Folha de Londrina

Relator da reforma política na Câmara critica “distritão” e fundo público de R$ 3,6 bilhões para financiar campanhas, o “Bolsa Político”

O petista Vicente Cândido desabafa sobre propostas de seu próprio texto que altera sistema de voto e cria fundo de R$ 3,6 bilhões para campanhas

- Daniel carvalho Folhapress

Relator da reforma política na Câmara, o deputado Vicente Cândido (PTSP), criticou nessa quintafeir­a (10) o seu próprio texto, aprovado na noite anterior pela comissão que trata o assunto. Cândido fez um desabafo para os colegas e criticou o valor de R$ 3,6 bilhões para o fundo público de financiame­nto de campanhas – espécie de “Bolsa Político” como também o “distritão” para as próximas eleições de deputado e vereador. A comissão aprovou ainda o estabeleci­mento de mandato de dez anos para ministros de tribunais superiores (hoje eles podem ficar até os 75 anos de idade). As emendas restantes tratam de pontos laterais da reforma.

“Sei que a democracia custa, que não se faz campanha sem dinheiro. Vamos olhar para frente, parar de olhar para o próprio umbigo, para sua própria reeleição. Desse jeito, com essa toada, podemos ter uma renovação muito maior [nas próximas eleições] e não vai ser o distritão que vai salvar. Estou colocando no meu relatório contra minha vontade”, disse Cândido aos parlamenta­res.

O texto aprovado na noite de quarta-feira (9) estabelece como fonte para abastecer o fundo 0,5% da RCL (receita corrente líquida) do ano anterior. O relator defendia um percentual menor, de 0,25% da RCL. “Procurei fazer um relatório bastaste austero, uma reforma política linkada com o mundo, com uma campanha barata, enxuta, isonômica. Estou perdendo o debate. Cada um vai responder pelos seus atos. Não fui competente para convencêlo­s”, disse o deputado em entrevista na manhã dessa quinta (10).

A regulament­ação do fundo, ou seja, as regras específica­s para este caixa de financiame­nto das campanhas, será definida em uma outra comissão, que se reúne na semana que vem. Há uma série de divergênci­as em relação ao uso do dinheiro público.

Uma das questões, por exemplo, é que há partidos que não querem que a legislação estabeleça como o montante recebido por cada legenda será distribuíd­o internamen­te. Outras siglas, no entanto, temem que, sem o controle, suas cúpulas beneficiem aliados e deixem rivais internos com poucos recursos para as eleições.

Para entrar em vigor nas próximas eleições, a reforma tem que passar até setembro por votações nos plenários da Câmara e do Senado, em dois turnos, e precisa do apoio de pelo menos 60% dos parlamenta­res (308 dos 513 deputados e 49 dos 81 senadores).

DISTRITÃO

Na primeira emenda votada, ainda na madrugada dessa quinta, os deputados aprovaram por 17 votos a 15 a instituiçã­o do chamado “distritão” nas eleições de 2018 e 2020, no lugar do modelo eleitoral atual, o “proporcion­al”.

No atual modelo eleitoral, o proporcion­al, as cadeiras da Câmara dos Deputados, das Assembleia­s e das câmaras municipais são distribuíd­as com base em um cálculo (quociente eleitoral) que leva em conta o total de votos dados aos candidatos e aos partidos (voto na legenda). Isso leva em alguns casos à eleição de um político individual­mente menos votado do que outro que componha uma legenda ou coligação mais robusta.

Já no distritão são eleitos os mais votados. Não há voto em legenda. Isso evita o “efeito Tiririca”, que ocorre quando deputados supervotad­os acabam elegendo colegas de partido ou coligação com poucos votos.

O resultado apertado indica grande dificuldad­e para aprovação no plenário, apesar do apoio da cúpula do Congresso e da direção dos principais partidos governista­s ao tema. Por se tratar de emenda à Constituiç­ão é preciso o voto de pelo menos 308 dos 513 deputados.

Uma frente supraparti­dária contra o distritão já foi criada com membros de PT, PC do B, PSOL, PR, PRB, PHS, PSD, PSB e PDT. “A ideia é manter o sistema atual, mas renovado. Quando se institui a cláusula de desempenho e com o fim de coligação, você já acaba com meio mundo de malandrage­m”, disse o deputado José Guimarães (PT-CE), líder da minoria na Câmara.

O relator da reforma política também se posicionou contra o distritão. “Acho um desastre. Tanto que votei contra e continuare­i fazendo campanha contra”, afirmou.

O “distritão” tem, porém, pelo menos quatro caracterís­ticas bastante polêmicas. A primeira é tornar sem efeito a maioria dos votos dados pelos eleitores. O montante de “desperdíci­o” não tem relação com os votos nulos, brancos ou com a abstenção. Trata-se dos votos dados aos candidatos não eleitos, somados aos direcionad­os em excesso para os mais bem votados.

No sistema proporcion­al, a votação nos não eleitos e o excedente dos eleitos contribuem para que outros candidatos do mesmo partido ou coligação consigam uma vaga. As demais caracterís­ticas são a concentraç­ão de recursos na mão de poucos candidatos (no sistema proporcion­al o número de candidatos é maior), a dificuldad­e de renovação e o enfraqueci­mento das identidade­s partidária­s.

Patrocinad­o pelo então presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ), hoje

Acho um desastre. Tanto que votei contra e continuare­i fazendo campanha contra” preso, o “distritão” foi rejeitado pela Câmara em 2015. Mas agora ganhou apoio em outras legendas governista­s, entre elas o PSDB, e dos presidente­s da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE).

VICES

A comissão especial de uma das propostas da reforma política na Câmara aprovou ontem à tarde o destaque que retira a sugestão de eliminar a figura de vice dos cargos de presidente da República, governador e prefeito. Por 19 votos a 6, os deputados rejeitaram a proposta do relator Vicente Cândido (PT-SP), que em seu substituti­vo à Proposta de Emenda Constituci­onal (PEC) 77/03, estabeleci­a o fim dos cargos de vice.

SEM QUÓRUM

Sem a presença suficiente de integrante­s da base governista, a comissão especial da Câmara não conseguiu concluir nessa quinta-feira (10) a aprovação das medidas que alteram a Constituiç­ão Federal. Com isso, ficou para a semana que vem a votação de três emendas restantes ao relatório do deputado Vicente Cândido (PT-SP).

 ?? Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil ?? A reforma tem que passar ainda pelos plenários da Câmara e do Senado, em dois turnos de votação, e precisa do apoio de pelo menos 60% dos parlamenta­res
Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil A reforma tem que passar ainda pelos plenários da Câmara e do Senado, em dois turnos de votação, e precisa do apoio de pelo menos 60% dos parlamenta­res

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil