Devotos enfrentam calor e cansaço para pagar promessas
Cerca de 200 mil pessoas visitaram o Santuário Nacional de Aparecida; mensagem do papa foi transmitida durante missa
Aparecida -
Todos os anos, Nelson Martins, 63, carrega sua cruz. Desta vez, ele saiu de sua casa em Santa Branca a pé, sandálias nos pés e uma mochila pequena nas costas, na segunda (9). Nesta quinta (12), estava a 7 km de seu destino, Aparecida, quando a reportagem o encontrou na via Dutra. “Já escapei de muito na vida, Nossa Senhora já salvou minha vida”, ele dizia, desacelerando o passo, arrastando a cruz de 1,80 metro nos ombros. Explicava que o esforço, repetido anualmente há mais de uma década, não agradecia nenhuma graça específica nem pedia nada especial à Santa. Ele conta que o pai reapareceu depois de sua primeira romaria, em 2007. Estava havia 20 anos desaparecido.
Como Martins, a reportagem encontrou peregrinos que vêm a Aparecida anualmente, para agradecer “por tudo”. Ninguém com quem a reportagem conversou era devoto de primeira viagem.
A organização do Santuário Nacional esperava 200 mil pessoas para este 12 de outubro, celebração do Jubileu de 300 Anos de Nossa Senhora Aparecida. Em 2016, durante todo o dia, foram 140 mil.
Além de cruzes, romeiros carregam consigo ofertas de toda sorte a Aparecida: imagens da Santa, roupas, miniaturas de carro, réplicas de parte do corpo humano.
Os devotos chegavam de toda forma à cidade religiosa: descalços, de sandálias crocs. Havia também quem viesse de bicicleta. “É muita fé!”, berrava um ciclista sorridente de braços abertos, levando no peito uma estampa da santa, ao cruzar a ponte que conduz até a entrada principal da cidade.
Em comum, todos os fiéis aparentam um cansaço extremo, mas menor que a devoção. Perto das 7h30, igreja lotada, um padre celebrava uma das primeiras missas do dia e puxou o cântico: “Mãezinha do céu, eu não sei rezar...”. Sentados nos bancos, deitados chão, encostados nas colunas, ainda havia fôlego para cantar a uma só voz: “Eu só sei dizer, eu quero te amar”.
Fora do templo, havia filas por todos os lugares. Era preciso esperar para comprar velas, para acendê-las, para ver a imagem de Aparecida de perto (pela manhã, levavase no mínimo três horas) e para comer.
POLÍTICOS E PAPA
Ausência de políticos foi sentida em Aparecida. A organização convidou autoridades, incluindo o presidente Michel Temer (PMDB) - que gravou um vídeo lembrando a data e enviou o ministrochefe da Secretaria de Governo, Antonio Imbassahy (PS- DB), para representá-lo. “Se eu fosse presidente do Brasil, eu viria, não é?”, disse o reitor do Santuário Nacional, padre João Batista, a jornalistas, após a missa campal. “Eu acho que é uma questão até de assessoria. Vai ver os assessores não atentaram pra isso. Olha, é a padroeira do Brasil. É algo importante. Mas a gente respeita”, afirmou.
Batista citou como exceção o governador Geraldo Alckmin (PSDB), declaradamente católico, que disse frequentar Aparecida desde quando era prefeito da vizinha Pindamonhangaba. As autoridades foram vaiadas brevemente pelos fiéis, quando foram anunciadas no início da cerimônia. “Não ouvi vaia nenhuma”, respondeu Alckmin, quando questionado sobre a manifestação do público.
Além de autoridades políticas, faltou o papa Francisco na celebração. Em 2013, quando esteve em Aparecida, ele prometeu que viria para os 300 anos da padroeira. Em vídeo, ele falou que o brasileiro precisa ter fé contra a corrupção. “Não se deixem vencer pelo desânimo”, disse o papa, que repetiu a frase: “Não se deixem vencer pelo desânimo. Confiem em Deus.” “O Brasil hoje necessita de homens e mulheres cheios de esperança e firmes na fé, que deem testemunho de que o amor manifestado na solenidade e na partilha é mais forte e luminoso que as trevas do egoísmo e da corrupção”, disse.
O Brasil hoje necessita de homens e mulheres cheios de esperança e firmes na fé”