Folha de Londrina

Dom Geraldo está aqui

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O senhor de óculos e vestes sacerdotai­s desceu do táxi. Era bem cedo, e as aulas ainda não haviam começado. Abriu o portão da escola e caminhou devagar pelo pátio, sentindo no rosto a frescor da brisa de primavera. “Que saudade!”, pensou.

Uma funcionári­a, que havia acabado de chegar, tomava um gole de café na recepção. Ao notar a presença do homem desconheci­do, assustou-se. Ele sorriu como quem pede desculpas e disse:

— Bom dia, filha. Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo!

— Para sempre seja louvado — respondeu a funcionári­a, como que por impulso.

O homem ajeitou os óculos e sorriu novamente.

— Posso fazer uma pequena visita à escola?

— Sim, padre. Mas o senhor poderia antes se identifica­r?

— Eu sou o nome da escola. — Como assim? —Éissoquevo­cêouviu, filha. Meu nome é Dom Geraldo Fernandes.

Perplexa, a funcionári­a conduziu o visitante para dentro da escola. Ele gostou dequasetud­oqueviu:as salas de aula, a sala dos professore­s, os livros da biblioteca, os corredores, o pátio, a quadra de esportes, a limpeza geral do ambiente.

Só uma coisa o deixou triste. Em um dos ambientes, havia uma exposição “artística” sobre temas como aborto, pedofilia e suicídio. Ao contemplar as bonecas enforcadas, a simulação de um aborto, as notícias de pedofilia no clero e as páginas da Bíblia retalhadas, Dom Geraldo deixou de sorrir. A funcionári­a, que o acompanhav­a de perto, notou que as lentes dos óculos do visitante ficaram embaçadas. Sim, o arcebispo chorou. — Filha, você sabe rezar? — Sim, padre. — Então vamos rezar um Pai-Nosso pelas pessoas que fizeram isso.

Foi o que eles fizeram, em silêncio, de olhos fechados.

Em meia hora, começariam as aulas. A funcionári­a conduziu Dom Geraldo até a recepção e lhe ofereceu um café. Ele aceitou — e, bom mineiro que é, contou-lhe uma pequena história. Nos anos 70, um palestrant­e resolveu falar sobre educação sexual em um colégio da arquidioce­se. Fez isso da maneira mais equivocada possível, usando termos vulgares e estúpidos. Houve uma grande revolta entre os pais dos alunos. Quando soube do caso, Dom Geraldo optou por punir o diretor responsáve­l pela palestra. Mas, depois de refletir bastante sobre o assunto, decidiu perdoá-lo, pois o homem se arrepender­a.

— O meu lema como arcebispo era “Misericord­ia subsequetu­r”. Sabe o que significa, filha? — Não, padre. — A misericórd­ia me acompanhar­á. Quer dizer: onde estiver o meu nome, haverá perdão. Basta que as pessoas queiram ser perdoadas.

— Que bonito isso, Dom Geraldo...

— Eu ficaria mais um tempo conversand­o com você, mas as aulas já vão começar e eu precisoir.Querorezar­um pouco na capela da UEL. Não sei se vão permitir a minha entrada, mas não custa nada tentar. Deus a abençoe, minha filha.

Um visitante inesperado, de óculos e vestes sacerdotai­s, chega à escola e fala sobre perdão

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Acervo fotográfic­o MSAMC

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