EncontrosFolha, realizado na última sexta-feira (28) e que teve como tema “Como as mudanças climáticas desafiam o crescimento econômico”.
Também participaram dos painéis o diretor da Sociedade Brasileira de Economia Ecológica Regional Sul, Junior Ruiz Garcia; o ex-prefeito da cidade de Taquarituba (SP), Miderson Zanello Milléo; e o coordenador de mudanças climáticas da SemaPR, Mauro Corbellini, que contou com o apoio do coordenador executivo de Proteção e Defesa Civil Estadual, Edemilson de Barros. Na abertura do EncontrosFolha o professor do Mestrado em Governança e Sustentabilidade do Isae/FGV, Cleverson Vitorio Andreoli, tratou sobre “Como as empresas podem responder às mudanças climáticas”.
Nações europeias e asiáticas já se atentaram para as boas possibilidades de negócios advindas com as questões climáticas. Atualmente, a China investe bilhões de dólares em painéis solares e outras tecnologias que contribuem para a descarbonização da economia. Enquanto os chineses faturam alto com a exportação de painéis solares para o Brasil, que chegam aos nossos portos em quantidades cada vez maiores, o Brasil perde oportunidades econômicas ao não olhar para a frente na questão das mudanças climáticas e ver qual é o grande potencial de geração de emprego no País, alerta Nahur. “Ano passado e ano retrasado, o investimento em energias renováveis no mundo está muito maior do que qualquer outros de combustíveis fósseis”, destacou o coordenador da WWF-Brasil. “Os dois últimos anos foram os dois primeiros anos em que a gente teve um deslocamento da linha do aumento do PIB e da linha do aumento de emissões de gases de efeito estufa, ou seja, a economia está transitando, isso já está acontecendo e é um processo irreversível.”
RECURSOS
Se os custos de transição do emprego de energias mais poluentes para fontes renováveis de energia são altos, Nahur lembra que há formas de contornar a questão financeira já que há várias linhas de crédito interessantes para financiamento do setor agrícola, como o Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar) e o Plano ABC (Agricultura de Baixa Emissão de Carbono), só para citar duas delas. São recursos que estão disponíveis e podem reverter os impactos ambientais, além de fortalecer os processos produtivos.
Nahur cita também os green bonds, que são títulos de dívida emitidos para financiar ativos verdes ou de redução das mudanças climáticas. Neste ano, o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) captou quase R$ 10 bilhões em green bonds para investir em energia renovável no Brasil, com o fortalecimento da geração de energia solar, eólica e biomassa. “O Brasil ainda não avançou nisso e a gente está trabalhando para tentar acelerar esse processo, mas existem várias iniciativas e o setor privado também está nisso.”
A WWF-Brasil, em parceria com a Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, realizou um estudo para tentar traçar qual será o grande impacto dos diferentes cenários climáticos nos principais setores econômicos no País e o resultado apontou para um enorme impacto na produção, principalmente na agricultura, na pecuária e no setor hidrelétrico. “A análise mostra que nos próximos anos, até 2050, o parque hidrelétrico que a gente tem no Brasil poderá ter uma queda de até 30% na produção pela redução da disponibilidade hídrica, isso no melhor dos cenários e considerando que os cenários climáticos vão ficar os mesmos de hoje, mas a gente sabe que isso tudo vai mudar.” No Centro-Oeste brasileiro, aponta Nahur, já é uma realidade a perda de produtividade do solo.
DESCARBONIZAÇÃO
Outro estudo da WWFBrasil feito em conjunto com a UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) revelou que se o Brasil começar a implementar medidas para reduzir a emissão de carbono nos setores de energia, agropecuária e transporte, por exemplo, até 2030 poderia haver um incremento na economia nacional, com aumento do PIB (Produto Interno Bruto), redução da taxa de desemprego e melhora no poder de consumo de várias classes sociais. “Tem uma grande possibilidade de fazer esse shift e gerar um grande retorno do ponto de vista econômico no País. No cenário governamental, se você reduz a taxa de desemprego, você vai gerar um novo mercado no Brasil”, ressalta Nahur.
Sobre as oportunidades de crescimento econômico surgidas no rastro das mudanças climáticas, o coordenador da ONG ambiental diz que cabe ao Brasil enxergar essas oportunidades e ver o grande mercado que se apresenta, com disponibilidade de recursos para financiamento. “Quanto mais tempo a gente demora para incluir isso, maior vai ser o custo para a sociedade. Precisamos começar a adotar essas medidas agora, aproveitar essas oportunidades para fazer do Brasil uma economia de referência de baixo carbono e também resiliente para a gente parar de sofrer esses impactos que as mudanças climáticas estão trazendo para todos nós.”
Para o superintendente do Grupo FOLHA, José Nicolás Mejía, o impacto econômico das mudanças climáticas no mundo é uma realidade, ressaltando os custos que o Estado já está tendo na recuperação de danos provocados por eventos climáticos e que não estão previstos em orçamento. Ele alerta para a necessidade de se encontrar soluções que permitam reverter ou pelo menos estabilizar as mudanças climáticas. “Assim podemos sonhar com um futuro melhor.”
No cenário governamental, se você reduz a taxa de desemprego, você vai gerar um novo mercado no Brasil”