Folha de Londrina

Precisamos lembrar que a cada ponto de nossa vida podemos estar dizendo um adeus

- por Paulo Briguet

Madre Leônia viu Dedé chorando perto do santuário. A moça estava inconsoláv­el. Havia ido passar o Natal com os familiares na pequena e distante Tangará da Serra, Mato Grosso. Na época, a cidadezinh­a não tinha asfalto nem telefone. Quando Dedé chegou à casa da família, recebeu uma notícia devastador­a: a mãe havia morrido dois dias antes, vítima de tétano, com apenas 45 anos, e já estava enterrada. De volta a Londrina, Dedé não conseguia parar de chorar.

Foi nesse momento que Madre Leônia se aproximou. A serva de Deus pôs-se a dizer palavras doces como Dedé jamais ouvira. “Ela me falou coisas tão lindas. Parecia conhecer minha mãe. As palavras dela foram tão profundas que curaram a dor do meu coração. Era o próprio Deus, falando através da madre”, dizia Dedé.

Madre Leônia partiria alguns anos depois, em 1980. Neste final de semana foi a vez de Dedé. Maria José Sonego Faquete morreu aos 69 anos, depois de uma longa e corajosa guerra contra o câncer. Era uma personagem muito estimada na região do Santuário Eucarístic­o Mariano, onde descansa o corpo da serva de Deus Madre Leônia Milito, a futura santa de Londrina.

Dedé era costureira de grande talento; entre seus “fregueses” amigos, estava o saudoso Dom Albano Cavallin, ex-arcebispo de Londrina, de quem ela fazia as vestes eclesiais. Com sua habilidade no corte e costura, participou de momentos inesquecív­eis de inúmeras pessoas, criando vestidos de noivas e roupas de batismo. Era mais que um ofício, era uma arte.

A jovem que Madre Leônia consolou naquele dia também se tornaria uma figura de presença marcante na comunidade católica, especialme­nte na Paróquia São Vicente de Paulo, da qual era pioneira. Ali atuou como catequista e ministra da Eucaristia por muitos anos, além de fundar o grupo de jovens hoje conhecido pelo nome de Sedecias.

Segundo uma antiga lenda, havia em Alexandria um sapateiro que costumava dizer, a cada ponto que dava nos calçados: “Salvai uma alma, Senhor!” Algo muito semelhante faziam as irmãs pioneiras do Colégio Mãe de Deus, quando costuravam os uniformes das alunas. Tenho certeza de que a Dedé também ocorriam pensamento­s dessa natureza quando exercia seu ofício. Ela era, portanto, uma costureira de Deus.

“Só Deus é quem sabe todo o risco do bordado”, diz uma personagem do escritor mineiro Autran Dourado, em um livro inesquecív­el. Não estamos capacitado­s a conhecer agora todos os planos de Deus para nossa eternidade. Por isso, precisamos lembrar que a cada ponto de nossa vida, de nosso cotidiano, de nosso trabalho, de nossa luta — podemos estar dizendo um adeus.

Agora é a hora, Dedé. Você, que ajudou a tecer o manto sobre tantas pessoas, vai dar um abraço em sua mãe e na Madre Leônia, que lhe esperam na Casa eterna.

Não se esqueça: cada ponto de nossa vida pode ser uma despedida

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