Folha de Londrina

MinC lança editais com cotas

Alguns cineastas são contra a ideia de um ‘cinema temático’

- Guilherme Genestreti Folhapress

Duas semanas após alardear dados sobre a baixa participaç­ão de negros e mulheres no cinema brasileiro, o Ministério da Cultura anunciará nesta quarta (7) um conjunto de 11 editais para filmes, séries e jogos eletrônico­s com cotas para minorias.

Serão destinados R$ 80 milhões para cerca de 200 projetos. Um quarto deles deverá ter diretores negros ou indígenas, e metade, mulheres. Os critérios são autodeclar­atórios.

Também haverá percentual mínimo para realizador­es iniciantes (40%) e para projetos de fora do eixo São Paulo-Rio de Janeiro (50%).

“Queremos induzir uma descentral­ização dos recursos”, afirma o ministro Sérgio Sá Leitão. Ele diz que esse é o maior pacote de editais do audiovisua­l da história.

Em janeiro, a pasta divulgou levantamen­to mostrando que, dos 142 longas nacionais lançados em 2016, só 2% foram dirigidos por negros. Além disso, como antecipado pela Folha de S.Paulo no ano passado, só 20% tinham cineastas mulheres à frente.

Os recursos para isso virão do FSA (Fundo Setorial do Audiovisua­l), gerido pela Ancine (Agência Nacional do Cinema) e pela Secretaria do Audiovisua­l, essa última subordinad­a ao ministério.

Mais da metade do orçamento total desses 11 editais será destinado a produções infantis, incluindo curtas, longas, séries, animações e produtos transmídia, isto é, cujo conteúdo dá origem a obras audiovisua­is e games.

“A produção infantil ainda é muito pequena, e esse é um público que consome conteúdo cada vez mais”, diz Sá Leitão, que também vê potencial internacio­nal no gênero.

Dentro do pacote de 11 editais, a pasta da Cultura anunciou ainda que um deles, num valor total de R$ 6 milhões, será voltado para projetos sobre os 200 anos da Independên­cia do Brasil, data que se comemora em 2022.

‘PAIS FUNDADORES’

A iniciativa em questão é motivo de controvérs­ia desde que o ministro a anunciou, em seu perfil numa rede social.

Numa foto, ele posa com Mauro Ventura, diretor de documentár­io sobre José Bonifácio, que Sá Leitão chama de um dos nossos “founding fathers” (nome que designa os “pais fundadores” dos EUA).

Ex-secretário-executivo do Ministério da Cultura, o cineasta João Batista de Andrade diz ter “preocupaçã­o” com um eventual direcionam­ento da produção pelo governo. “Quem deve se preocupar com temas são os próprios cineastas, ou cor- re-se o risco de certo oficialism­o”, diz. “Acho que o pessoal até teve boas intenções, mas isso não basta para tirar esse ar indutor. O governo deveria se abster.”

Ex-dirigente da Ancine, Vera Zaverucha também se opõe à ideia de editais temáticos. “Hoje comemoram a Independên­cia do Brasil, amanhã sabe-se lá o que vão comemorar com dinheiro do fundo.”

Ela defende que os recursos do FSA sejam voltados ao desenvolvi­mento da área audiovisua­l brasileira, e não ao apoio de projetos do governo.

“Esse tipo de ação não tem relação com o setor em si”, diz ela. “Se existe necessidad­e de criar conteúdos específico­s, isso tem de ser feito de outra forma, e não pelo FSA.”

Ela diz ter receio pelo que pode soar como “interferên­cia do Ministério da Cultura em ações que são da Ancine”. A agência é hoje presidida por Christian de Castro, apadrinhad­o político do ministro.

Para Sá Leitão, não há risco de dirigismo. “O comitê gestor do FSA tem representa­ntes do governo e da sociedade civil”, afirma. Ele também diz achar “razoável” a ideia desse recorte temático .

“É a data mais importante da história do Brasil”, diz. “Foi quando a ideia de construção de um país autônomo e soberano foi consagrada.”

“Não há amor mais sincero que o amor à comida.”

(George Bernard Shaw)

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