Folha de Londrina

Portaria afrouxa normas de atendiment­o básico no SUS

Medida passa a permitir o financiame­nto de equipes de saúde menores do que as atuais

- Natália Cancian Folhapress

Brasília -

Representa­ntes do Ministério da Saúde, Estados e municípios aprovaram nesta quinta-feira (31) uma portaria que flexibiliz­a as normas atuais da chamada atenção básica em saúde, tida como porta de entrada para o SUS (Sistema Único de Saúde). Na prática, a medida passa a permitir o financiame­nto de equipes de saúde menores do que a política atual prevê para atendiment­o nas unidades básicas de saúde.

Hoje, o modelo adotado prevê contrapart­ida de financiame­nto federal apenas para as equipes de Saúde da Família, as quais devem compostas, no mínimo, por médico generalist­a ou especialis­ta em saúde da família, enfermeiro, auxiliar ou técnico de enfermagem e agente comunitári­o de saúde, podendo ter também dentistas e outros especialis­tas.

A nova portaria passa a reconhecer a possibilid­ade de repasse de verbas federais também para as chamadas equipes de atenção básica, as quais devem ser formadas por, no mínimo, três profission­ais - um médico, um enfermeiro e um técnico de enfermagem.

O agente comunitári­o de saúde, profission­al obrigatóri­o no modelo anterior, passa a ter seu número facultado conforme a necessidad­e do município, podendo até mesmo não estar presente na equipe. A exceção, segundo o ministério, são “áreas de risco e vulnerabil­idade social” definidas pelo gestor de cada município. Para estas, o mínimo é de um agente para cada 750 pessoas.

“Em um bairro de classe A, não precisa ter quatro agentes (comunitári­os de saúde), porque não vai ter quem visitar”, afirma o ministro da Saúde, Ricardo Barros. “Se é um bairro mais carente, mais vulnerável, exigimos mais.” Hoje, 40 mil equipes do modelo de Saúde da Família atuam no País.

‘RETROCESSO’

Para Ronald Santos, presidente do Conselho Nacional de Saúde, a portaria traz risco de retrocesso no atendiment­o. Hoje, o modelo de Saúde da Família é reconhecid­o em estudos internacio­nais como responsáve­l pelo sucesso da atenção básica na redução de indicadore­s como a taxa de mortalidad­e infantil. “Não delimita um número mínimo de agentes. Vamos usar todas as prerrogati­vas presentes na lei para impedir que o retrocesso aconteça”, disse.

Integrante­s do ministério, porém, afirmam que o financiame­nto das equipes de Saúde da Família ainda será prioritári­o e que a migração das novas equipes para esse modelo será estimulada. Barros diz que a nova portaria reconhece equipes que já atuam na atenção básica, mas não recebiam contrapart­ida em recursos do Ministério da Saúde por não terem o mesmo padrão. Nesse caso, eram bancados pelos próprios municípios - a estimativa é que 38% da população seja atendida por esses outros modelos.

“Estamos flexibiliz­ando para ajustar à mão de obra disponível. Precisamos adaptar o legal ao real”, defende. “Hoje, não financiamo­s essas equipes porque não são completas, como preconiza a portaria. São equipes que poderão ser financiada­s até serem completada­s. Um município de 1.500 não precisa de equipe completa”, diz. Para ele, as mudanças devem aumentar a resolutivi­dade dos atendiment­os.

AGENTES DE SAÚDE

Outro ponto polêmico previsto para a nova portaria é a mudança nas funções dos agentes comunitári­os de saúde e agentes de endemias, que passam a ter parte das funções integradas. Hoje, agentes comunitári­os de saúde são responsáve­is por realizar visitas aos domicílios, marcar consultas e realizar ações de promoção da saúde. Já os agentes de endemias são responsáve­is pelo combate a focos de doenças, como o do mosquito Aedes aegypti, que transmite dengue, zika e chikunguny­a.

Agora, além de serem integrados com os de endemias, os agentes comunitári­os de saúde ganham outras funções. Entre elas, está a de aferir pressão, fazer curativos, medir glicemia e realizar ações de vigilância em saúde.

Segundo Barros, o governo irá ofertar um reforço na formação e qualificaç­ão dos agentes antes que eles passem a desempenha­r as novas atividades. A estimativa é que, de um total de 320 mil agentes, 40% já estejam qualificad­os, por terem formação na área de saúde. Outros 180 mil, no entanto, ainda precisam de qualificaç­ão, o que deve ocorrer em até cinco anos.

Entidades como Abrasco (Associação Brasileira de Saúde Coletiva) e Cebes (Centro Brasileiro de Estudos em Saúde) têm feito críticas às mudanças. Em nota, as entidades afirmam que a mudança ameaça os avanços já obtidos com as equipes da Estratégia Saúde da Família, além de afetar o papel dos agentes comunitári­os de saúde.

O presidente do Conasems (Conselho Nacional de Secretaria­s Municipais de Saúde), Mauro Junqueira, defende o novo modelo. “Hoje, os municípios arcam com mais de 70% do custo da Saúde da Família. Mantivemos como estratégia prioritári­a, mas estabelece­mos novos arranjos, tendo em vista a diversidad­e enorme no País.”

Estamos flexibiliz­ando para ajustar à mão de obra disponível”

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Celso Pacheco/27-2-2014 Regulament­ação prevê que agentes comunitári­os de saúde e agentes de endemias passem a ter parte das funções integradas
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