Relator da reforma política na Câmara critica “distritão” e fundo público de R$ 3,6 bilhões para financiar campanhas, o “Bolsa Político”
O petista Vicente Cândido desabafa sobre propostas de seu próprio texto que altera sistema de voto e cria fundo de R$ 3,6 bilhões para campanhas
Relator da reforma política na Câmara, o deputado Vicente Cândido (PTSP), criticou nessa quintafeira (10) o seu próprio texto, aprovado na noite anterior pela comissão que trata o assunto. Cândido fez um desabafo para os colegas e criticou o valor de R$ 3,6 bilhões para o fundo público de financiamento de campanhas – espécie de “Bolsa Político” como também o “distritão” para as próximas eleições de deputado e vereador. A comissão aprovou ainda o estabelecimento de mandato de dez anos para ministros de tribunais superiores (hoje eles podem ficar até os 75 anos de idade). As emendas restantes tratam de pontos laterais da reforma.
“Sei que a democracia custa, que não se faz campanha sem dinheiro. Vamos olhar para frente, parar de olhar para o próprio umbigo, para sua própria reeleição. Desse jeito, com essa toada, podemos ter uma renovação muito maior [nas próximas eleições] e não vai ser o distritão que vai salvar. Estou colocando no meu relatório contra minha vontade”, disse Cândido aos parlamentares.
O texto aprovado na noite de quarta-feira (9) estabelece como fonte para abastecer o fundo 0,5% da RCL (receita corrente líquida) do ano anterior. O relator defendia um percentual menor, de 0,25% da RCL. “Procurei fazer um relatório bastaste austero, uma reforma política linkada com o mundo, com uma campanha barata, enxuta, isonômica. Estou perdendo o debate. Cada um vai responder pelos seus atos. Não fui competente para convencêlos”, disse o deputado em entrevista na manhã dessa quinta (10).
A regulamentação do fundo, ou seja, as regras específicas para este caixa de financiamento das campanhas, será definida em uma outra comissão, que se reúne na semana que vem. Há uma série de divergências em relação ao uso do dinheiro público.
Uma das questões, por exemplo, é que há partidos que não querem que a legislação estabeleça como o montante recebido por cada legenda será distribuído internamente. Outras siglas, no entanto, temem que, sem o controle, suas cúpulas beneficiem aliados e deixem rivais internos com poucos recursos para as eleições.
Para entrar em vigor nas próximas eleições, a reforma tem que passar até setembro por votações nos plenários da Câmara e do Senado, em dois turnos, e precisa do apoio de pelo menos 60% dos parlamentares (308 dos 513 deputados e 49 dos 81 senadores).
DISTRITÃO
Na primeira emenda votada, ainda na madrugada dessa quinta, os deputados aprovaram por 17 votos a 15 a instituição do chamado “distritão” nas eleições de 2018 e 2020, no lugar do modelo eleitoral atual, o “proporcional”.
No atual modelo eleitoral, o proporcional, as cadeiras da Câmara dos Deputados, das Assembleias e das câmaras municipais são distribuídas com base em um cálculo (quociente eleitoral) que leva em conta o total de votos dados aos candidatos e aos partidos (voto na legenda). Isso leva em alguns casos à eleição de um político individualmente menos votado do que outro que componha uma legenda ou coligação mais robusta.
Já no distritão são eleitos os mais votados. Não há voto em legenda. Isso evita o “efeito Tiririca”, que ocorre quando deputados supervotados acabam elegendo colegas de partido ou coligação com poucos votos.
O resultado apertado indica grande dificuldade para aprovação no plenário, apesar do apoio da cúpula do Congresso e da direção dos principais partidos governistas ao tema. Por se tratar de emenda à Constituição é preciso o voto de pelo menos 308 dos 513 deputados.
Uma frente suprapartidária contra o distritão já foi criada com membros de PT, PC do B, PSOL, PR, PRB, PHS, PSD, PSB e PDT. “A ideia é manter o sistema atual, mas renovado. Quando se institui a cláusula de desempenho e com o fim de coligação, você já acaba com meio mundo de malandragem”, disse o deputado José Guimarães (PT-CE), líder da minoria na Câmara.
O relator da reforma política também se posicionou contra o distritão. “Acho um desastre. Tanto que votei contra e continuarei fazendo campanha contra”, afirmou.
O “distritão” tem, porém, pelo menos quatro características bastante polêmicas. A primeira é tornar sem efeito a maioria dos votos dados pelos eleitores. O montante de “desperdício” não tem relação com os votos nulos, brancos ou com a abstenção. Trata-se dos votos dados aos candidatos não eleitos, somados aos direcionados em excesso para os mais bem votados.
No sistema proporcional, a votação nos não eleitos e o excedente dos eleitos contribuem para que outros candidatos do mesmo partido ou coligação consigam uma vaga. As demais características são a concentração de recursos na mão de poucos candidatos (no sistema proporcional o número de candidatos é maior), a dificuldade de renovação e o enfraquecimento das identidades partidárias.
Patrocinado pelo então presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ), hoje
Acho um desastre. Tanto que votei contra e continuarei fazendo campanha contra” preso, o “distritão” foi rejeitado pela Câmara em 2015. Mas agora ganhou apoio em outras legendas governistas, entre elas o PSDB, e dos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE).
VICES
A comissão especial de uma das propostas da reforma política na Câmara aprovou ontem à tarde o destaque que retira a sugestão de eliminar a figura de vice dos cargos de presidente da República, governador e prefeito. Por 19 votos a 6, os deputados rejeitaram a proposta do relator Vicente Cândido (PT-SP), que em seu substitutivo à Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 77/03, estabelecia o fim dos cargos de vice.
SEM QUÓRUM
Sem a presença suficiente de integrantes da base governista, a comissão especial da Câmara não conseguiu concluir nessa quinta-feira (10) a aprovação das medidas que alteram a Constituição Federal. Com isso, ficou para a semana que vem a votação de três emendas restantes ao relatório do deputado Vicente Cândido (PT-SP).