Obstáculos para a biotecnologia
Comunidade científica tem preocupação sobre como a sociedade receberá novas tecnologias usadas na produção de alimentos
Desde quando a soja RR, da Monsanto, foi aprovada no País pela CTNBio (Comissão Técnica Nacional de Biossegurança), em 1998, o cenário da atuação da biotecnologia e organismos geneticamente modificados no agronegócio passou por uma revolução. A desconfiança - que era marca em relação aos transgênicos naquela época - gradativamente foi dando espaço para o reconhecimento da importância deste tipo de tecnologia para a evolução da produtividade no campo. Hoje, é difícil pensar em em agricultura eficiente sem produtos que envolvam biotecnologia, desde sementes até a ação de defensivos.
A evolução deste trabalho – o próximo passo – é uma tecnologia chamada CRISPR (do inglês Clustered Regularly Interspaced Short Palindromic Repeats), que significa basicamente a edição do próprio genoma da planta ou outro organismo, trocando uma base do nitrogenada na soja, por exemplo, sem precisar transferi-lo, como é o ca- so dos transgênicos.
A comunidade científica está preocupada sobre como a sociedade vai receber esta inovação. É bom lembrar que na época de surgimento dos transgênicos não havia redes sociais como hoje, em que informações de todo tipo são disseminadas, para o bem e para o mal.
Na última semana, foi realizado em São Paulo o I Seminário Internacional Scientific American Brasil – Ciência e Sociedade, com o objetivo de discutir a maior incidência de movimentos anticiência em todo o mundo na sociedade contemporânea, justamente devido a essa pluralidade de vozes. Um cenário que pode atrapalhar o desenvolvimento da biotecnologia no País, não apenas no agro, mas em outros setores, como a saúde, indústria, meio ambiente, etc.
A diretora-executiva do CIB (Conselho de Informações sobre Biotecnologia), Adriana Brondani, conversou com a FOLHA sobre a nova tendência mundial de refutar a ciência e como isso pode atrapalhar o agronegócio. “Temos uma dificuldade de entendimento do papel da ciência pela sociedade e essa descrença (na ciência) ficou ainda mais forte porque várias pessoas estão falando ao mesmo tempo. Houve uma mudança na forma
de comunicação, as ferramentas digitais. E a ciência precisa acompanhar isso para que ela se faça entender. É um novo cenário e precisamos nos inserir nele.”
Brondani relembra dos transgênicos, saindo de um pessimismo, de rejeição, inclusive na agricultura, para uma “percepção mais favorável”. “Não acredito que demoramos para mudar esse cenário pois estávamos falando de uma tecnologia inovadora. É natural que as pessoas tenham dificuldade de entendimento, foi um tempo
importante, inclusive para passar segurança a elas. Hoje temos uma número enorme de empresas ligadas à biotecnologia que mostram ao consumidor sua importância em todas as áreas.”
No caso da CRIPR, a diretora acredita que a sociedade, mesmo com essa pluralidade, pode absorvê-la de forma mais tranquila, até pelo histórico dos transgênicos. “É claro que a informação precisa ser contínua, mas como já existe um histórico de inovação oriunda da biotecnologia, isso fica mais fácil. Temos cases de sucesso ao longo desses 20 anos de evolução. Já se mostrou segurança e o que aconteceu com a produção agrícola faz com que as pessoas fiquem muito mais familiarizadas com tudo isso.”
Temos uma dificuldade de entendimento do papel da ciência pela sociedade”