Corte afrouxa combate ao trabalho escravo
Combinação entre redução do orçamento e deficit de auditores aumenta o desafio das ações de fiscalização. Número de operações destinadas a coibir situações de trabalho análogo à escravidão ou em condições degradantes caiu 11% no País, conforme relatório p
No Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo, celebrado neste domingo (28), há pouco o que se comemorar. Isso porque o número de operações contra o trabalho escravo no País diminuiu 11,1% em 2017 em comparação com o ano anterior. De acordo com dados da Detrae (Divisão de Fiscalização para Erradicação do Trabalho Escravo) do Ministério do Trabalho, o volume de 207 ações realizadas em 2016 caiu para 184 no ano passado. Os números são parciais, pois o relatório final será concluído nos próximos meses.
Dois fatores influenciam diretamente a queda nas fiscalizações. O primeiro é um contingenciamento de verbas do governo federal para a atividade que chega a 70%. Além disso, o Ministério do Trabalho tem que lidar com um deficit de cerca de mil auditores fiscais. A queda nas operações reflete na prevenção, inspeção e assistência às vítimas de trabalho forçado e degradante País afora. O auditor fiscal do trabalho Maurício Fagundes, chefe da Detrae afirma que o número de fiscalizações foi muito abaixo do esperado. “As superintendências que estavam executando o planejamento de forma regular não tinham mais recursos para fazer qualquer tipo de operação a partir de abril do ano passado”, revela.
Ele explica que o contingenciamento do governo federal afetou de forma direta a SIT (Secretaria de Inspeção do Trabalho), com um corte de cerca de 70% na verba. A assessoria de comunicação do Ministério do Trabalho informou que o contingenciamento se deu pelo Decreto 9.018/2017, atingindo o orçamento de toda a União. No ano passado, com o corte na pasta, a SIT recebeu R$ 10 milhões, mas segundo o órgão, em setembro do mesmo ano houve uma expansão no limite orçamentário da SIT, passando a ser de R$ 15 milhões. O órgão ainda destaca que “mesmo com contingenciamento ocorrido no ano de 2017, o Ministério manteve as quatro equipes de fiscalização móvel em funcionamento, direcionando recursos de outras dotações para manter todas as ações programadas, sendo que foram realizadas em média, quatro ações por mês pelo grupo.”
Fagundes também comentou sobre a falta de servidores para conferir as denúncias de trabalho escravo. “Temos o menor número nos últimos 20 anos. Já chegamos a ter 3.600 profissionais, mas agora estamos com pouco mais de 2.000”, detalha. O delegado sindical do Sinait (Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho) no Paraná, Nailor Grossel, confirma a situação. “Além do déficit de pessoal, os valores das diárias de hoje são inviáveis. Em determinados locais não dá nem para pagar um hotel, então tem muitos profissionais indo às fiscalizações por amor à camisa”, comenta.
O Ministério informou ainda que tem solicitado ao Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão autorização para realização de concurso público para preenchimento de 1.190 vagas do cargo de auditor fiscal e com isso suprir a redução no quadro de auditores. Segundo a pasta, o pedido continua em análise para a realização do certame.
À Agência Brasil, a procuradora Catarina Von Zuben, coordenadora nacional de Erradicação e combate ao Trabalho Escravo do MPT (Ministério Público do Trabalho), destacou que “o número de ações e de resgate de trabalhadores vem caindo ano após ano. Não porque a submissão das pessoas à condições degradantes com o cerceamento da liberdade e outras práticas criminosas está diminuindo, mas sim porque a estrutura de fiscalização e combate está sendo desmantelada.”
As 184 operações em 2017 resultaram no resgate de 407 trabalhadores submetidos a situações como: trabalho forçado; jornada exaustiva; condição degradante de trabalho; restrição, por qualquer meio, de locomoção em razão de dívida contraí-
da com empregador ou preposto, no momento da contratação ou no curso do contrato de trabalho; retenção no local de trabalho em razão de cerceamento do uso de qualquer meio de transporte; manutenção de vigilância ostensiva e apoderamento de documentos ou objetos pessoais.
Os dados do Ministério mostram ainda que a prática do trabalho escravo foi encontrada tanto no ambiente rural quanto no ambiente urbano. Do total de trabalhadores regatados, 107 se encontravam em regiões metropolitanas, com maior incidência no setor de construção civil e na atividade têxtil. Já no ambiente rural, os setores que apresentam maior número de trabalhadores resgatados foram agricultura, pecuária e produção florestal.