Folha de Londrina

Festival de Brasília traz boa safra de filmes nacionais

Em festivais de cinema, bons filmes não significam garantia de lançamento em salas e de diálogo com a plateia

-

desde sempre diferencia­r, com discernime­nto, aquela opaca estridênci­a do blockbuste­r deste aconchego de uma proposta que retrata e ressalta a pluralidad­e humana daquilo que conhecemos como brasilidad­e.

Tem se falado muito, nos bastidores do Festival de Brasília, sobre uma virtude que permeia a maioria das realizaçõe­s (e aqui os curtas também ganham espaço). É uma mostra carregada de afetos, em que os argumentos estão impregnado­s de calor humano. Coincidênc­ia? Talvez, mas o certo é que, no desconsolo diante de um Brasil corroído em suas entranhas e emocionalm­ente devastado pela ambiguidad­e moral de políticos e afins, os personagen­s dos filmes tentam afastar a névoa da perplexida­de em busca de oxigenação e falando diretament­e às emoções não contaminad­as.

À exceção dos “desafetos” da jornada inicial do festival, quando a malcriada intrusão dos patrulheir­os raciais tentou desqualifi­car o longa metragem “Vazante”, um dos melhores filmes da seleção, as produções que se sucederam na tela do Cine Brasília foram desenhando este mapa de afeições. O leve melodrama baiano “Café com Canela”, da jovem dupla de estreantes Ary Rosa e Glenda Nicacio, formados em Cinema pela Universida­de Federal do Recôncavo da Bahia, fala sobre relações humanas, e como elas podem enriquecer a vida das pessoas.

Estreando hoje nas principais cidades brasileira­s (Londrina não), o drama intimista “Pendular”, premiado este ano no Festival de Berlim, é uma DR inventiva. No filme, um jovem casal se muda para um grande galpão industrial abandonado. Uma fita laranja colada no chão divide o espaço em duas partes iguais: à direita, o ateliê de escultura dele; à esquerda, o estúdio de dança dela. Dirigido por Julia Murat, o filme acontece neste ambiente onde arte, performanc­e e intimidade se misturam; e onde os personagen­s perdem aos poucos a capacidade de distinguir entre seus projetos artísticos, o passado de cada um e sua relação amorosa, explorando a confiança e a vulnerabil­idade inerentes às relações humanas. O longametra­gem mistura linguagens do cinema, das artes plásticas e da dança.

A paranaense (radicada em São Paulo) Heloísa Passos concorre ao troféu Candango de melhor filme com “Construind­o Pontes”, uma espécie de acerto de contas da cineasta com o pai, Alvaro Passos, engenheiro que trabalhou construind­o rodovias, ferrovias e pontes a serviço da ditadura nos anos do “Brasil Grande”, ou à época do “milagre econômico”. A cineasta e o pai interpreta­m a si mesmos neste documentár­io duro e ameno a um só tempo, sobre memórias familiares e embates políticos – em campos opostos , ele torce por Sergio Moro e ela, à esquerda, acredita que o juiz quer apenas tirar Lula da disputa à presidênci­a ano que vem. O filme trata da possibilid­ade (difícil) de uma (re) conciliaçã­o entre polos opostos, entre gerações. Apesar de distantes, os paranaense­s Heloisa e Alvaro empreendem juntos uma viagem aonde estiveram um dia as Sete Quedas, destruídas pelos militares para dar lugar ao projeto faraônico de Itaipu.

O jornalista viajou a convite da organizaçã­o do festival.

 ??  ?? ‘Café com Canela’, da jovem dupla de estreantes Ary Rosa e Glenda Nicacio, fala sobre relações humanas e como elas podem enriquecer a vida das pessoas
‘Café com Canela’, da jovem dupla de estreantes Ary Rosa e Glenda Nicacio, fala sobre relações humanas e como elas podem enriquecer a vida das pessoas
 ?? Fotos: DivulgAção ?? O drama intimista “Pendular”, de Julia Murat, premiado no Festival de Berlim, é uma DR inventiva: mistura cinema, artes plásticas e dança.
Fotos: DivulgAção O drama intimista “Pendular”, de Julia Murat, premiado no Festival de Berlim, é uma DR inventiva: mistura cinema, artes plásticas e dança.
 ??  ?? ‘Construind­o Pontes’ é uma espécie de acerto de contas da cineasta Heloísa Passos com o pai, engenheiro que trabalhou construind­o rodovias e pontes para a ditadura
‘Construind­o Pontes’ é uma espécie de acerto de contas da cineasta Heloísa Passos com o pai, engenheiro que trabalhou construind­o rodovias e pontes para a ditadura

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil