Condenação na OMC vai forçar negociação com Brasil
Órgão pede para País retirar incentivos fiscais à indústria em até 90 dias
AOMC (Organização Mundial do Comércio) deu nesta quarta-feira, 30, prazo de 90 dias para o Brasil suspender sete programas de incentivos fiscais à indústria, por considerar que houve violação de regras internacionais. A decisão tem caráter preliminar e complementa condenação definida pelo órgão em novembro passado, após reclamação formal feita por União Europeia e Japão sobre políticas nos setores de automóveis, telecomunicações e informática. O governo federal vai recorrer.
Os programas condenados pelo painel da OMC são o Inovar-Auto, programas que isentam de impostos as empresas exportadoras que compram bens de capital (RECAP e PEC), além de quatro programas do setor eletroeletrônico, que são a Lei de Informática, o PADIS (semicondutores), o PATVD ( TV digital) e o programa de inclusão digital. Os dois últimos citados já terminaram e o Inovar-Auto tem validade até o fim de 2017.
O governo brasileiro tem 60 dias, contados a partir de 19 de setembro, para decidir se recorre da decisão, o que exigirá novo exame por parte da OMC e deve estender o caso por mais seis meses. “Nossa tendência é apelar, mas não vou entrar em detalhe no conteúdo por razões óbvias de estratégia”, disse o subsecretário-geral de Assuntos Econômicos e Financeiros do Ministério das Relações Exteriores, Carlos Márcio Bicalho Cozendey, em entrevista coletiva sobre o relatório da OMC.
Professor da Faculdade de Economia e Administração (FEA) da Universidade de São Paulo (USP), Simão Silber afirmou que a OMC não tem como impor regras ao Brasil, mas a decisão permitiria que países que se sentissem atingidos pelas medidas elevassem a tributação para importações brasileiras. “Isso nunca ocorre. O que é feito, normalmente, é que se obriga o governo brasileiro a sentar e negociar com os países que fizeram a denúncia.”
Silber disse que as isenções fiscais propostas oficialmente foram escancaradas em “Diário Oficial”, o que foi “burrice”. “Outros países fazem coisas erradas assim, mas é algo que não se assume”, afirmou o professor. Para ele, o governo brasileiro recorrerá, mas nunca houve reviravolta na segunda instância da OMC. “É um mecanismo para negociar e não para que se tenha represálias.”
INOVAR-AUTO
O principal foco da reclamação na OMC foi o InovarAuto (Programa de Incentivo à Inovação Tecnológica e Adensamento da Cadeia Produtiva de Veículos Automotores), que oferece incentivos tributários condicionados a novos investimentos, aumento do padrão tecnológico e de segurança em veículos nacionais e crescimento do número de peças nacionais, entre outras questões. O objetivo era fomentar a competitividade do setor automotivo nacional, mas implicava em diferença de até 30 pontos percentuais no IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) de automóveis nacionais e importados.
Especialista em comércio exterior e professora da UEL (Universidade Estadual de Londrina, Maria de Fátima Sales afirmou que cada país trata de proteger setores mais sensíveis e estratégicos à própria economia. “Existem setores em que o Brasil exporta, como o primário, em que União Europeia e Estados Unidos dão subsídios com o pano de fundo da segurança alimentar, com barreiras sanitárias, e fazem com que o Brasil exporte menos para eles.”
Maria de Fátima disse não defender políticas de proteção comercial, mas acredita que o recurso do governo brasileiro possa citar, por exemplo, que os altos juros e carga tributária nacionais não são compatíveis com o restante do mundo, como justificativa para os incentivos a setores estratégicos e que precisam de maior competitividade na indústria.
Em nota, a CNI (Confederação Nacional da Indústria) informou que apresentará ao governo um conjunto de propostas para a política industrial após a decisão final da OMC. “As empresas brasileiras e as estrangeiras que investem no Brasil precisam de instrumentos que tenham impacto real no desenvolvimento produtivo e estejam de acordo com as normas internacionais. A última coisa que o empresário precisa é de medidas pouco eficazes ou que podem ser questionadas no futuro”, disse o diretor de Desenvolvimento Industrial da CNI, Carlos Abijaodi na nota.