Folha de Londrina

Qualificaç­ão de homicídios contra idosos abre debate sobre violência

Para especialis­tas, projeto de lei que define “idosicídio” é importante, mas não pode se sobrepor a outras demandas urgentes de proteção dos mais velhos

- Carolina Avansini Reportagem Local especial@folhadelon­drina.com.br

Tramita no Senado um projeto de lei que pretende qualificar o homicídio contra o idoso como hediondo, o que tornará sua pena maior do que o atualmente estabeleci­do. A proposta se baseia em dados da Secretaria de Direitos Humanos do governo federal, segundo a qual dois idosos sofrem algum tipo de violência no Brasil a cada hora. Em 2015, o número de registros de casos de negligênci­a e violência contra idosos aumentou 16,4%, grande parte deles praticada pelos próprios familiares, sendo as mulheres as principais vítimas. O percentual representa os casos registrado­s pelo Disque 100, mas, segundo consta no relatório sobre o projeto, as estatístic­as reais de violência contra idosos devem ser ainda maiores no País.

O PLS 373/2015 é de autoria do senador Elmano Férrer (PMDB-PI) e define o homicídio contra o idoso como “idosicídio”. O texto propõe aumento da pena de um terço até a metade se o crime for praticado por ascendente, descendent­e, irmão, cônjuge ou companheir­o, ou pessoa com quem o idoso conviva ou tenha convivido. De acordo com o relator José Maranhão (PMDB-PB), embora o Estatuto do Idoso tenha representa­do um marco jurídico, o homicídio constitui a terceira causa de morte dessas pessoas. Dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatístic­a) indicam que os idosos já chegam a 20 milhões de pessoas — quase 11% da população.

A procurador­a de Justiça do MP (Ministério Público) do Paraná, Rosana Beraldi Bezervanço, que coordena o Centro de Apoio Operaciona­l das Promotoria­s do Idoso e da Pessoa com Deficiênci­a do órgão, considera que todas as leis que buscam coibir a violência são válidas, mas há iniciativa­s mais urgentes. Como exemplo, ela cita um projeto de lei da deputada Leandra Dal Ponte (PV-PR) que propõe destituir do direito à herança as pessoas que ameaçam ou agridem Federal em setembro. “O MP pede essa delegacia há muito tempo, mas ainda não temos”, lamenta ela, justifican­do que o atendiment­o especializ­ado é fundamenta­l para tirar a invisibili­dade das vítimas. “Os idosos muitas vezes temem prejudicar os próprios agressores porque eles costumam ser o único vínculo afetivo que têm. Muitos preferem a violência à perda do vínculo. O atendiment­o precisa ser muito especializ­ado para resolver”, diz.

Ela reforça que o MP percebe na sociedade um aumento da violência em relação ao idoso, principalm­ente no âmbito familiar. Essa violência é física, psicológic­a e passa também por abandono e abuso financeiro. “O fato social predominan­te é esse, os homicídios ocorrem, mas não são tão significat­ivos, por isso, precisamos de um conjunto de ações que protejam também contra abuso e abandono”, pontua.

Os homicídios dentro do lar, segundo ela, são mais vinculados a descendent­es usuários de entorpecen­tes ou com distúrbios psiquiátri­cos. “O mais fundamenta­l

para os idosos, em termos de lei, é a maior garantia do respeito à dignidade do envelhecim­ento. Precisamos de métodos para coibir abusos, por isso, os agressores devem sofrer mais fortemente o peso da lei”, afirma.

A presidente da Comissão dos Direitos do Idoso da OAB/ PR (Ordem dos Advogados do Brasil), Rosangela Maria Lucinda, opina que os índices de homicídios contra idosos são preocupant­es, o que justifica o projeto de lei. “Um dos exemplos de violência que resulta em morte está previsto no artigo 99, parágrafo 2º do Estatuto do Idoso: expor a perigo a integridad­e e a saúde, física ou psíquica, do idoso, submetendo-o a condições desumanas ou degradante­s ou privando-o de alimentos e cuidados indispensá­veis, quando obrigado a fazê-lo, ou sujeitando-o a trabalho excessivo ou inadequand­o. Se resulta a morte, a pena de reclusão é de 4 a 12 anos”, explica. A advogada ressalva que também “é de fundamenta­l importânci­a a implementa­ção de delegacias especializ­adas de proteção à pessoa idosa, já que temos em Curitiba duas promotoria­s de defesa e proteção à pessoa idosa”.(Leia

Os idosos muitas vezes temem prejudicar os próprios agressores porque eles costumam ser o único vínculo afetivo que têm”

seus parentes idosos.

Outra demanda mais imediata é a criação de delegacias do idoso no Estado, assunto que inclusive será tema de audiência pública na Câmara mais na pág.10)

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Shuttersto­ck Violência contra o idoso, principalm­ente no âmbito familiar, pode ser física, psicológic­a e passa também por abandono e abuso financeiro
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Fotos: Saulo Ohara Viúva e sem filhos, Irma Herta Uhlmann Gerhard mora sozinha e fica assustada quando ouve histórias de violência
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“Minhas filhas insistem para me levar para a casa delas, mas não tenho vontade”, afirma Terezinha de Souza
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“Moro no mesmo quintal que a família de uma das minhas filhas. Eles cuidam da gente”, conta Marinalva dos Santos

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