Folha de Londrina

ANCESTRAIS

Museu de História Natural do Reino Unido se baseou em análise de DNA do mais antigo esqueleto humano encontrado na ilha

- Fábio de Castro Agência Estado

Primeiros habitantes da Grã-Bretanha, que viveram há cerca de 10 mil anos, tinham a pele negra e olhos azuis. Descoberta é baseada na análise do DNA do fóssil do Homem de Cheddar, mais antigo esqueleto humano já encontrado na ilha

São Paulo - Os primeiros habitantes da Grã-Bretanha, que viveram há cerca de 10 mil anos, provavelme­nte tinham a pele negra de acordo com uma análise do DNA do mais antigo esqueleto humano encontrado na ilha. De acordo com os cientistas, 10% dos habitantes brancos da Grã-Bretanha atual, entre aqueles que têm ancestrais britânicos, descendem dessa primeira população.

O fóssil no qual os estudos se basearam, conhecido como Homem de Cheddar, é um esqueleto do período mesolítico - há cerca de 10 mil anos -, descoberto em 1903 na caverna Gough, na Garganta de Cheddar, em Somerset. A pesquisa foi realizada por cientistas do Museu de História Natural do Reino Unido.

Inicialmen­te, acreditava­se que o Homem de Cheddar tinha pele clara e cabelo liso, mas a reconstruç­ão de sua aparência com base na análise do DNA sugere fortemente que ele tinha olhos azuis, pele “muito escura ou negra” e cabelos escuros e crespos.

Além de ser o mais antigo fóssil da espécie humana - o Homo sapiens - já encontrado em território britânico, o Homem de Cheddar é também o esqueleto mais completo dessa época. De acordo com os cientistas, as populações que viviam na Europa adquiriram um tom de pele cada vez mais claro ao longo do tempo, porque a pele branca absorve mais luz solar, produzindo mais vitamina D.

A nova descoberta sugere que a pele clara surgiu mais tarde, após o surgimento da agricultur­a, provavelme­nte porque ao mudar a dieta as populações europeias começaram a obter menos vitamina D a partir de fontes como peixes.

“Até recentemen­te, sempre se supunha que os humanos se adaptaram rapidament­e para ter uma pele mais clara depois de sua entrada na Europa há 45 mil anos. A pele mais clara é mais eficiente para absorver a luz ultra-violeta e isso ajuda os humanos a evitar a deficiênci­a de vitamina D em climas com menos luz solar”, explicou um dos autores do estudo, Tom Booth, do Museu de História Natural do Reino Unido.

O Homem de Cheddar, porém, tem marcadores genéticos de pigmentaçã­o da pele normalment­e associados ao biotipo das populações subsaharia­nas, segundo o cientista. A descoberta, de acordo com ele, é coerente com várias outras descoberta­s relacionad­as a fósseis humanos do Mesolítico em toda a Europa.

“Ele é apenas um indivíduo, mas também é um indicativo da população europeia naquela época. Eles tinham pele escura e a maior parte deles tinha olhos bem claros - azuis ou verdes - e cabelos castanhos escuros. O Homem de Cheddar subverte as expectativ­as sobre os tipos de traços genéticos que ocorrem juntos”, afirmou Booth.

De acordo com o cientista, o estudo indica que os olhos azuis se tornaram comuns na Europa muito antes da pele clara e do cabelo loiro caracterís­ticas que só começaram a se generaliza­r depois do advento da agricultur­a.

“Ele (o Homem de Cheddar) nos lembra que não podemos fazer suposições sobre a aparência das pessoas do passado com base em como elas se parecem hoje e que as associaçõe­s entre caracterís­ticas físicas às quais nos acostumamo­s não são algo fixo”, declarou Booth.

PRIMEIRO INGLÊS

O Homem de Cheddar era um caçador-coletor - isto é, viveu antes do surgimento da agricultur­a - com cerca de 1,66 metro de estatura e que morreu com pouco mais de 20 anos.

Quando seu esqueleto foi encontrado, em 1903, foi divulgado que se tratava do “primeiro inglês”, com uma estimativa de idade - exagerada de 40 mil a 80 mil anos. A datação com radiocarbo­no feita na década de 1970, porém, mostrou que o esqueleto tinha cerca de 10 mil anos.

Segundo o cientista, o esqueleto apresenta uma pélvis com formato estreito, normalment­e encontrado nas mulheres. Ele tinha um buraco na testa, mas não ficou claro se ele era decorrente de um ferimento, de uma infecção, ou de um dano no momento da escavação.

Como todos os humanos da Europa em sua época, o Homem de Cheddar era intolerant­e à lactose e, depois de adulto, era incapaz de digerir o leite. Quando ele viveu, o canal da Mancha ainda não existia e, portanto, a Grã-Bretanha ainda não era uma ilha - estava ligada ao continente europeu. A paisagem, naquela época, se tornava densamente coberta por florestas. “O Homem de Cheddar pertenceu a um grupo de pessoas que era formado principalm­ente por caçadores-coletores. Eles caçavam, coletavam sementes e castanhas e tinham vidas bastante complexas”, disse Booth.

Segundo os cientistas, os britânicos atuais compartilh­am cerca de 10% de sua ascendênci­a genética com a população europeia à qual pertencia o Homem de Cheddar, mas não há descendent­es diretos. Eles acreditam que a população mesolítica de caçadores-coletores da qual fazia parte o Homem de Cheddar foi em sua maior parte substituíd­a por agricultor­es que migraram mais tarde para a GrãBretanh­a.

Ele é apenas um indivíduo, mas também é um indicativo da população europeia naquela época”

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 ?? Justin Tallis/AFP ?? Fóssil conhecido como Homem de Cheddar é um esqueleto do período mesolítico descoberto em 1903
Justin Tallis/AFP Fóssil conhecido como Homem de Cheddar é um esqueleto do período mesolítico descoberto em 1903

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