Mais estresse, mais dor de cabeça
Estilo de vida agitado é um potencializador da cefaleia; especialistas defendem abordagem multidisciplinar para diagnóstico e tratamento
Ao mesmo tempo que o ser humano cria ferramentas para facilitar a vida, ele sofre cada vez mais com a falta de tempo. Esse antagonismo é um reflexo da sociedade moderna, que dorme e acorda com um volume ilimitado de informações e vive em estado de ansiedade. Justamente por não ser uma máquina, o corpo humano não consegue suportar uma carga tão alta de estímulos externos e então começa a estressar. A partir daí, tanto a mente quanto o corpo passam a responder a esse estresse por meio de sintomas e doenças. Uma das mais prevalentes é a cefaleia. Segundo a SBCe (Sociedade Brasileira de Cefaleia), cerca de 140 milhões de brasileiros sofrem de dor de cabeça, a sétima doença mais incapacitante do mundo.
Um estudo realizado na Alemanha em 2014 forneceu evidências sobre a associação entre a intensidade do estresse e a frequência de dor de cabeça. Foram entrevistadas 5.159 pessoas com idade entre 21 e 71 anos, durante 24 meses. Do total, 31% sofriam de cefaleia tensional, 14% de enxaqueca, 10,6% relataram os dois tipos de dor de cabeça combinados, 23,6% não tiveram as dores classificadas e 20,8% não tinham dor.
Os níveis de estresse foram mensurados em uma escala de zero a cem e foram cruzados com os episódios de dor de cabeça relatados nas entrevistas. O resultado foi um aumento de dez pontos na escala de estresse, sendo 6% de acréscimo nos episódios de dor entre os que sofriam de cefaleia tensional.
Entre os que se queixaram de enxaqueca, os dez pontos geravam 4,3% mais crises e 4,2% entre os que sentiam os dois tipos de cefaleia. O estudo foi coordenado por Sara H. Schramm, do Hospital Universitário da Universidade de Duisburg-Essen, e considerou ainda o consumo de bebida alcoólica, fumo e uso de remédios para dor de cabeça.
“A correria da vida atual e o aumento do sedentarismo têm influenciado o surgimento e a potencialização de dores de cabeça em toda a sociedade”, comenta o neurocirurgião em Londrina, Carlos Zicarelli, que participou do primeiro simpósio multidisciplinar em cefaleia do País. O evento aconteceu em Londrina, em agosto, e reuniu profissionais da saúde para discutir a importância do diagnóstico e o tratamento envolvendo diferentes áreas, pois a cefaleia é multifatorial. “O intuito é trazer esse conhecimento para que os profissionais possam melhorar o diagnóstico e interagir entre si em prol da melhora do paciente. Praticamente 90% da população mundial, em um período da vida, sofrerão de dor de cabeça”, afirma Suellen Abib, fisioterapeuta em Curitiba e membro do Comitê de Cefaleia da Sbed (Sociedade Brasileira da Dor), que promoveu o simpósio.
DIAGNÓSTICO
O diagnóstico de cefaleia, segundo o neurocirurgião, tende a ser demorado porque as características das dores são semelhantes. Ele cita, por exemplo, que um tumor cerebral ou a abstinência de alguma substância pode ser confundido facilmente com uma enxaqueca. “É preciso colher bem a história clínica do paciente. Você tem que provocá-lo pra responder às perguntas e, ao mesmo tempo, deixá-lo confortável. As características são muito semelhantes entre as cefaleias primárias e secundárias e o diferencial é a história clínica da pessoa”, ressalta.
O anestesiologista em Londrina, Paulo Herrera, especialista em tratamento da dor, conta que é comum os pacientes o procurarem após terem se consultado com pelo menos quatro especialistas e ainda sofrerem com a dor, iniciada, geralmente, entre um e dois anos. “A ideia é ajustarmos e organizarmos a medicação, mas para isso precisamos de um diagnóstico preciso, mesmo para as dores de cabeça primárias, isto é, nos casos de enxaqueca, tensional ou trigêmino-autonômica”, salienta.
O médico Zicarelli explica que as cefaleias primárias, normalmente, são do indivíduo - a pessoa nasce com uma predisposição genética a desenvolver uma dor de cabeça, sem ter um fator ou agressor externo. “É uma doença e a maioria dos indivíduos tem”, aponta.
Já as secundárias podem envolver diversas causas e por isso costumam se apresentar como sintoma de alguma patologia. Uma delas é a cefaleia cervicogênica, desencadeada por problemas cervicais e que vem aumentando entre a população.
Segundo o médico fisiatra no Centro de Dor da Neurologia do HC (Hospital das Clínicas) da USP (Universidade de São Paulo), Diego Toledo, as maneiras de avaliar e tratar a região cervical para melhora das dores de cabeça, também vêm crescendo nos últimos anos.