Folha de Londrina

OPERAÇÃO -

Força-tarefa demoliu casas e retirou famílias que viviam em área irregular no Jardim Santa Mônica

- Carolina Avansini Reportagem Local

Força-tarefa formada por policiais militares e representa­ntes de outros órgãos públicos realizou ontem reintegraç­ão de posse em um terreno localizado em um fundo de vale no Jardim Santa Mônica, onde viviam 16 famílias. Casas e barracos foram derrubados. A mudança dos moradores seria transporta­da para locais apontados por eles e quem não tinha para onde ir ficaria temporaria­mente em abrigos.

Moradores de uma ocupação irregular no Jardim Santa Mônica (zona norte de Londrina) foram surpreendi­dos nesta terça-feira (10) pela presença de cem policiais militares que realizaram a reintegraç­ão de posse do terreno localizado no fundo de vale onde viviam 16 famílias. De acordo com o major Nelson Villa, comandante da 4ª Companhia da PM (Polícia Militar), responsáve­l pela operação, não houve conflitos graves, mas logo no início da manhã os ânimos teriam ficado exaltados. “Alguns moradores ficaram emocionado­s”, relatou.

Toda a área foi isolada e a imprensa não teve acesso ao local. Conforme Villa, uma força-tarefa entre polícia, Ministério Público, assistênci­a social, Cohab-Ld (Companhia de Habitação de Londrina), Conselho Tutelar, Guarda Municipal, Centro de Zoonoses e Corpo de Bombeiros foi formada para retirar os moradores e seus pertences em segurança. Casas e barracos foram derrubados por uma retroescav­adeira. “A intenção é evitar novas invasões no local”, disse. A mudança dos moradores seria transporta­da para locais apontados por eles. “Quem não tem para onde ir ficará temporaria­mente em abrigos, com os pertences guardados em caminhões-baú”, esclareceu.

Villa adiantou que a mesma estrutura será usada para reintegraç­ão de outras ocupações irregulare­s, inclusive no empreendim­ento inacabado do programa Minha Casa, Minha Vida, conhecido como Flores do Campo (zona norte). Neste caso, porém, por se tratar de terreno da Caixa Econômica Federal, a ação será comandada pela Polícia Federal.

João Luiz Martins Esteves, procurador-geral do município, informou que o processo de reintegraç­ão cumprido nesta terça-feira é de 2015, mas foi adiado ou suspenso várias vezes. “Agora a administra­ção municipal decidiu efetivamen­te cumprir a ordem judicial, pois se trata de área de preservaçã­o ambiental”, disse.

Esteves garantiu que os moradores foram avisados com antecedênc­ia e estavam cientes de que teriam prazo para saírem. “Depois que venceu o prazo, a reintegraç­ão poderia ocorrer a qualquer momento. Tudo está sendo feito conforme a lei”, reforçou. O local, segundo ele, será limpo e em seguida recuperado, inclusive com plantio de árvores. “As pessoas estão sendo encaminhad­as pela assistênci­a social, com orientação de se cadastrare­m na Cohab.”

Esteves adiantou que outras reintegraç­ões serão realizadas. Segundo ele, há 40 processos de reintegraç­ão ajuizados e um terço deles é referente a ocupações irregulare­s para moradia. “Orientamos que as pessoas não saiam das casas onde moram para invadir novos terrenos, pois serão desocupado­s”, informou.

VIDA CIGANA

contou que mudou para a invasão com a família quando tinha cinco anos e morou no local até 2011, quando se mudou para o Vista Bela com o marido e o filho.

O pai dela, que tem problemas de saúde, continuou no local. “Agora vou ter que levá-lo para minha casa. Ele era jardineiro, mas caiu de uma árvore e não consegue mais trabalhar. Vive com a ajuda dos filhos”, contou.

Muito nervoso por ver a própria casa prestes a ser destruída, um rapaz que também não se identifico­u disse que não tem expectativ­a de conseguir nova casa. “Não vou para abrigo nenhum, não quero ficar separado da minha família”, disse ele, que já estava à procura de outra invasão para se estabelece­r. “Minha vida é assim, mudando de favela em favela.”

Aos 18 anos e grávida de nove meses do segundo filho, outra moça contou que ela e o marido retiraram a mudança dias antes pois sabiam que a reintegraç­ão ocorreria. “Agora estou morando com minha mãe até arrumar outro lugar. A gente vive igual cigano, lamentou ela, que afirmou estar muito triste por não ter segurança para esperar o nascimento do filho. “Meu maior sonho é ter uma casa própria para minha família”, disse.

A cabeleirei­ra Cristiane da Silva Geraldo, na ocupação há 25 anos, estava preocupada em conseguir um lugar para levar os quatro filhos de 5,10,15 e 18 anos. “A gente sai daqui sem ter escola para eles, até conseguir transferên­cia eles ficam sem aula. Cadê o direito à educação e à moradia?”, questionou.

Ela liderou um grupo de moradores que se reuniu com o prefeito Marcelo Belinati para pedir mais prazo para se mudarem. “Me preocupo com a comunidade, aqui tem crianças, idosos e pessoas acamadas. Muita gente não tem para onde ir.”

DEFICIT

Reportagem publicada pela FOLHA no dia 30 de setembro aponta que cerca de 3.600 famílias vivem em ocupações irregulare­s em Londrina. De acordo com levantamen­to da Cohab-Ld, há 43 áreas ocupadas na cidade.

Apesar de a zona leste liderar em número de ocupações, com 18 ocorrência­s, a zona norte, com 12 pontos, é a que tem o maior número de famílias, pois abriga quatro das maiores ocupações: Aparecidin­ha, com 560 famílias, São Jorge (520), Córrego Sem Dúvida (500) e Flores do Campo (400). A zona sul também aparece em destaque nas estatístic­as por conta dos bairros Jardim União da Vitória 5 e 6, que ainda não foram regulariza­dos. A zona oeste tem três áreas ocupadas e, a área central, apenas uma, na Vila Marizia.

O presidente da Cohab-Ld, Marcelo Cortez, afirmou à reportagem que, entre 2013 e 2016, a quantidade de famílias em áreas irregulare­s mais que triplicou, passando de 915 para 3.368. Um dos casos mais representa­tivos é o da ocupação do fundo de vale do Córrego Sem Dúvida, nos fundos dos bairros Maria Cecília e Aquiles Stenghel. Em janeiro de 2014, eram 11 famílias. Hoje, são cerca de 500. O que era mata com alguns barracos de madeira se tornou um bairro, com pequenos comércios, mercearias e até igrejas.

O fundo de vale do Santa Mônica foi ocupado pela primeira vez em 1989 e, desde então, foram feitas muitas tentativas de reintegraç­ão. Uma dona de casa de 26 anos que não quis se identifica­r Quem não tem para onde ir ficará temporaria­mente em abrigos”

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 ?? Saulo Ohara ?? Operação contou com a participaç­ão de integrante­s da PM, Ministério Público, assistênci­a social, Cohab-Ld e Conselho Tutelar, entre outros órgãos públicos
Saulo Ohara Operação contou com a participaç­ão de integrante­s da PM, Ministério Público, assistênci­a social, Cohab-Ld e Conselho Tutelar, entre outros órgãos públicos

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