A face oculta do ‘lixo’ em londrina
Recentemente a elevação da “taxa de lixo” em Londrina, tida por muitos como inaceitável, gerou grande discussão e atenção a um problema público, geralmente marginalizado e pouco conhecido em toda a sua extensão. O momento é oportuno para lançar questões como: o valor cobrado é suficiente para sustentar um sistema eficaz de gestão de resíduos? Qual o modelo atual de gestão e os custos dele? Existem alternativas para aumentar a eficácia e efetividade da gestão? Ainda que relevantes, essas perguntas não podem ser respondidas aqui, mas elas iluminam um debate que precisa acompanhar as discussões e decisões sobre o custo econômico e o destino de nossos “restos” externalizados.
Geralmente tratado de maneira fragmentada, superficial e emergencial, os problemas urbanos da gestão dos resíduos urbanos estão envoltos em grande complexidade cultural, técnica, econômica, ambiental, social, política e administrativa. Nas últimas décadas o setor ampliou o número de atores que participam diretamente da formulação e implementação de suas políticas: catadores, agentes estatais, grandes geradores de resíduos, cidadãos, escolas, empresas terceirizadas para coleta, transbordo, tratamento dos resíduos e geração de biogás, cooperativas, indústrias de reprocessamento dos materiais, Ministério Público, entre outros. Por outro lado, a amplitude e gravidade, presente e futura, do problema em todos os municípios tem crescentemente chamado a atenção de pesquisadores de instituições públicas, privadas e multilaterais. Contudo, o fato é que a gestão de resíduos urbanos, mesmo após a Lei Nacional de Resíduos Sólidos, ainda não conseguiu ser encaminhado satisfatoriamente na grande maioria dos municípios brasileiros.
Em Londrina, a gestão dos resíduos oculta diversas evidências preocupantes como o aumento ao longo dos anos no volume e na variedade dos diferentes tipos de resíduos sólidos gerados; a acanhada taxa de resíduos efetivamente reciclados, frente ao potencial existente na cidade; a ineficiência no gerenciamento do sistema; a não precificação de importantes custos ambientais ocultados no valor monetário lançado na taxa de lixo, a inexistência de uma instância institucional e de um plano de gestão integrada de resíduos urbanos; o alto grau de desinformação sobre a questão; o baixo nível de envolvimento político e participação da comunidade.
Portanto, é importante aprofundar o debate e o conhecimento sobre o assunto, repensar o modelo de governança dos resíduos domiciliares adotados em Londrina e buscar soluções sistêmicas e eficazes. Apesar do esforço de técnicos e gestores das últimas gestões da cidade e de diversos outros atores, ainda carecemos de uma estratégia articulada para abordar o problema de forma mais institucional, incentivar a participação ativa e parcerias junto a diversos atores sociais, delinear uma gestão integrada de diferentes tipos de resíduos e rejeitos e estruturar um arranjo produtivo local para potencializar a reinserção dos resíduos recicláveis em novos ciclos de transformação industrial. Uma política mais transparente e participativa promoveria regras institucionais e estruturas de incentivo, o que aumentaria os benefícios ambientais e sociais do sistema, além de reduzir o gasto público de médio e longo prazo com o gerenciamento dos resíduos produzidos na cidade.
A questão central continua sendo como lidar com decisões individuais e coletivas da cultura do “jogar fora” e “dar um sumiço” em coisas indesejáveis, turbinada pelo consumismo, cujos impactos externos não são percebidos e reconhecidos por grande parte da sociedade. Portanto, a movimentação contra o aumento da taxa de lixo precisa ser questionada não apenas em relação ao seu preço monetário, mas também sobre como e onde são gastos os recursos e os resultados gerados. O desafio é muito mais complexo do que apresentado aqui, mas é urgente e já passou da hora de levarmos a sério essa questão, sob o risco, não desprezível, de pagarmos cada vez mais por cada vez menos bem-estar e qualidade de vida.
Professores Lilian Aligleri e Benilson Borinelli, docentes do Departamento de Administração da UEL
A movimentação contra o aumento da taxa de lixo precisa ser questionada não apenas em relação ao seu preço monetário, mas também sobre como e onde são gastos os recursos e os resultados” gerados.