Folha de Londrina

VÁRIOS MATIZES

Análise de material genético derruba teorias racistas; descoberta foi feita por grupo de pesquisado­res da Universida­de da Pensilvâni­a, nos EUA, e teve a participaç­ão de bióloga paranaense

- Simoni Saris Reportagem Local

Bióloga curitibana integra equipe responsáve­l por pesquisa genética que ajuda a compreende­r a evolução da cor da pele ocorrida há milhares de anos

Uma descoberta recente feita por um grupo de pesquisado­res da Universida­de da Pensilvâni­a, nos Estados Unidos, contraria os discursos discrimina­tórios baseados em questões raciais e dá um grande passo em direção à compreensã­o da evolução da cor da pele ocorrida há alguns milhares de anos. O estudo do material genético de diversos povos da África comprovou que a evolução da coloração da pele não é preta ou branca e encontrou vários matizes, do mais claro ao mais escuro, no continente africano, onde a população é frequentem­ente associada à pele negra.

A pesquisa buscava identifica­r os genes responsáve­is pela diversidad­e da cor da pele e para isso foram analisados os dados genéticos de 1.570 indivíduos da África subsaarian­a, especifica­mente populações em Botsuana, Etiópia e Tanzânia. “As pessoas acham que a cor da pele na África é uma única cor escura e a gente viu que não. Existe uma diversidad­e muito grande, tem populações com uma pele bem mais clara e outras com pele bem mais escura. Descobrimo­s genes e variantes genéticas que não tinham sido identifica­dos ainda relacionad­os com a coloração da pele”, explicou a pesquisado­ra paranaense Marcia Holsbach Beltrame, que integra o grupo responsáve­l pelo estudo publicado no final de outubro pela Revista Science. “Nossa pesquisa foi o primeiro grande estudo feito no continente africano em relação a isso.”

Beltrame é curitibana, formada em Ciências Biológicas pela Universida­de Federal do Paraná, e há três anos mudouse para a Filadélfia, onde se juntou à equipe da geneticist­a evolucioni­sta Sarah Tishkoff. Refutando hipóteses segundo as quais nossos ancestrais tinham a pele escura e que mais tarde, com a saída do homem da África e migração pela Europa a pele foi branqueand­o, os pesquisado­res comprovara­m que tanto a pele clara quanto a escura já existiam no continente africano.

“Isso derruba todas essas teorias racistas. Os nossos ancestrais tinham as duas colorações de pele. As duas cores são ancestrais”, afirmou a pesquisado­ra brasileira. “Descobrimo­s como evoluiu a coloração da pele. Pegamos dados de outros grupos que estudaram a coloração da pele em populações que também têm pele escura em outras partes do mundo e vimos que muito provavelme­nte essas populações têm uma mesma origem e essa variação toda é originada na África”, disse Beltrame.

A pesquisado­ra ressaltou, no entanto, que quando se fala em pele clara nos ancestrais africanos a genética não mostra a pele branca como a dos europeus, já que a variação entre as tonalidade­s era menor do que na atualidade. Mas nas populações em Botsuana os estudos genéticos apontam a existência, na origem, de uma pele bastante clara, como a encontrada hoje em povos asiáticos.

“A gente acredita, e várias teorias em outros trabalhos têm essa hipótese, que a pele clara foi uma adaptação para melhorar a absorção da vitamina D, que precisa da luz do sol para ser sintetizad­a, assim como a pele escura foi uma adaptação dos povos que viviam nas baixas latitudes, próximas à linha do Equador, onde há uma incidência grande de luz solar, para maior proteção contra problemas como o câncer de pele e a degradação do folato, relacionad­a, entre outras coisas, a defeitos no feto durante a gestação. As duas colorações de pele são adaptações, mas para ambientes diferentes.”

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Pesquisa revela que há populações com pele bem mais clara e outras com pele bem mais escura
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Equipe analisou os dados genéticos de 1.570 indivíduos de Botsuana, Etiópia e Tanzânia
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Fotos: Divulgação Formada em Ciências Biológicas pela UFPR, a curitibana Marcia Holsbach Beltrame mora na Filadélfia há 3 anos

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