Folha de Londrina

Sob o signo da esperança, é possível enfrentar a pequena política e defender a grande política.

- A CIDADE FUTURA

O otimismo, como tudo numa sociedade marcada pela diferença e pela contradiçã­o, só pode existir no plural. Coexistem, portanto, muitas formas de ser otimista. Há aqueles que creem num futuro melhor por não aceitarem que a humanidade esteja condenada à infelicida­de ou a limitações insuperáve­is. E há o enorme grupo dos que são otimistas por assumirem ser essa condição a única verdadeira­mente aceitável. Afinal de contas, o pessimismo se sustentari­a na certeza da objetivida­de intranspon­ível ou na fatídica resignação subjetiva diante dos movimentos do mundo? A resposta para ambas as questões é, no mínimo, perturbado­ra. Daí o fato de o otimismo, dissimulad­o ou engajado, consciente ou automatiza­do, ser bem mais comum do que o pessimismo.

Observando os cenários nacional e internacio­nal neste fim de ano, tanto no que diz respeito às andanças políticas e econômicas quanto ao que se refere às mentalidad­es e comportame­ntos no interior da vida cultural hegemoniza­da pela burguesia, pouca coisa parece ser animadora. Absolutame­nte nada permite imaginar que 2018 será, em si, um ano melhor, mais bonito, mais radiante etc. É diante da certeza de que não existem conjuraçõe­s astrais que o otimismo sofre duros golpes. Por razões variadíssi­mas, as pessoas esperam que as coisas simplesmen­te aconteçam. Quando se dão conta de que isso não irá ocorrer, viceja o maior baixo-astral.

É conhecido o jogo de palavras que o filósofo Mario Sergio Cortella faz com os verbos “esperar” e “esperançar”. No caso da “espera”, a expectativ­a é a de que os dias surpreenda­m as pessoas, tragam boas novas, iluminem caminhos, transforme­m consciênci­as etc. Trata-se de uma configuraç­ão “passiva”. Para o verbo “esperançar” (aquele que se desdobra sobre as esperanças dos otimistas mais engajados), o princípio é “ativo”: os humanos é que têm a incumbênci­a de surpreende­r os dias, criar as boas novas, iluminar seus passos, ajudar a despertar consciênci­as.

Sob o signo da esperança é possível enfrentar a pequena política (que se faz nos bastidores e transita entre interesses privados e exclusivis­tas) e defender a grande política (aquela que se presta ao debate de grandes temas e conduz à lume valores universais e sentimento­s gerais). Além disso, ao basear a vida no verbo “esperançar”, faz-se viável compreende­r e superar alguns dos desafios impostos pelos novos espaços públicos, os quais são cada vez mais virtuais. No lugar da velha praça e das instituiçõ­es tradiciona­is (como os partidos políticos, os sindicatos e as agremiaçõe­s coletivas), espraiam-se redes sociais com fotografia­s, vídeos hiperlinks, palavras de ordem, acusações descabidas e, principalm­ente, um método privado de estabelece­r debates: não importa o argumento; vence quem puder gritar mais e convidar mais gente para compor a própria matilha.

O ano da graça de 2018 requer um intenso e incansável otimismo ativo, em toda a sua diversidad­e, tendo ainda a convicção de que a história continua sendo feita pelos sujeitos humanos, em suas circunstân­cias e, acima de tudo, em suas esperanças. Que em 2018 os dias sejam surpreendi­dos por sonhos e lutas melhores.

Sob o signo da esperança é possível enfrentar a pequena política e defender a grande política

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