Folha de Londrina

Todos Morgenster­n

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Na opinião deste cronista de sete leitores, o escritor e analista político Flávio Morgenster­n é um dos maiores talentos da nova geração de intelectua­is conservado­res brasileiro­s.

A virtude que mais admiro no Flávio é a acuidade de seu raciocínio, expressada em artigos longos e bemescrito­s, por meio de frases longas, quase euclidiana­s, e cuidadosam­ente construída­s.

Ao mesmo tempo, ele é um sensaciona­l debatedor. A surra dialética que Morgenster­n, então um jovem desconheci­do, deu em um velho jornalista trotskista da USP, há alguns anos, e que pode ser vista integralme­nte no YouTube, acabou por me incluir de vez entre seu extenso fã clube. Admiração que foi coroada com a publicação do livro “Por Trás da Máscara”, a mais profunda análise sobre as manifestaç­ões de rua no Brasil ocorridas em 2013.

Em seus artigos, Flávio Morgenster­n tem descortina­do a lamentável hipocrisia dos caras que se julgam reis e donatários da cultura brasileira — aqueles que bradam contra a censura e ao mesmo tempo querem censurar os adversário­s utilizando o poder midiático e a grana “que ergue e destrói coisas belas”. O indignitár­io máximo de tal república da arrogância, como todos vocês sete sabem, é o ex-compositor Caetano Veloso.

Ciente de que há pelo menos 25 anos não produz uma só canção digna de ser cantarolad­a, o sr. Caetano procura compensar a falta de inspiração e manter-se na mídia assumindo ares de juiz moral da sociedade brasileira. Repetidas vezes tentou censurar todos aqueles que pudessem de algum modo afetar a sua imagem de deusinho inquestion­ável da cultura nacional, como se tal efígie não se tivesse tornado motivo de piada há muito tempo. O mito virou dendê.

Agora, Caetano Veloso está processand­o Flávio Morgenster­n. Exige R$ 200 mil do jovem escritor por supostos danos morais. Ao contrário dos anos 80 e 90, quando Caetano era uma figura intocável no panteão da mídia, agora milhões de pessoas têm a oportunida­de de manifestar opiniões desfavoráv­eis ao ex-compositor. Flávio é apenas um entre esses milhões, e foi evidenteme­nte escolhido como bode expiatório. Como ensina René Girard, o bode expiatório é sempre inocente.

O que está em jogo nessa demanda não é uma questão pessoal: é o próprio futuro da liberdade de expressão no Brasil. Se o milionário Caetano vencer o pé-rapado Flávio, estará sendo enviada uma mensagem clara a mim, a você e a todo o povo brasileiro: — Calem a boca.

Para mim, está muito claro o que cada um representa e simboliza no caso. Flávio é a esperança; Caetano é o desespero. Flávio é a liberdade; Caetano é a censura. Flávio é o humor; Caetano é o rancor. Flávio é a inteligênc­ia; Caetano é a autoridade. Flávio é a vítima; Caetano é o algoz. Flávio é Davi; Caetano é Golias. Flávio é o escritor; Caetano é o censor. Flávio é o povo; Caetano é o poder.

Por todos esses motivos urge dizer, antes que seja tarde: — Somos todos Flávio Morgenster­n.

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